Nossos encontros eram agradáveis, as conversas eram fáceis. Falávamos sobre investimentos, planos de carreira, o melhor bairro para se comprar um apartamento. Ele admirava minha mente prática, e eu, a sua capacidade de sonhar grande e transformar esses sonhos em um negócio lucrativo.
O pedido de casamento aconteceu em uma noite de terça-feira, na cozinha do nosso apartamento, enquanto eu preparava o jantar. Não houve anel de veludo, nem joelhos no chão. Ele simplesmente se encostou na bancada, me observando cortar os legumes, e disse:
"Acho que deveríamos nos casar. Faz sentido. Somos um bom time."
Eu parei de cortar o tomate, olhei para ele e sorri.
"Sim, faz sentido" , respondi.
Meus pais tiveram um casamento tumultuado, cheio de paixões avassaladoras e brigas igualmente intensas. Eles se amavam e se odiavam na mesma medida, e a instabilidade emocional deles marcou minha infância. Eu prometi a mim mesma que teria algo diferente. Eu não buscava a paixão que consome, o amor que cega. Eu buscava um parceiro. Alguém com quem eu pudesse construir uma vida sólida, calma e previsível.
Lucas parecia ser essa pessoa.
Para mim, o casamento não era sobre romance, era sobre um contrato. Um acordo de respeito mútuo, parceria e lealdade. O amor, eu acreditava, era uma construção diária, feita de pequenos gestos de cuidado e confiança, não de grandes declarações e dramas. E por um tempo, funcionou.
Nossa vida era confortável. Compramos o apartamento, o decoramos com um estilo minimalista e funcional. Ele viajava muito, mas sempre trazia presentes e ligava todas as noites. Eu cuidava da nossa casa, das nossas finanças, da nossa vida social. Éramos o retrato da estabilidade. Um casal moderno e bem-sucedido.
A primeira rachadura nessa fachada perfeita apareceu em uma festa de Natal da empresa dele. Um de seus amigos mais antigos, depois de beber uísque demais, se aproximou de mim, com um ar conspiratório.
"Você é uma mulher de sorte, Sofia" , ele disse, a voz arrastada. "Conseguiu domar o Lucas. Eu achei que ele nunca superaria a Isabela. Aquilo sim era paixão. Fogo puro. Ele quase largou tudo para ir morar com ela em uma cabana no meio do nada, sabia? Falava em salvar o mundo, salvar as árvores... que loucura."
Ele riu, sem perceber a bomba que acabara de jogar no meu colo.
Isabela. O nome soou estranho. Lucas nunca a havia mencionado.
Naquela noite, quando chegamos em casa, enquanto ele tirava os sapatos, eu comentei, de forma casual:
"Seu amigo, o Marcos, é engraçado quando bebe. Ele me contou sobre uma tal de Isabela."
Lucas congelou. Ele estava de costas para mim, mas eu vi a tensão em seus ombros.
"O Marcos fala demais" , ele disse, a voz controlada. "Foi há muito tempo. Não significou nada."
Eu caminhei até ele e o virei para me encarar. As luzes da cidade entravam pela janela, projetando sombras longas em seu rosto.
"Lucas, nós temos um acordo. E esse acordo se baseia na honestidade. Eu não me importo com o seu passado, mas me importo com mentiras no presente."
Ele suspirou, passando a mão pelo rosto.
"Foi um namoro de faculdade, Sofia. Intenso, idealista. Nós queríamos coisas diferentes da vida. Ela queria salvar o planeta, eu queria construir uma carreira. Acabou. Fim da história."
Eu o encarei por um longo tempo, tentando decifrar a verdade em seus olhos.
"Tudo bem" , eu disse por fim. "Mas quero que saiba de uma coisa. Eu não compito com fantasmas. Se o passado resolver bater na nossa porta, eu espero que você saiba escolher qual lado dela você quer ficar."
Ele me abraçou, um abraço apertado, quase desesperado.
"A minha escolha é você, Sofia. Sempre foi."
Eu acreditei nele. Ou melhor, eu escolhi acreditar. Porque a alternativa era admitir que a base sólida sobre a qual eu construí minha vida talvez não passasse de areia movediça. E essa era uma verdade que, na época, eu ainda não estava pronta para encarar.