O caos continuava, com José tentando acalmar os convidados e Pedro ainda gritando sobre como Sofia era a culpada. Ninguém, exceto Ana Lúcia em sua encenação, ofereceu ajuda. Eles a olhavam como se ela fosse uma peça quebrada, uma bagunça a ser limpa.
Foi então que uma figura calma e digna se moveu através da multidão. O mordomo, um homem de cabelos grisalhos que servia a família de Sofia desde antes de ela nascer, ajoelhou-se ao seu lado. Ele ignorou todos os outros.
"Senhorita Sofia", ele disse em voz baixa e respeitosa, seus olhos mostrando uma preocupação genuína. "Permita-me ajudá-la."
Ele tirou um lenço de linho branco do bolso e pressionou suavemente contra o ferimento na cabeça dela para estancar o sangramento. Seu toque era firme e reconfortante.
"Vamos sair daqui", ele sussurrou.
Com a ajuda do mordomo, Sofia conseguiu se levantar. Suas pernas tremiam, e o salão girava ao seu redor. Ela se apoiou pesadamente nele, ignorando os olhares e os sussurros dos convidados. Enquanto ele a guiava para fora do salão, ela ouviu a voz de José chamando-a, um misto de raiva e pânico.
"Sofia, onde você pensa que vai? Nós não terminamos!"
Ela não olhou para trás. O mordomo a levou pelas escadas de serviço, longe dos olhos curiosos, até seu quarto. Ele a ajudou a sentar-se na cama e foi buscar o kit de primeiros socorros.
"O ferimento parece superficial, mas um médico deveria examiná-lo", disse ele, limpando o sangue com cuidado.
"Obrigada, Afonso", sussurrou Sofia.
"Eu sou leal à sua mãe, senhorita Sofia. E, portanto, sou leal a você", respondeu ele simplesmente. "A verdadeira senhora desta casa."
Suas palavras eram um bálsamo para a alma ferida de Sofia. Ela não estava completamente sozinha.
Depois que Afonso terminou o curativo e saiu, prometendo trazer um chá, Sofia ficou sentada no silêncio de seu quarto. A adrenalina passou, deixando para trás uma dor profunda e uma exaustão avassaladora. Ela olhou para o seu reflexo no espelho. O vestido de festa caro, agora manchado e rasgado. O cabelo emaranhado. O curativo branco em sua cabeça.
Ela não chorou. As lágrimas já haviam secado, substituídas por uma determinação fria.
Ela se lembrou de um telefone antigo que guardava em uma gaveta, um modelo simples que sua mãe lhe dera para emergências. Ela o pegou. A bateria estava quase no fim, mas ainda funcionava.
Com os dedos trêmulos, ela discou um número que sabia de cor. O número particular de sua mãe.
O telefone chamou uma, duas, três vezes. Sofia prendeu a respiração. A história oficial era que Dona Clara estava em uma clínica exclusiva na Suíça, sem acesso a telefones, tratando de uma "doença rara e debilitante". Uma mentira que José contava a todos.
"Alô?"
A voz do outro lado não era de uma mulher doente. Era forte, clara e cheia de autoridade. Era a voz de sua mãe.
"Mãe?", sussurrou Sofia, a voz embargada.
"Sofia? Querida, o que aconteceu? Por que está me ligando neste número?" A preocupação na voz de Dona Clara era real e imediata.
As comportas se abriram. Sofia contou tudo, entre soluços. A festa, a acusação de Ana Lúcia, a traição de José e Pedro, o celular quebrado, o empurrão, o sangue. Ela despejou meses de dor e solidão em uma única ligação.
Do outro lado da linha, Dona Clara ouviu em silêncio. Quando Sofia terminou, houve uma pausa.
"Eles fizeram isso com você?", a voz de Dona Clara era baixa, mas vibrava com uma fúria contida que Sofia conhecia bem. "Eles ousaram colocar as mãos na minha filha."
"Mãe, eu não sabia o que fazer...", começou Sofia.
"Você fez o que podia, querida. Agora é a minha vez", disse Dona Clara, a voz agora fria como aço. "A propósito, eu não estou na Suíça. Estou em Fernando de Noronha. Tirei umas férias, precisava de um tempo longe daquele homem. Mas as férias acabaram."
Sofia ficou chocada. "Férias?"
"Eu precisava que o José se sentisse seguro, que ele e seus cúmplices mostrassem suas verdadeiras cores. Eu sabia que ele estava desviando dinheiro, mas machucar você... isso ele vai pagar caro", explicou a mãe. "Estou pegando o primeiro voo de volta. Estarei aí em menos de vinte e quatro horas. Até lá, tranque sua porta, não fale com eles. Afonso cuidará de você. Apenas descanse, minha filha. A tempestade está chegando para eles."
A promessa na voz de sua mãe era absoluta. Sofia desligou o telefone, uma onda de alívio e satisfação a invadindo. Ela não estava mais sozinha. A rainha estava voltando para o tabuleiro.
Esgotada, mas com o coração finalmente em paz, Sofia se deitou na cama e, pela primeira vez em muito tempo, adormeceu profundamente, sonhando com a justiça que estava por vir.