Naquele momento, antes da escuridão, a imagem que a assombrava não era a do acidente, mas a de seu noivo, Pedro, e sua prima, Camila, rindo em seu escritório. Ela havia voltado para buscar os projetos esquecidos e os encontrou. Não era apenas uma traição, era uma humilhação completa. Eles não só a traíam como amantes, mas também roubavam seu trabalho, suas ideias, a maquete do projeto que definiria sua carreira.
A demissão veio no dia seguinte, por telefone, com a voz fria do pai de Pedro, o diretor da empresa. A influência de Pedro e Camila, os filhos do dono, era absoluta. Sofia perdeu o noivo, a melhor amiga, o emprego e o futuro, tudo em menos de vinte e quatro horas. O desespero a consumiu e a levou àquela estrada chuvosa.
E então, o zumbido da festa voltou a ser nítido.
Sofia piscou, a luz dos lustres de cristal ferindo seus olhos. Ela estava de pé, no meio do salão de festas da mansão de sua família, com a mesma taça de champanhe na mão. Seu coração batia descontroladamente, não de dor, mas de choque.
Ela olhou para as próprias mãos. Elas estavam firmes, sem um arranhão. Tocou o rosto, o pescoço. Nenhuma dor, nenhum vestígio do acidente.
O que estava acontecendo?
Ela puxou o celular da pequena bolsa. A data na tela a fez prender a respiração. Era o dia de sua festa de noivado. A festa estava acontecendo agora. Tudo o que ela se lembrava, a traição, a demissão, o acidente... ainda não tinha acontecido. Ou já tinha, em outra vida?
A ideia era absurda, mas a memória da dor era real demais para ser ignorada. Era uma ferida fantasma em sua alma.
Seus olhos varreram a multidão, procurando por eles. E lá estavam. Pedro, seu noivo, com seu sorriso charmoso e falso, conversando com um grupo de investidores. E ao lado dele, Camila, sua prima e melhor amiga, olhando para ele com uma adoração que Sofia, em sua ingenuidade anterior, nunca havia percebido.
A raiva subiu pela sua garganta, quente como bile. Ela se lembrou dos detalhes. A forma como Camila a abraçou mais cedo, dizendo o quanto estava feliz por ela. A forma como Pedro a beijou, prometendo um futuro brilhante. Mentiras. Tudo mentiras.
Seu olhar se fixou no pescoço de Camila. Lá estava. A prova. Um delicado colar de ouro com um pingente arquitetônico. Não era uma joia qualquer. era um modelo em miniatura do conceito principal de seu projeto mais recente e ambicioso, um design que ela havia mostrado apenas para Pedro. Um segredo profissional.
Naquela outra vida, ela só percebeu o significado do colar muito mais tarde, quando viu os projetos roubados com o nome de Camila neles. Mas agora, ela sabia. Aquilo não era um presente. Era um troféu. Um símbolo da vitória deles sobre ela.
Sofia sentiu uma calma fria se espalhar por seu corpo. A dor e o desespero de antes haviam se solidificado em uma determinação de aço. Ela não ia deixar acontecer de novo. Ela não seria a vítima desta vez.
Ela caminhou a passos firmes através do salão, ignorando os cumprimentos e os sorrisos. Todas as cabeças se viraram para ela, sentindo a mudança na atmosfera. O som das conversas diminuiu.
Ela parou bem na frente de Camila. Pedro se virou, o sorriso ainda no rosto, prestes a dizer algo amoroso. Mas o sorriso morreu quando ele viu a expressão de Sofia.
Sofia não olhou para Pedro. Seus olhos estavam cravados em Camila, ou melhor, no colar.
"Que colar bonito, prima", disse Sofia, sua voz clara e alta, cortando o silêncio que se formava.
Camila sorriu, um sorriso nervoso, tocando o pingente instintivamente.
"Obrigada, Sofia. Foi um presente".
"Um presente?", repetiu Sofia. "De quem?"
Camila olhou para Pedro, buscando ajuda. Pedro deu um passo à frente, tentando controlar a situação.
"Sofia, querida, o que está fazendo? Estamos no meio da nossa festa".
Sofia finalmente olhou para ele, um olhar tão frio que ele recuou um passo. Então, ela voltou sua atenção para Camila.
"Tire o colar", ordenou Sofia. Sua voz não era um pedido, era um comando.
O salão ficou em silêncio total. Todos os olhos estavam fixos neles.
"O quê?", gaguejou Camila, seu rosto empalidecendo. "Sofia, eu não..."
"Eu disse", repetiu Sofia, dando um passo mais perto, sua presença dominando completamente a de sua prima, "Tire. Esse. Colar. Agora".
A humilhação pública que eles planejaram para ela no futuro estava sendo devolvida a eles, bem ali, no auge de sua celebração. A primeira jogada da vingança de Sofia havia começado.