Isabela e o Jogo da Farsa
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Capítulo 3

Passei quase uma hora trancado no banheiro. Eventualmente, a voz de Sofia soou do outro lado da porta, suave e cheia de uma falsa preocupação que agora me era familiar.

"Ric, está tudo bem aí dentro? Isabela está preocupada. Nós estamos preocupadas."

Nós. A palavra soou como veneno.

"Estou bem," respondi, a voz vazia.

"Por favor, saia. Você não comeu nada. Deixe-me cuidar de você. Eu sempre cuidei de você, não é?"

A chantagem emocional era tão óbvia agora. Tão patética.

[Sofia apela para a dinâmica de poder histórica. Objetivo: reativar a dependência emocional de Ricardo.]

[Cada ponto de culpa que Ricardo sente gera +1 ponto de "Saúde" para Marcos. O estado de saúde atual de Marcos é "Excelente".]

Saúde. Então eles não estavam apenas roubando meu dinheiro e minha carreira. Estavam roubando minha própria vitalidade. A cada vez que eu me sentia mal, Marcos se sentia melhor. A ironia era doentia.

Abri a porta. Sofia estava ali, o rosto uma máscara de angústia fraterna.

"Você me assustou," ela disse, tentando me abraçar.

Dei um passo para trás, me apoiando nas muletas. O movimento foi brusco e desajeitado.

"Não me toque."

A surpresa no rosto dela foi genuína por um segundo, antes que a máscara voltasse ao lugar.

"Ricardo, o que há de errado? É a dor? Nós podemos ligar para o médico, pedir analgésicos mais fortes."

"Vocês se importam com a minha perna?" perguntei, a voz cortante. "Ou só se importam se eu estou agindo de acordo com o roteiro?"

Sofia piscou, claramente pega de surpresa pela minha pergunta direta.

"Que roteiro? Meu irmão, você está delirando. É o trauma, os remédios..."

Ela parou por um instante, e nesse breve silêncio, vi um flash de cálculo em seus olhos. Ela estava se reajustando, mudando de tática.

"Eu sei que é difícil," ela continuou, a voz agora suave e compreensiva. "Mas você tem que ser forte. Por mim. Por Isabela. Pense em tudo que eu fiz por você. Quando mamãe e papai morreram, quem ficou? Eu. Abandonei meus planos, minha faculdade, para te criar. Tudo que eu fiz foi por você."

Era uma história que ela contava com frequência. A irmã mártir. A salvadora. E eu, o tolo, sempre acreditei. Sempre me senti em dívida.

Mas agora, as legendas pintavam um quadro diferente.

[Análise histórica: Sofia não abandonou a faculdade. Ela foi expulsa por baixo desempenho. Ela usou o dinheiro do seguro de vida dos pais, destinado à educação de Ricardo, para sustentar um estilo de vida luxuoso e investir nos negócios iniciais de Marcos.]

A raiva que senti antes no banheiro voltou com força total. Cada centavo que ganhei na minha carreira, a maior parte ia para uma conta conjunta que ela administrava, "para o nosso futuro", ela dizia. Agora eu entendia qual era o futuro que ela estava planejando. E não era o meu.

Meu celular, que estava no bolso do meu roupão, tocou. O nome de Marcos brilhava na tela.

Sofia pegou o telefone antes que eu pudesse reagir.

"É o Marcos. Ele está preocupado," ela disse, atendendo. "Marcos? Sim, ele está aqui... um pouco abalado, mas vai ficar bem... O quê? O evento de caridade do clube? Amanhã?"

Ela se virou para mim, os olhos brilhando com uma ideia.

[Marcos sugere que Ricardo apareça no evento de caridade do clube. Presença de Ricardo, mesmo ferido, geraria uma onda de publicidade positiva para Marcos, pintando-o como um "amigo leal que apoia o colega em tempos difíceis". Bônus de sistema estimado: +100 pontos de "Reputação" para Marcos.]

"Marcos acha que seria bom para você sair um pouco," disse Sofia, com um tom casual. "Ver os amigos, sentir o apoio dos fãs. Vai te animar."

"Não," eu disse. A palavra saiu firme, sem hesitação. "Eu não vou a lugar nenhum."

A paciência de Isabela, que havia se aproximado silenciosamente, se esgotou.

"Ricardo, pare de ser infantil! Marcos está tentando ajudar! Todo mundo está tentando te ajudar, e você está agindo como uma criança mimada!"

"Eu não quero a ajuda dele," repeti, olhando diretamente para ela.

"Você vai!" Sofia interveio, a voz dura. "Pense na imagem do clube. Pense na sua reputação. Se você se esconder, as pessoas vão pensar que você está acabado. Você precisa mostrar força!"

"Minha perna está quebrada," eu disse, a voz cheia de um sarcasmo amargo. "Minha carreira provavelmente acabou. Qual reputação eu tenho que salvar?"

"Você não vai estragar isso para o Marcos!" Isabela sibilou, o veneno finalmente vazando por trás da máscara de esposa amorosa. "Ele tem uma imagem a zelar! E você, como amigo dele, tem a obrigação de ajudar!"

A obrigação. A palavra ficou suspensa no ar. Minha obrigação era me arrastar, quebrado e humilhado, para um evento público para que meu rival, o homem que orquestrou minha destruição, pudesse parecer um herói.

A exaustão me atingiu como uma onda. Eu não tinha mais forças para lutar. Não ali, não naquele momento.

"Tudo bem," eu cedi, a voz derrotada. "Eu vou."

O alívio nos rostos delas foi instantâneo e nojento. Elas sorriram uma para a outra, um brilho de vitória nos olhos. Elas achavam que tinham ganhado.

Elas não faziam ideia de que eu já não estava mais jogando o jogo delas.

Eu estava apenas esperando o momento certo para virar o tabuleiro.

                         

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