"Laura, você tem certeza disso? A estrutura ainda não está totalmente estabilizada. Qualquer tremor secundário pode ser perigoso."
"Eu preciso ver de perto, Carlos. Os cálculos no papel são uma coisa, a realidade é outra."
Sua voz era firme, não deixando espaço para argumentação. Ela precisava disso, precisava do risco, da adrenalina, de algo que a fizesse sentir viva e a distraísse da dor que carregava no peito. Esta missão era sua fuga, sua redenção.
Enquanto subia o andaime improvisado, o cheiro de poeira e metal enchendo seus pulmões, uma memória a atingiu com força. Era a voz de Pedro, seu noivo, soando suave e cheia de promessas em uma noite estrelada, meses atrás.
"Eu vou construir o mundo para você, Laura. Cada prédio, cada ponte, cada casa que você sonhar, eu estarei lá para garantir que se torne realidade."
Ele a segurava em seus braços, o anel de noivado brilhando em seu dedo. Pedro, o empresário bem-sucedido e carismático, que a amava com uma intensidade que a assustava e a completava.
Ele era o homem que a defendeu de tudo e de todos. Sua família nunca a aprovou, uma órfã sem nome ou fortuna, indigna do herdeiro do império empresarial dos Medeiros. Laura lembrava vividamente do dia em que o pai de Pedro a humilhou em um jantar de família, chamando-a de aproveitadora. Pedro se levantou, bateu a mão na mesa com uma força que fez os talheres saltarem e declarou na frente de todos:
"Se Laura não for bem-vinda nesta casa, então eu também não sou. Ela é minha família agora."
Ele a pegou pela mão e a tirou daquela mansão opressiva, e nunca mais olhou para trás. Aquele ato de rebelião solidificou o amor dela por ele. Ele era seu porto seguro, seu herói.
Esse pensamento fez o estômago de Laura revirar agora, uma mistura de nostalgia e náusea. A imagem do herói se quebrou em mil pedaços na noite anterior. O som de uma notificação em seu celular a tirou de suas memórias. Era uma mensagem de um número desconhecido. Hesitante, ela abriu.
Era uma foto. Uma foto nítida e inconfundível de Pedro na cama de um hotel, dormindo. Ao lado dele, um braço feminino com uma pequena tatuagem de borboleta no pulso o abraçava. Laura sentiu o ar faltar. Ela conhecia aquela tatuagem.
Quando Pedro chegou em casa naquela noite, sorrindo e trazendo seu sorvete favorito, ela sentiu um frio percorrer sua espinha. Ele a abraçou por trás enquanto ela olhava pela janela da sala, fingindo admirar a vista da cidade.
"Pensando em nosso futuro, meu amor?", ele sussurrou em seu ouvido, beijando seu pescoço.
O toque dele, que antes a aquecia, agora a queimava como gelo. Ela não se moveu, seu corpo rígido sob o toque dele.
"Estou cansada", ela disse, sua voz soando oca aos seus próprios ouvidos.
Ele a virou para encará-lo, a preocupação em seus olhos parecendo tão genuína que por um momento ela quase duvidou do que tinha visto.
"Você está trabalhando demais nesse projeto. Você precisa descansar. Nosso casamento está chegando."
Ele se inclinou para beijá-la, mas o toque de seus lábios foi interrompido pelo toque insistente do celular dele. Ele se afastou, olhando para a tela com uma breve hesitação antes de atender.
"Alô?", ele disse, sua voz mudando sutilmente. Ele se afastou dela, caminhando em direção à varanda. "Sim, estou a caminho. Apenas espere por mim."
Laura observou-o em silêncio, a imagem do homem que uma vez parou o trânsito no centro da cidade apenas para lhe entregar um buquê de flores raras porque ela estava tendo um dia ruim, piscando em sua mente. O homem que comprou uma pequena editora que estava prestes a falir só porque eles publicaram o primeiro livro de poesia que ela amava na infância. Esses gestos grandiosos, que antes pareciam provas de um amor épico, agora pareciam... uma farsa.
Ela tocou o anel de diamante em seu dedo. Era pesado, frio. Seu rosto estava pálido no reflexo da janela. Como o homem que construiu um mundo para ela podia destruí-lo com tanta facilidade? A pergunta ecoou em sua mente, sem resposta, enquanto ela o ouvia desligar o telefone e voltar para a sala, o mesmo sorriso falso no rosto.