Liberdade Após a Dor
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Capítulo 3

"Ana Lúcia, você não consegue sair sozinha?"

As palavras dele pairaram no ar, carregadas de uma acusação fria.

"Você ficou na água o tempo todo para me forçar a salvá-la primeiro, para que eu não pudesse salvar Carla, não é?"

O frio em seus olhos me fez estremecer mais do que a água da enchente.

Ele ainda não sabia.

Ele não tinha ideia de que eu também tinha retornado, que eu carregava sete anos de memórias de seu ressentimento e da dor que ele me causou.

Para ele, eu ainda era a esposa egoísta e manipuladora que ele imaginava.

Ele continuou, sua voz endurecendo a cada palavra.

"Você vai reclamar para meus pais de novo? Vai dizer que eu te abandonei? Você pode falar o que quiser de mim, mas se ousar caluniar Carla, se ousar inventar qualquer coisa sobre ela, mesmo que meus pais a ajudem, eu nunca a perdoarei!"

Suas ameaças eram as mesmas da vida passada. As mesmas acusações, a mesma defesa cega de Carla.

Mas desta vez, elas não me atingiram. Elas soavam vazias, patéticas.

Eu apertei a mão sobre meu abdômen, onde a dor pulsava implacavelmente. A dor era um lembrete físico e brutal da realidade desta nova chance.

Eu olhei para ele, não com a mágoa da vida anterior, mas com uma resolução fria e clara.

"Pedro."

Minha voz saiu rouca, mas firme.

"Vamos nos divorciar."

Uma expressão de surpresa genuína finalmente quebrou sua máscara de indiferença.

Ele ficou atordoado por um momento, piscando como se não tivesse entendido.

Então, a surpresa deu lugar à impaciência. Ele franziu a testa.

"Eu tenho muitas coisas para fazer, não tenho tempo para suas brincadeiras."

"Não estou brincando," eu disse, olhando diretamente em seus olhos. "Estou falando sério."

Na vida anterior, pouco antes de ele entrar na máquina do tempo, ele me disse que seu maior arrependimento, além de não ter salvado Carla primeiro, foi ter se casado comigo por um arranjo familiar.

Ele disse que se casar comigo foi o maior erro da sua vida.

Eu não queria repetir o mesmo erro.

Eu o libertaria.

Ele poderia compensar seus dois maiores arrependimentos de uma só vez.

Pedro não acreditou em mim. Seu olhar se tornou ainda mais impaciente, tingido de desprezo.

"Meus pais não estão aqui agora, você não precisa atuar. Você só quer usar o divórcio como desculpa para que meus pais gostem menos de Carla e sintam pena de você."

Ele deu um passo mais perto, sua sombra me cobrindo.

"Aconselho você a parar com essas artimanhas inúteis. Não use algo tão sério como o divórcio como moeda de troca para suas birras. Eu a levarei ao hospital primeiro."

Ele me olhou de forma advertida, um aviso claro para que eu não continuasse com a discussão.

A dor no meu baixo ventre ficava cada vez mais forte, uma pontada aguda a cada respiração.

Ele estendeu a mão para me ajudar a levantar.

Eu olhei para a mão dele, a mesma mão que me empurrou para sete anos de inferno.

Quando eu estava prestes a aceitar, apenas para poder chegar a um hospital, Carla apareceu correndo.

Ela se jogou nos braços de Pedro, chorando histericamente.

"Pedro! O Rex, ele engasgou com muita água para me proteger! Ele está muito mal, não está respirando direito! Você pode me acompanhar para levá-lo ao veterinário, por favor?"

O olhar de Pedro se suavizou instantaneamente ao ver Carla. Toda a sua atenção se voltou para ela.

Diante do apelo desesperado de Carla, ele concordou sem a menor hesitação.

"Claro, vamos agora."

Ele se virou para mim, como se só então se lembrasse da minha existência e de sua promessa de me levar ao hospital.

Sua expressão era de um leve incômodo, como se eu fosse um problema a ser resolvido rapidamente.

Antes que ele pudesse dizer qualquer coisa, Carla fez algo que me chocou.

Ela se ajoelhou na lama na minha frente, agarrando a barra da minha saia molhada, o rosto coberto de lágrimas.

"Ana Lúcia, por favor! Você não se machucou de verdade, não é? Deixe o Pedro levar o Rex ao veterinário primeiro, ok? Eu imploro! O Rex é tudo para mim, eu realmente não posso perdê-lo."

Rex. O cachorro que Pedro e Carla adotaram juntos. O símbolo do relacionamento deles.

Pedro olhou para mim, claramente esperando que eu fizesse uma cena.

"Vou pedir para alguém a levar de bicicleta ao hospital," ele disse apressadamente. "Eu irei encontrá-la depois que levar Carla e Rex ao veterinário."

Eu olhei para o rosto suplicante de Carla e para a impaciência nos olhos de Pedro.

Desta vez, eu não ia brigar. Eu não ia implorar. Eu não ia competir por sua atenção.

Eu respondi calmamente, minha voz desprovida de qualquer emoção.

"Ok, vá em frente."

            
            

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