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- Sabe o que mais me irrita em você, Bianca? Sua cara de santa quando está rodeada de merda.
A voz veio da porta do banheiro feminino. Eu já sabia quem era. O perfume barato, a entonação vulgar tentando soar sofisticada, e aquele salto exageradamente alto de quem quer chamar atenção em silêncio.
Melissa.
Amante.
Futura "esposa" de Leandro.
E uma das razões pelas quais meu cadáver foi cremado sem flores.
Virei devagar, sem pressa.
Meus olhos encontraram os dela no espelho.
- E sabe o que mais me irrita em você, Melissa? - sorri. - Essa necessidade infantil de competir com uma mulher que nem te enxerga.
Ela riu. Falsa. Rancorosa.
- Tô só observando. Vai ver seu reinado tá acabando e você nem percebeu ainda.
Vai ver, eu pensei, quem tá caindo no próprio buraco é você.
- Engraçado - disse, me virando para lavar as mãos -, o Leandro ainda geme meu nome quando goza. E isso... isso deve ser muito frustrante pra uma mulher como você.
A boca dela se abriu, mas nenhuma resposta saiu.
Ela me odiava.
E isso me alimentava.
No escritório, Leandro discutia contratos com dois homens que eu reconhecia da vida anterior: Valentim e César, irmãos de fachada, ladrões por profissão.
Na linha do tempo anterior, Leandro assinaria com eles e, meses depois, eles entregariam tudo para a polícia em troca de imunidade.
Agora, eu estava aqui.
Vivíssima.
E com tempo suficiente pra enterrar os três antes disso acontecer.
- Amor, trouxe seu café. - Entrei na sala, ignorando os olhares dos dois homens e deixando a xícara na mesa com cuidado.
Leandro me puxou pelo quadril e beijou minha cintura.
- A mulher perfeita. - disse ele.
Você nem imagina o inferno que está dormindo ao seu lado, Leandro.
À noite, fui ao terraço da mansão. O lugar onde, em minha outra vida, Leandro me pediu em casamento. Um lugar onde sangue e promessas ainda escorriam pelas paredes da minha memória.
Me sentei no sofá externo com meu diário no colo.
E então o vento mudou.
O ar ficou mais frio, mais... atento.
E alguém se aproximou.
Passos firmes, mas silenciosos. Um cheiro diferente de todos os outros homens que passavam por ali.
Amadeirado, elegante.
Rico.
- Esse lugar parece bonito demais pra tanta sujeira. - ele disse.
Levantei os olhos.
Um homem. Alto. Terno escuro impecável, gravata afrouxada.
Queixo bem marcado. Olhos de aço polido.
E um sorriso que parecia mais uma advertência do que um convite.
- A sujeira costuma se esconder sob o luxo. - respondi.
Ele riu, curto.
- Então você deve ser Bianca. A mulher que sobrevive no ninho das cobras.
Não perguntei seu nome.
Ele não disse o dele.
E isso tornou tudo ainda mais perigoso.
- E você é?
- Alguém que observa antes de tocar. - ele respondeu.
E foi embora.
Assim.
Como um presságio.
Como uma faísca.
Mas naquela noite, mesmo em silêncio, meu corpo sabia:
Alguma coisa tinha mudado.
E Leandro?
Leandro dormia tranquilo, abraçado à própria arrogância.
Ignorando que, bem debaixo do seu teto, a tempestade já tinha rosto.
E nome.