O Aviso de Daniel
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Capítulo 2

A pequena caixa de música de madeira parecia fria na minha mão. Eu me lembrava do dia em que Daniel me deu. Tínhamos dezesseis anos e estávamos sentados sob a grande mangueira no quintal da minha casa. Ele a esculpiu à mão, e dentro, tocava nossa melodia favorita. Era um símbolo, uma promessa silenciosa de um futuro juntos.

"Mãe, é só uma lembrança" , eu sussurrei, sentindo uma pontada de dor.

"Lembrança de quê? De um covarde?" ela gritou, sua voz subindo uma oitava. "Jogue isso fora! Agora!"

Ela tentou arrancar a caixa da minha mão, e sua reação foi tão desproporcional que me assustou de verdade.

"Pare com isso! O que deu em você?" eu gritei de volta, puxando meu braço.

"Eu não vou deixar você estragar este casamento também! Não vou! Você vai se casar com o Marcos e vai esquecer aquele desgraçado para sempre!"

Seus olhos estavam injetados de sangue, e ela agarrou meus ombros, sacudindo-me com força. O rosto dela estava a centímetros do meu, contorcido em uma máscara de fúria que eu nunca tinha visto. Era irracional, aterrorizante. Ela não era minha mãe naquele momento, era uma estranha furiosa.

"Mãe, você está me machucando!"

Ela me empurrou para trás, e eu tropecei, caindo sentada na cama. Por um breve momento, ela ficou parada, ofegante, com o peito subindo e descendo. Nesse instante de calma tensa, algo chamou minha atenção.

No grande espelho do guarda-roupa atrás dela, vi seu reflexo. E por uma fração de segundo, algo estava terrivelmente errado. O rosto dela no espelho pareceu... derreter. As feições escorreram para baixo, como cera quente, antes de voltarem ao normal tão rápido que pensei ter imaginado.

Meu cérebro gritou que era o estresse, o choque. Mas eu não conseguia tirar a imagem da cabeça.

Ela se virou para o espelho para arrumar o cabelo, tentando se recompor. E foi então que eu vi.

Minha mãe tinha uma pequena cicatriz branca acima da sobrancelha esquerda, de uma queda quando eu era criança. Eu beijei aquela cicatriz centenas de vezes. Era uma parte dela, tão familiar quanto suas próprias mãos.

Mas a mulher no meu quarto, a mulher que se parecia exatamente com a minha mãe, tinha a cicatriz acima da sobrancelha direita.

Um arrepio gelado percorreu minha espinha. Não era uma ilusão. Não era estresse. Era um fato. Um detalhe impossível de errar.

Esta mulher não era minha mãe.

O pânico ameaçou me sufocar, mas eu o engoli. Se eu gritasse, se eu mostrasse que sabia, o que ela faria? A fúria que vi em seus olhos... não era normal.

Ela se virou para mim, forçando um sorriso que não alcançava seus olhos.

"Desculpe, querida. Eu só... estou muito nervosa. Quero que tudo seja perfeito para você."

Sua voz era calma de novo, mas agora soava oca, falsa.

"Tudo bem, mãe" , eu disse, minha voz um fio trêmulo. Eu precisava manter a calma. Precisava fingir. "Você tem razão. Eu vou... vou me livrar disso."

Fingi que ia jogar a caixa de música no lixo.

Ela sorriu, visivelmente aliviada. "Ótimo. Agora, vamos, coloque o vestido. Seu pai está esperando lá embaixo para te ver."

Meu pai.

Uma pequena faísca de esperança se acendeu em meio ao terror. Meu pai me protegeria. Ele acreditaria em mim. Eu só precisava chegar até ele.

"Claro, mãe. Vou me vestir agora mesmo" , eu disse, forçando o sorriso mais convincente que consegui.

Eu precisava sair daquele quarto. Precisava chegar até meu pai.

            
            

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