Pedro, meu marido, estava trabalhando em outra cidade há meses, em um projeto importante para sua empresa. Ele era um empresário de sucesso, sempre ambicioso, e eu, uma arquiteta talentosa, tinha colocado minha carreira em pausa para cuidar da nossa família, para cuidar de Alice. Eu não me arrependia, mas a saudade apertava.
Quando finalmente chegamos ao imponente prédio comercial onde Pedro trabalhava, meu coração batia um pouco mais rápido. A ideia da surpresa me enchia de uma alegria quase infantil. Peguei Alice no colo, que se agarrou ao meu pescoço, e entramos no lobby moderno e frio.
A recepcionista nos olhou com uma curiosidade polida. "Pois não?"
"Eu gostaria de ver o Pedro Almeida. Sou a esposa dele, Júlia."
Ela pareceu surpresa, mas interfonou. "Senhor Pedro, sua esposa, Júlia, está aqui."
Subimos pelo elevador espelhado. Alice olhava para o nosso reflexo com admiração. Quando as portas se abriram no andar da empresa, o que vi não foi o que eu esperava.
Pedro não estava sozinho. Ele estava no meio de um grupo de colegas, rindo de algo que uma mulher jovem e muito bonita ao seu lado tinha dito. Quando seus olhos encontraram os meus, o sorriso em seu rosto congelou. Não foi um congelamento de surpresa feliz, mas de puro pânico. Seus olhos se arregalaram e a cor sumiu de seu rosto por um instante.
A mulher ao seu lado, que usava um vestido justo e caro, percebeu a mudança em sua expressão e se virou para me olhar. Ela não pareceu surpresa, mas sim... divertida. Um pequeno sorriso presunçoso brincou em seus lábios enquanto ela me analisava de cima a baixo, da minha roupa simples de viagem aos meus cabelos um pouco desarrumados. Os outros colegas de trabalho desviaram o olhar abruptamente, alguns se virando para seus computadores, outros de repente muito interessados em papéis sobre suas mesas. A atmosfera leve e descontraída se tornou pesada e silenciosa.
"Júlia! Alice!", a voz de Pedro soou alta demais, forçada. Ele se apressou em nossa direção, deixando o grupo para trás. "Meu amor, que surpresa maravilhosa! O que vocês estão fazendo aqui?"
Ele tentou me abraçar, mas eu senti a rigidez em seu corpo. Ele estava atuando.
Alice, inocente a toda a tensão, se soltou do meu colo e correu para ele, gritando "Papai!".
Pedro a pegou no colo, a abraçando com força, mas seus olhos não estavam nela. Eles estavam em mim, ansiosos, e depois, por um segundo, fugiram de volta para a mulher que agora nos observava abertamente, com os braços cruzados. Ele parecia um ator em uma peça mal ensaiada, desesperado para que o público acreditasse em sua performance.
"Viemos te ver, papai! Foi uma surpresa!", disse Alice, beijando o rosto dele.
"Que surpresa boa, filha", ele disse, mas sua voz era oca. Ele olhou para mim de novo. "Você deve estar cansada. A viagem é longa."
Eu não respondi. Apenas fiquei ali, parada, sentindo um frio se espalhar pelo meu estômago. A arquiteta dentro de mim, treinada para ver detalhes e estruturas, via todas as rachaduras naquela cena. O olhar desviado dos colegas. A postura desafiadora daquela mulher. O pânico mal disfarçado nos olhos do meu marido.
"Essa é Sofia", disse Pedro, finalmente, com a voz um pouco tensa. "Minha colega de trabalho. Sofia, esta é minha esposa, Júlia, e minha filha, Alice."
Sofia deu um passo à frente, seu sorriso agora amplo e sem nenhum traço de simpatia.
"Prazer, Júlia. O Pedro fala muito de vocês", ela disse, mas seu tom era irônico. E então, ela se virou para a minha filha no colo de Pedro. "Oi, Alice. Você é ainda mais fofa pessoalmente. Seu pai me mostrou tantas fotos suas."
Essa frase me atingiu. Ela conhecia minha filha. Ela via fotos da minha filha.
Alice, com a inocência de seus cinco anos, sorriu para Sofia. "Oi. Você é bonita. Parece a boneca da TV."
O rosto de Pedro se contraiu em uma careta de dor. Sofia riu, uma risada clara e alta no escritório silencioso. "Obrigada, querida. Você também é uma princesa."
Eu continuei em silêncio, fingindo olhar a paisagem urbana pela janela enorme do escritório, mas meus olhos viam tudo. Via como a mão de Sofia tocou o braço de Pedro de forma casual, mas íntima. Via como Pedro se encolheu levemente com o toque. Via a mentira em cada gesto, em cada palavra forçada. A surpresa que eu planejei com tanto carinho havia se transformado em um palco para a minha própria humilhação.