Sofia: A Escolha
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Capítulo 2

No dia seguinte, Sofia parou. Simplesmente parou. Ela não fez o café da manhã. Não preparou os uniformes de Pedro e Isabela. Não revisou a agenda de Lucas nem lembrou a ele de suas reuniões. Ela se levantou, tomou um banho, vestiu-se e sentou-se na poltrona da sala de estar com um livro, como se fosse uma convidada em sua própria casa.

Inicialmente, ninguém pareceu notar. Lucas estava acostumado a sair correndo pela manhã, pegando uma xícara de café e uma torrada que magicamente apareciam na bancada da cozinha. As crianças estavam acostumadas a serem vestidas e levadas para a mesa do café da manhã pela mãe ou pela babá.

A primeira rachadura na rotina perfeita apareceu quando Lucas desceu as escadas, já atrasado, e não encontrou seu café.

"Sofia? Onde está o meu café?" ele gritou do andar de baixo.

Sofia virou uma página de seu livro. "Não fiz café hoje, Lucas. A máquina está na cozinha."

Ele apareceu na porta da sala, a testa franzida em confusão. "Você não fez? Por quê?"

"Eu estava cansada," ela disse simplesmente, sem tirar os olhos do livro.

A confusão de Lucas se transformou em irritação. Ele bufou e foi para a cozinha, batendo as portas dos armários. Alguns minutos depois, a babá desceu com as crianças, ambas com os uniformes amassados e o cabelo despenteado.

"Senhora Mendes, não consegui encontrar a lancheira do Pedro," disse a babá, parecendo estressada.

"Está no armário de sempre," respondeu Sofia, ainda calma.

O caos se instalou. Lucas não conseguia fazer o café da qualidade que estava acostumado. A babá não conseguia encontrar as meias iguais de Isabela. Pedro reclamava que seu pão não tinha a crosta cortada. Era uma pequena amostra do que acontecia quando a engrenagem invisível que era Sofia parava de girar.

No final do dia, a casa estava uma bagunça. Pratos sujos na pia, brinquedos espalhados pelo chão, uma sensação de desordem que não existia há anos. Lucas chegou em casa e seu rosto se fechou em uma carranca.

Ele encontrou Sofia no mesmo lugar, lendo o mesmo livro.

"O que diabos está acontecendo, Sofia?" ele exigiu, a voz dura. "Por que a casa está assim? Por que as crianças jantaram sanduíche? A babá disse que você não deu nenhuma instrução hoje."

Sofia finalmente fechou o livro e olhou para ele. Havia uma calma em seus olhos que o desarmou. Não era a calma submissa que ele conhecia, mas uma calma distante, gélida.

"Eu estou cansada, Lucas," ela repetiu. "Cansada de ser a gerente desta casa, a babá, a cozinheira, a sua assistente pessoal. Cansada de fazer tudo e não receber nem um 'obrigado'."

Ela se levantou e caminhou até a janela. A memória de sua vida passada voltou. Anos e anos de dedicação. As noites em que ficou acordada com as crianças doentes para que ele pudesse dormir e estar descansado para o trabalho. As festas de negócios que ela organizou com perfeição para impressionar seus sócios. O tempo que ela abandonou sua própria carreira, seu próprio sonho de ser uma estilista de moda, para que ele pudesse construir seu império.

Tudo por nada.

"Eu passei os últimos seis anos garantindo que sua vida e a vida das crianças fossem perfeitas," continuou ela, a voz ainda baixa, mas carregada de uma dor antiga. "Eu sacrifiquei tudo por esta família. E em troca, o que eu recebi? Indiferença. Um marido que mal olha para mim e filhos que preferem outra mulher."

Lucas ficou sem palavras. Ele nunca a tinha visto assim. Ele sempre a viu como uma presença constante e confiável, algo que ele não precisava pensar.

"Isso não é justo, Sofia. Você sabe que eu trabalho duro..."

Antes que ele pudesse terminar, a porta da sala se abriu com um estrondo. Pedro e Isabela entraram correndo, os rostos vermelhos de raiva.

"Mamãe, por que você não quer mais cuidar da gente?" gritou Pedro. "Você é uma mãe má!"

"Nós não queremos você!" acrescentou Isabela, as lágrimas escorrendo por seu rostinho. "Nós queremos a tia Bia! Ela é a melhor! Ela sabe brincar e faz os melhores bolos!"

Aquelas palavras, vindas de seus próprios filhos, eram as mais cruéis de todas. Em sua vida anterior, elas a teriam destruído. Mas agora, elas apenas solidificaram sua resolução.

Sofia olhou para as duas crianças, seus filhos, e depois para o marido. Um sorriso triste e resignado tocou seus lábios.

"Tudo bem," disse ela, a voz soando estranhamente leve. "Se é isso que vocês querem."

Lucas a encarou, chocado com sua aceitação imediata. "Sofia, o que você está dizendo? Eles são crianças, não sabem o que dizem."

"Eu acho que eles sabem exatamente o que dizem," respondeu Sofia. "Eles estão apenas sendo honestos. Eles querem a Beatriz. Então, eles terão a Beatriz."

Ela se virou para as crianças. "Vão arrumar suas coisas. O papai vai levar vocês para a casa da tia Bia."

Pedro e Isabela pararam de chorar, surpresos. Depois, um olhar de triunfo substituiu as lágrimas. Eles correram para fora da sala, gritando de alegria.

Lucas ficou parado, atordoado. "Sofia, você enlouqueceu? Você está realmente entregando nossos filhos?"

"Eu não estou entregando nada, Lucas," disse ela, a voz cansada. "Eu estou apenas dando a todos o que eles sempre quiseram. Você, seus filhos, e a Beatriz. Agora vocês podem ser a família feliz que sempre sonharam ser. Sem mim no caminho."

Ele não sabia o que dizer. A mulher à sua frente era uma estranha. Determinada, fria, inabalável.

Ele subiu as esceras, pegou as crianças, que já estavam com suas pequenas mochilas prontas, e desceu. Ao passar por Sofia na porta, ele parou.

"Você vai se arrepender disso," ele disse, a voz baixa e ameaçadora.

Sofia o encarou, os olhos secos. "Não, Lucas. Eu já me arrependi de muitas coisas na minha vida. Mas disso, eu tenho certeza que não vou."

Ele saiu, batendo a porta atrás de si. Sofia ficou sozinha no silêncio da casa enorme e vazia. Pela primeira vez em muito tempo, ela não sentiu dor. Ela sentiu uma estranha e assustadora sensação de liberdade. O futuro era uma página em branco, e pela primeira vez, era ela quem segurava a caneta.

            
            

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