Passei três dias e três noites em um estado de semi-consciência no hospital.
A fumaça havia danificado seriamente meus pulmões, e eu tinha queimaduras de primeiro e segundo graus nos braços e nas costas.
Durante todo esse tempo, Ricardo não apareceu.
Nenhuma ligação. Nenhuma mensagem. Nenhum buquê de flores baratas.
Nada.
O silêncio dele era mais ensurdecedor do que qualquer grito. Confirmava tudo o que eu já sabia. Para ele, eu já estava morta.
No quarto dia, uma enfermeira entrou no quarto com uma prancheta e um olhar desconfortável.
"Senhora Ana Paula", ela começou, hesitante. "A conta do hospital... ela está se acumulando. Precisamos que alguém se responsabilize pelo pagamento."
Meu coração afundou. Eu não trabalhava. Ricardo controlava todas as finanças. Eu não tinha acesso a grandes quantias de dinheiro.
Com um suspiro de resignação, pedi à enfermeira que ligasse para ele. Era a única maneira.
Uma hora depois, a porta do meu quarto se abriu.
Mas não era apenas Ricardo. Ele entrou com Patrícia a seu lado.
Ele usava um terno impecável, o cabelo perfeitamente penteado, como se viesse de uma reunião de negócios, não para visitar sua esposa ferida.
Patrícia, por outro lado, parecia ter saído de uma revista de moda. Usava um vestido novo, de uma marca cara que eu reconheci. Seu cabelo estava brilhante, a maquiagem impecável. Não havia um único sinal de que ela estivera em um incêndio há poucos dias. Em suas mãos, ela carregava uma cesta de vime cheia de suplementos e tônicos caríssimos.
A imagem dos dois juntos, saudáveis e radiantes, em contraste com o meu estado, deitada em uma cama de hospital, com o corpo dolorido e a pele enfaixada, foi uma facada.
"Ouvi dizer que você precisava de dinheiro", disse Ricardo, sem sequer um "olá" ou "como você está?". Sua voz era fria, distante.
"A conta do hospital", respondi, a voz fraca.
Ele fez uma careta, como se eu estivesse pedindo algo absurdo.
"Ana Paula, não comece com o drama", ele disse, o tom de voz subindo. "Patrícia também estava no incêndio e já está recuperada. Você não precisa fingir que está morrendo só para chamar atenção. Que ciúme doentio é esse?"
Ciúme? Eu estava lutando pela minha vida e ele me acusava de ciúmes.
Antes que eu pudesse responder, Patrícia deu um passo à frente, com um sorriso vitorioso.
"Ana, não seja assim com o Ricardo", ela disse, com uma falsa doçura. "Ele tem estado tão preocupado comigo."
Ela colocou a cesta de suplementos na minha mesa de cabeceira.
"Trouxe isso para você. Ricardo comprou para mim, mas eu me recuperei tão rápido que nem precisei. Pensei que você poderia aproveitar."
A humilhação era palpável. Ela estava me oferecendo as sobras dele.
"Ah, e tenho uma novidade!", ela continuou, incapaz de conter sua alegria. "Eu vou me mudar! Para o apartamento ao lado do de vocês. Ricardo achou que seria melhor, assim eu posso ficar de olho nele, garantir que ele se alimente direito. Ele fica tão perdido sem alguém para cuidar dele."
A bomba explodiu no silêncio do quarto.
Mudar-se para o apartamento ao lado.
Não era apenas uma traição, era uma invasão. Ela não estava apenas roubando meu marido, estava roubando meu espaço, minha paz, meu lar.
Olhei para Ricardo, esperando, implorando com os olhos por um pingo de decência, que ele negasse, que dissesse que era uma piada de mau gosto.
Ele apenas desviou o olhar, confirmando tudo com seu silêncio covarde.