O Recomeço de Sofia
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Capítulo 2

A lembrança de seis meses atrás veio com uma clareza dolorosa.

Estávamos no escritório do advogado, um lugar com cheiro de papel velho e promessas quebradas. Eu tinha preparado um acordo de divórcio. Não porque eu quisesse me divorciar na época, mas como uma tentativa desesperada de fazê-lo enxergar a gravidade da situação.

Marcos mal olhou para os papéis.

Ele estava no celular, respondendo a e-mails de trabalho, impaciente.

"Sofia, isso é realmente necessário? Tenho uma reunião em vinte minutos."

"Leia, por favor", eu pedi, a voz trêmula.

Ele folheou as páginas com desdém, seus olhos passando por cima das cláusulas sem registrar nada. A divisão de bens, o apartamento, a casa de campo dos pais dele que estava em nosso nome. Ele não se importava.

"Tanto faz", ele disse, pegando a caneta.

Ele assinou seu nome no final, um rabisco rápido e descuidado, e empurrou os papéis de volta para mim.

"Pronto? Satisfeita? Agora podemos parar com esse teatro?"

Seu celular vibrou de novo. Ele sorriu para a tela.

"Tenho que ir. A Patrícia precisa de mim para fechar um contrato importante."

Ele se levantou e saiu, sem nem olhar para trás.

O advogado me olhou com pena. "Ele nem leu o que assinou, Sofia."

"Eu sei", respondi, o coração pesado. "Ele confia nela cegamente."

Eu sabia que a mensagem que ele sorriu ao ler era dela. Patrícia. A mulher para quem ele dedicava todo o seu tempo e atenção.

Naquele dia, no escritório do advogado, eu entendi. Não era sobre o trabalho. Nunca foi.

Naquele mesmo dia, mais tarde, eu o vi.

Eu estava saindo de uma reunião no centro da cidade, no mesmo prédio comercial onde ficava a sede da empresa dele.

Ao passar pelo café no térreo, vi os dois sentados em uma mesa no canto.

Marcos e Patrícia.

Ele estava inclinado sobre a mesa, ouvindo-a com uma atenção que ele nunca me deu. A mão dela estava sobre a dele. Eles não estavam falando de trabalho. O jeito que ele olhava para ela, o sorriso dela... era íntimo, cúmplice.

Senti meu estômago revirar.

Fiquei ali, parada do lado de fora, olhando através do vidro, invisível para eles. Vi quando ele pegou o celular e digitou algo, rindo. Segundos depois, meu próprio celular vibrou.

Era uma mensagem dele: "Reunião chata. Preso aqui. Te vejo mais tarde."

A mentira descarada me deixou sem ar.

Eu estava ali, a poucos metros, vendo a verdade com meus próprios olhos, enquanto ele mentia para mim com uma facilidade assustadora.

Naquela noite, a conversa que tivemos foi um replay distorcido daquela cena no café. Ele chegou em casa, cansado da "reunião chata", e eu, boba, tentei mais uma vez.

"Marcos, a gente precisa conversar sério."

"De novo, Sofia? Já não assinamos aquele papel ridículo que você queria?"

Naquela época, a assinatura dele era apenas um blefe para mim, uma ferramenta para chamar sua atenção. Para ele, era um incômodo que ele já havia esquecido.

Agora, no presente, o telefone tocou de novo, me tirando das minhas lembranças amargas.

Era Marcos. A voz dele era um trovão do outro lado da linha.

"Sofia, que porra é essa? O RH acabou de me ligar! Disseram que receberam um telefonema do seu advogado sobre 'procedimentos de divórcio'! Você enlouqueceu? Quer me envergonhar na frente de toda a empresa?"

A voz de Patrícia podia ser ouvida ao fundo, um sussurro choroso. "Marcos, não briga com ela por minha causa... Eu não quero ser o motivo de mais problemas..."

A atuação dela era digna de um Oscar.

Marcos, como sempre, caiu no teatro dela.

"Tá vendo o que você fez?", ele gritou no telefone. "A Patrícia está aqui, se sentindo culpada, chorando, e a culpa é sua! Sua, com esse seu ciúme doentio!"

Ele continuou, sua voz cheia de desprezo.

"Ela não tem nada, Sofia. Veio de uma família pobre, lutou por tudo o que tem. Você não sabe o que é isso. Você sempre teve tudo na mão. E agora quer destruir a carreira dela por pura maldade?"

Ele estava me acusando de ser a vilã, pintando Patrícia como uma mártir.

"Ela é tão sensível, tão frágil. E você, com essa sua atitude, está acabando com ela. Eu estou aqui, tendo que consolar ela, em vez de estar trabalhando. Tudo por causa da sua insegurança."

A ironia era tão espessa que eu quase podia tocá-la. Ele me acusava de não saber o que era lutar, quando eu tinha passado os últimos sete anos lutando por ele, por nós.

Ouvi a voz de Patrícia de novo, mais alta agora. "Marcos, querido, não fala assim com ela. Talvez eu devesse pedir demissão... seria melhor para todo mundo."

"De jeito nenhum!", ele respondeu, a voz cheia de uma proteção feroz. "Você não vai a lugar nenhum. Eu não vou deixar essa mulher te prejudicar."

"Essa mulher."

Era assim que ele se referia a mim agora.

Eu permaneci em silêncio, ouvindo o veneno dele escorrer pelo telefone. A cada palavra, a decisão que eu havia tomado se solidificava. Não era apenas uma assinatura em um papel, era a minha libertação. E ele, na sua arrogância e cegueira, não fazia a menor ideia do que estava por vir.

            
            

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