A música alta vibrava em meu peito, mas não era páreo para a ansiedade que me consumia.
Ricardo Mendes, meu namorado há cinco anos, me segurava com uma possessividade que antes me acalmava e agora parecia uma gaiola.
Eu era seu bibelô, sua boneca, e por cinco anos, cega pelo que pensei ser amor, aceitei meu papel.
Então, ele pegou o microfone, e o mundo ao redor emudeceu, todos os olhos voltados para nós.
"Muitos de vocês conhecem a Júlia. Por cinco anos, ela foi uma companhia divertida... uma distração adorável."
A palavra 'distração' me atingiu como um tapa.
"Mas toda distração tem seu fim. E hoje, apresento a mulher que realmente importa: minha alma gêmea."
De repente, Clara, sua assistente, surgiu usando o "Oceano Estrelado", o colar da minha falecida mãe, que Ricardo jura ter guardado para me proteger.
Ele a beijou na frente de todos, e o mundo de Júlia desabou.
A humilhação foi pública, esmagadora.
"O show acabou, Júlia. Você pode ir. Preciso do apartamento de volta até amanhã."
Lágrimas queimavam meus olhos, mas algo dentro de mim se partiu e se refez, mais duro e afiado.
A submissão de cinco anos se transformou em fúria fria.
"Você se engana sobre quem é o palhaço principal."
Minha voz nem sequer tremeu.
"Fique com o colar. Fique com a sua 'alma gêmea' . Vocês se merecem, pessoas superficiais precisam de objetos superficiais para provar algo que não existe."
Eu não dei a ele a satisfação de uma única lágrima.
"E não se preocupe com o apartamento, Ricardo. Eu nunca gostei da decoração mesmo. É tão sem alma quanto o dono."
Deixei para trás as ruínas de minha antiga vida, respirando, pela primeira vez em cinco anos, o ar da liberdade.