Caminhos De Liberdade
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Capítulo 4

No dia seguinte ao confronto com Elvira, eu tomei uma decisão. Eu não podia ficar em um lugar onde cada esquina me lembrava do meu filho, da minha dor, da minha perda.

Fui ao hospital visitar o Dr. Ricardo, não como paciente, mas como amiga. Ele foi a única pessoa que me estendeu a mão quando eu estava no fundo do poço.

Ele me recebeu em sua sala, seus olhos gentis cheios de uma tristeza genuína por mim.

"Ana. Sinto tanto, tanto pela sua perda. Não há palavras."

"Eu sei, Ricardo. Obrigada."

Eu me sentei e contei a ele tudo. Sobre o funeral, sobre a visita de Elvira, sobre minha decisão de me divorciar.

Ele ouviu pacientemente, sem interromper. Quando terminei, ele ficou em silêncio por um momento.

"Você está fazendo a coisa certa, Ana. Você precisa se afastar, se curar."

Enquanto falávamos, minha mente vagou por um breve momento. Lembrei-me de um dos raros momentos felizes com Pedro, logo no início. Estávamos em uma praia, ao pôr do sol. Ele me segurou e disse que construiríamos um império juntos. Na época, pareceu romântico. Agora, eu via a verdade: ele falou de um império, não de uma família. A conexão foi uma ilusão.

"Eu preciso ir embora, Ricardo. Para longe daqui."

"Eu entendo. E talvez eu possa ajudar."

Ele abriu uma gaveta e tirou um folheto.

"Eu tenho um colega, um grande amigo, que dirige uma clínica de bem-estar e pesquisa em Portugal. É um lugar lindo, tranquilo. Eles têm um programa de residência para profissionais de diversas áreas que querem tirar um tempo para se concentrar em projetos pessoais, pesquisa... ou apenas para se reencontrar."

Meus olhos se fixaram no folheto. Imagens de colinas verdes, de um mar azul-calmo. Parecia outro mundo.

"Ele me deve um favor. Eu posso conseguir uma vaga para você. Eles têm uma ótima biblioteca de arquitetura, inclusive. Você poderia voltar a desenhar, a criar. Sem pressão."

A ideia de voltar a desenhar, de criar algo bonito em vez de viver em meio à destruição, era como um bálsamo.

"Eu... eu não sei como agradecer, Ricardo."

"Não agradeça. Apenas vá. Cuide-se. Reconstrua sua vida. Você merece ser feliz, Ana."

A bondade dele, tão pura e desinteressada, me emocionou.

Saí do hospital com um novo propósito.

Antes de partir, eu precisava fazer uma última coisa.

Visitei minha mãe. Ela morava em uma casa de repouso. Anos de uma doença degenerativa a haviam deixado frágil, mas sua mente ainda era lúcida. Ela se sacrificou muito por mim, trabalhando em dois empregos para pagar minha faculdade de arquitetura.

Encontrei-a no jardim, sentada em uma cadeira de rodas, olhando para as flores.

Contei a ela sobre João. Sobre a queda. Sobre a morte dele.

Lágrimas silenciosas rolaram por seu rosto enrugado. Ela pegou minha mão com a sua, que tremia um pouco.

"Oh, minha filha. Minha querida filha."

Não havia julgamento em sua voz, apenas dor compartilhada.

"Eu sinto muito, mamãe. Eu sinto que falhei com ele."

"Não" , disse ela, com uma firmeza surpreendente. "Você não falhou. Aquele homem... Pedro... ele nunca te mereceu. Eu nunca gostei dele. Ele sempre olhou para você como um prêmio, não como uma pessoa."

Suas palavras eram a validação que eu nem sabia que precisava desesperadamente.

"Eu estou indo embora, mamãe. Vou para Portugal por um tempo."

"Vá. Vá, minha filha. Viva. Viva por você, e viva pelo menino."

Ela apertou minha mão.

"Eu guardei um dinheiro. Da venda da nossa antiga casa. É seu. Use-o para começar de novo. Não discuta."

Eu protestei, mas ela foi inflexível. O apoio dela, incondicional e absoluto, era a armadura que eu precisava.

"Eu prometo, mamãe. Eu vou ficar bem. Eu vou construir algo novo. Algo só meu."

"Eu sei que vai."

Nos despedimos com um abraço apertado e demorado.

De volta ao meu apartamento, fiz as malas. Apenas o essencial. Roupas, alguns livros, meu material de desenho. Deixei para trás tudo o que me ligava à vida com Pedro.

Liguei para um advogado que o Dr. Ricardo me indicou. Dei-lhe instruções claras. Entregar os papéis do divórcio a Pedro. Sem negociações. Eu não queria nada dele. Apenas minha liberdade.

Com a passagem de avião comprada e as malas prontas, eu estava de pé na sala do meu apartamento, olhando para o espaço vazio. Era o fim de um capítulo doloroso.

E o começo de uma jornada incerta, em direção a um futuro que eu mesma construiria.

                         

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