Com as mãos trêmulas, peguei a bebida dela quando ela não estava olhando. Dissolvi o pó que tinha comprado de um cara suspeito no campus. Meu coração batia tão forte que parecia que ia sair pela boca.
Eu a observei beber.
Levei-a para minha casa, que ficava perto do local da festa. Ela já estava desorientada, rindo de coisas sem sentido.
"Pedro, você é tão engraçado" , ela dizia, tropeçando nos próprios pés.
Dentro de casa, ela se tornou incontrolável. A droga a deixou febril e sem inibições. Ela me agarrou pela camisa, me puxando em direção ao meu quarto.
"Estou com tanto calor, Pedro."
Seus olhos estavam turvos, cheios de um desejo que não era dela.
Eu estava excitado e aterrorizado. Uma parte de mim, a parte vilanesca, vibrava. Era isso. Eu a queria, queria possuí-la. Meu plano era que o irmão dela, João, nos pegasse em flagrante. Ele ficaria furioso, a família dela ficaria escandalizada, e ela seria forçada a se casar comigo para salvar sua honra.
Eu a teria para sempre.
Mas no momento em que ela me empurrou na cama, no exato instante em que meu plano doentio estava prestes a se concretizar, aconteceu.
Minha cabeça explodiu em dor.
Luzes brancas piscaram diante dos meus olhos e cenas de um futuro que não era meu invadiram minha mente.
Eu vi tudo.
Vi Beatriz, pensando que o que aconteceu entre nós foi um acidente causado pela bebida, concordando em se casar comigo por culpa.
Vi o casamento infeliz. Vi ela descobrindo a verdade sobre a bebida drogada alguns anos depois. O amor em seus olhos se transformando em ódio puro.
Nossa vida se tornou um inferno de brigas e acusações.
Vi uma briga terrível. Ela gritava, me chamando de monstro. Eu a segurei pelo braço. Em um acesso de fúria e medo, ela me empurrou.
Eu caí da escada.
Vi o mundo de lado, a dor excruciante na minha coluna, e depois, a escuridão.
Acordei em uma cama de hospital, paralisado do pescoço para baixo.
Vi João, o "herói", nunca se casando. Ele se sentia culpado pela infelicidade da irmã e passava a vida tentando cuidar dela e de mim. Anos depois, ele morreu em um acidente de avião durante uma viagem que fez para tentar esquecer tudo.
Vi Beatriz, consumida pela culpa e pelo ódio, definhando.
E me vi, doente, sozinho em uma cama, sem ninguém para me cuidar. Beatriz me odiava demais para se aproximar. Morri de uma infecção, abandonado e esquecido.
Após a minha morte, minha consciência flutuou em um vazio. Foi quando eu soube. Uma voz ou uma força me informou da verdade.
Este mundo era um romance. Um romance trágico. E por causa do meu ciúme, do meu ato egoísta, todos nós tivemos um final infeliz. O herói morreu, a heroína viveu uma vida de miséria e o vilão... bem, o vilão teve o que merecia.
A dor de cabeça cessou. Eu estava de volta à realidade, de volta ao meu quarto, com Beatriz me olhando com aqueles olhos turvos.
As cenas do futuro queimavam na minha mente. A dor, a paralisia, a morte solitária.
Lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto. Eram lágrimas de medo, de arrependimento, de um horror tão profundo que eu não conseguia colocar em palavras.
Eu a olhei, a mulher que eu amava mais que a minha própria vida, e sabia que eu não podia fazer aquilo com ela. Eu não podia condená-la a esse futuro.
Eu não podia nos condenar a esse futuro.