O meu telemóvel vibrou novamente. Era um número desconhecido.
Atendi, a minha voz rouca pelo choro silencioso.
"Sofia? Sou eu, o João."
João era o melhor amigo do Pedro. Conhecemo-nos através dele.
"O que foi, João?"
"O Pedro está aí contigo? Ele não atende as minhas chamadas."
Uma risada amarga escapou-me.
"Não, ele não está aqui. Ele está com a irmã. Aparentemente, ela está muito doente."
Houve uma pausa.
"Doente? A Laura? Eu acabei de a ver há uma hora no centro comercial com umas amigas. Parecia perfeitamente bem."
O meu coração parou por um segundo.
Centro comercial.
Com amigas.
Enquanto o seu irmão me dizia que ela estava acamada com uma febre alta.
"Sofia? Estás aí?" a voz do João soou preocupada.
"Sim," consegui dizer. "Obrigada por me dizeres, João."
Desliguei a chamada.
A mentira era tão clara, tão descarada.
Ele nem se deu ao trabalho de inventar algo credível.
Ele simplesmente não se importava se eu acreditava ou não.
Ele só queria uma desculpa para não estar aqui. Para não estar comigo. Para não estar com o seu filho.
A porta do quarto abriu-se e uma enfermeira entrou, sorrindo.
"O seu sogro está aqui para a visitar."
O Sr. Almeida entrou logo a seguir. O seu rosto era uma máscara de desaprovação.
Ele olhou para mim, depois para o berço vazio ao lado da minha cama, e o seu olhar endureceu.
"Onde está o meu neto?"
"Está na incubadora. Ele nasceu prematuro."
Ele estalou a língua, um som de puro desdém.
"Claro que nasceu. Com uma mãe como tu, que não sabe cuidar de si mesma."
Fiquei a olhar para ele, sem palavras.
"O Pedro disse-me que tu o tens estado a importunar com telefonemas," ele continuou, a sua voz a subir de tom. "Não percebes que a Laura precisa dele? A rapariga é frágil, sempre foi. Ela precisa do apoio do irmão."
"E o meu filho não precisa do pai?" a minha voz saiu mais forte do que eu esperava.
O Sr. Almeida riu-se. Uma risada curta e cruel.
"O rapaz vai ficar bem. Ele é um Almeida. É forte. Além disso, tu estás aqui, não estás? É o trabalho da mãe cuidar dos filhos. Deixa o Pedro em paz para que ele possa cuidar da sua verdadeira família."
A sua verdadeira família.
Aquelas palavras ecoaram no quarto silencioso.
Então era isso. Eu e o meu filho, nós não éramos a sua verdadeira família.
Éramos um inconveniente. Um fardo.
"Eu quero o divórcio," disse eu, a minha voz firme e clara.
O rosto do Sr. Almeida ficou vermelho de raiva.
"Divórcio? Atreves-te a dizer essa palavra? Depois de tudo o que a nossa família fez por ti? Demos-te um nome, uma casa. E é assim que nos agradeces?"
"Eu não preciso do vosso nome," respondi, levantando o queixo. "E claramente, esta nunca foi a minha casa."
Ele apontou um dedo trémulo na minha direção.
"Vais arrepender-te disto, rapariga. Vais ver. Vais acabar sozinha e sem nada."
Ele virou-se e saiu, batendo a porta com força atrás de si.
Sozinha e sem nada.
Olhei de novo na direção da unidade de cuidados intensivos neonatais.
Eu não estava sozinha. Eu tinha o meu filho.
E isso era tudo o que importava.