Sofia se lembrava de ouvir aquela fita, sentada no chão do seu closet, tremendo. A voz de Mariana, manhosa e chorosa. "Lucas, e a Sofia? Eu não quero ser a outra para sempre."
E a voz de Lucas, suave e tranquilizadora, uma suavidade que ele nunca usou com ela. "Meu amor, tenha paciência. Sofia é útil por enquanto. A família dela tem os contatos que eu preciso para o meu novo projeto. Assim que eu conseguir o que quero, encontrarei uma maneira de me livrar dela. Você é a única que eu amo, sempre foi."
Aquela lembrança era como um veneno em suas veias. Agora, sentada na segurança de sua casa, ela respirou fundo, expelindo o último resquício daquela dor antiga. A raiva tinha dado lugar a uma calma gelada.
O telefone da casa tocou, quebrando o silêncio. A empregada atendeu e veio até ela. "Senhorita Sofia, é o senhor Lucas."
"Diga que eu não estou", ela disse, sem hesitar.
Ela subiu para o seu quarto e começou a arrumar suas malas. Um mês. Em um mês, ela estaria em um avião para Paris. Seu pai já estava cuidando de tudo, da matrícula na escola de moda, do apartamento.
Mais tarde, seu pai bateu na porta. "Sofia, o Lucas está aqui. Ele parece... confuso."
"Eu vou falar com ele", ela disse. Ela desceu as escadas e o encontrou na sala de estar. Ele parecia exatamente como ela se lembrava, charmoso em seu terno caro, mas com uma expressão de impaciência no rosto. Ele estava claramente atrasado, como sempre.
"Sofia, o que significa isso? Sua empregada disse que você não estava, seu pai cancelou nossa festa de noivado. O que está acontecendo?", ele perguntou, o tom beirando a acusação.
"Eu cancelei, Lucas. Nós não vamos mais nos casar", ela disse, sua voz firme.
Ele a olhou, incrédulo. "O quê? Por quê? É por eu ter me atrasado? Eu tive uma emergência, Mariana não estava se sentindo bem, eu tive que levá-la para casa." Ele usou a mesma desculpa esfarrapada da vida passada.
"Não é por causa do seu atraso, Lucas. É porque eu não te amo. E eu não quero mais me casar", ela repetiu, olhando diretamente em seus olhos.
Ele pareceu genuinamente chocado, como se a possibilidade de ela não o amar fosse algo inconcebível. "Você não me ama? Sofia, nós estamos juntos há dois anos. Você sempre disse que me amava."
"As pessoas mudam de ideia", ela disse, dando de ombros.
Ele se aproximou, tentando usar seu charme. "Querida, não seja boba. Estamos ambos um pouco nervosos com o casamento, é normal. Não tome uma decisão precipitada." Ele tirou uma pequena caixa de veludo do bolso. "Eu até trouxe um presente para você."
Ele abriu a caixa. Dentro, um relógio delicado, cravejado de pequenos diamantes. Na vida passada, ela chorou de alegria ao receber aquele relógio. Agora, ela olhava para ele com indiferença.
"É lindo, Lucas. Mas não posso aceitar." Ela pegou a caixa e a entregou para a empregada que passava por ali. "Ana, por favor, leve este presente para a Mariana. Diga a ela que é um presente de desculpas meu, por qualquer inconveniente que eu tenha causado."
O rosto de Lucas ficou páliceo. A menção de Mariana e o gesto de Sofia o desarmaram completamente.
"O que Mariana tem a ver com isso?", ele gaguejou.
"Tudo, Lucas. Agora, se me der licença, tenho muitas coisas para fazer." Ela se virou e começou a subir as escadas.
"Sofia!", ele chamou, sua voz misturada com raiva e confusão.
Ela não olhou para trás. Ao chegar ao topo da escada, sua fiel dama de companhia, Clara, a esperava com os olhos cheios de preocupação. Clara era mais uma amiga do que uma empregada.
"Senhorita, você está bem?", Clara perguntou.
"Estou ótima, Clara. Melhor do que nunca." Sofia sorriu. "Você gostaria de ir para Paris comigo?"
Os olhos de Clara se iluminaram. "Eu iria para o fim do mundo com a senhorita!"
De repente, um barulho veio de fora da casa. Gritos e um som de comoção. Uma das empregadas correu escada acima, com o rosto assustado.
"Senhorita Sofia, é a senhorita Mariana! Ela está lá fora, gritando seu nome, dizendo que a senhorita roubou o noivo dela!"
Sofia suspirou. A peça de teatro de Mariana estava prestes a começar, exatamente como ela esperava.