Na noite em que o meu marido, Pedro, me abandonou, o céu de Lisboa estava limpo, sem uma única nuvem.
Eu estava no hospital, a olhar para o meu filho recém-nascido na incubadora, um pequeno ser tão frágil que o meu coração se apertava só de o ver.
O médico disse que ele nasceu prematuro e precisava de cuidados especiais.
Liguei ao Pedro. O telefone tocou durante muito tempo.
Quando ele finalmente atendeu, a sua voz estava cheia de impaciência.
"O que é que queres, Sofia? Estou ocupado."
A voz de outra mulher, a da minha cunhada Laura, soou ao fundo, suave e preocupada.
"Pedro, não fales assim com a Sofia. Ela acabou de dar à luz, deve estar a sentir-se sozinha."
Depois, a voz do meu sogro, o Sr. Almeida, soou, autoritária e fria.
"Ocupado? Ele está a cuidar da irmã dele, que está doente. Laura está com febre alta, precisa de alguém que cuide dela."
Respirei fundo, o cheiro a desinfetante do hospital enchia-me os pulmões.
"Pedro, o nosso filho nasceu. Ele é prematuro, está na incubadora."
Houve um silêncio do outro lado da linha. Apenas um silêncio pesado.
Depois, a voz do Pedro voltou, mas soava distante, como se estivesse a falar com outra pessoa.
"Ela está com febre, não posso sair agora. O médico disse que ela precisa de repouso absoluto."
"Pedro," insisti, a minha voz a tremer um pouco. "É o teu filho."
"Eu sei!" ele explodiu, a sua frustração a atravessar o telefone. "Mas a Laura está doente! Ela não tem mais ninguém! Tu estás no hospital, os médicos e as enfermeiras estão a cuidar de ti. O que é que queres que eu faça?"
Senti um nó na garganta.
"Eu preciso de ti aqui," sussurrei.
"Para de ser egoísta, Sofia. A minha irmã precisa de mim. Quando ela melhorar, eu vou aí. Agora, para de me ligar."
Ele desligou.
Olhei para o telefone na minha mão. O ecrã ficou preto.
Olhei de volta para a incubadora. Para o meu filho. O nosso filho.
Lágrimas quentes começaram a escorrer pelo meu rosto, mas eu não fiz nenhum som.
A Laura estava doente. Uma febre.
O meu filho lutava pela vida numa caixa de vidro, e para o pai dele, uma febre era mais importante.
Senti-me vazia. Completamente vazia.
Naquele momento, eu soube. O nosso casamento tinha acabado.
Não havia mais nada a salvar.
Ele tinha feito a sua escolha.