A Dor da Desilusão
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Capítulo 4

Maria não sabia como, mas conseguiu chamar uma ambulância. A dor era uma névoa vermelha que a consumia. No hospital público, o caos era a norma. Macas nos corredores, o cheiro de antisséptico e desespero no ar.

Enquanto esperava, encostada numa parede fria, ela o viu. Do outro lado da sala de espera, Pedro estava de pé, o rosto contorcido de preocupação. Mas não era para ela. Ao lado dele, sentada em uma cadeira, estava Sofia, a impostora. Ela choramingava, mostrando a ele um pequeno arranhão no braço.

"Doeu tanto, amor," ela dizia. "Aquele motorista de aplicativo freou muito bruscamente."

Pedro a acalmava, beijando sua testa, oferecendo-lhe água. "Calma, meu bem, vamos cuidar de você. Já chamei o médico."

A visão era tão surreal, tão cruel, que Maria sentiu como se estivesse assistindo a uma peça de teatro grotesca. Ela estava ali, sangrando, perdendo o filho dele, e ele estava a poucos metros de distância, cuidando de um arranhão da mulher que a substituíra. A solidão que a atingiu foi mais devastadora que a dor física.

Uma enfermeira passou, viu o estado de Maria e seus olhos se arregalaram.

"Minha senhora! Você está sangrando!"

O pânico na voz da enfermeira a tirou de seu torpor. Em instantes, ela estava em uma maca, sendo empurrada às pressas por um corredor, as luzes do teto passando como borrões. A última coisa que ela ouviu antes de a anestesia a apagar foi um médico gritando: "Hemorragia grave! Sala de cirurgia, agora!"

Quando acordou, o ambiente era outro. O cheiro de desinfetante fora substituído por um leve aroma de lírios. O quarto era espaçoso, luxuoso, com lençóis macios e uma luz suave entrando pela janela. Era um hospital particular.

Ao lado de sua cama, sentados, estavam seus pais, João e Helena da Silva. O rosto de sua mãe estava inchado de tanto chorar. Seu pai, um homem que ela sempre vira como uma fortaleza inabalável, parecia ter envelhecido dez anos.

"Mãe? Pai? O que aconteceu?" sua voz era fraca.

Sua mãe segurou sua mão, as lágrimas escorrendo silenciosamente. Foi seu pai quem falou, a voz grave e cheia de uma dor contida.

"Nós te encontramos, filha. Um vizinho nos ligou. Nós te transferimos para cá."

Maria sentiu um calafrio. Ela levou a mão instintivamente à sua barriga, agora estranhamente vazia.

"O bebê..." ela sussurrou, o medo se tornando certeza. "Onde está o meu bebê?"

Helena desabou em soluços. João fechou os olhos com força, a mandíbula tensa.

"Eles não puderam salvá-lo, minha querida," ele disse, a voz quebrando. "Eu sinto muito. Sinto tanto."

Um grito saiu da garganta de Maria. Um som animal, primitivo, arrancado do fundo de sua alma. A dor da perda era uma ferida física, um buraco negro que a consumia por dentro. Ela chorou até não ter mais lágrimas, até seus pulmulos arderem, até o colapso.

E então, no silêncio que se seguiu, algo novo nasceu das cinzas de sua dor. Um frio cortante. Uma clareza aterrorizante. Ela olhou para o pai, João da Silva, o verdadeiro e poderoso fazendeiro de café, o homem cujo nome Sofia havia roubado para enganar Pedro.

Um fogo gelado se acendeu em seus olhos.

"Eles vão pagar," ela disse, a voz baixa e letal. "O Pedro e aquela mulher. Eles tiraram meu filho de mim. Eu juro, pai. Eles vão pagar por isso."

Nos dias seguintes, durante sua recuperação, o celular de Maria vibrava incessantemente. Eram mensagens de Pedro.

"Maria, onde você se meteu? Precisamos conversar sobre o divórcio."

"Por que você não atende? Está se escondendo?"

"Isso é muito infantil da sua parte. Assuma suas responsabilidades."

Ele não fazia a menor ideia. Ele não sabia que ela quase morrera. Ele não sabia que o filho deles estava morto.

Ela leu cada mensagem, e a cada palavra, seu coração se transformava um pouco mais em pedra. Ela não respondia. Apenas deixava o ódio crescer, se solidificar, tornando-se a armadura que a protegeria e a arma que ela usaria.

                         

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