Desde pequena, meu pai me ensinou que para sobreviver e prosperar naquele mundo, eu precisava me encaixar. Então, eu me esforcei. Fui para as mesmas escolas, usei as mesmas marcas, aprendi a jogar tênis e a velejar. E me tornei amiga do trio de herdeiros.
Eu me tornei a confidente de Bruno, a parceira de debates de Pedro, e o desafio constante de Lucas. Eu me adaptei, me moldei, sacrifiquei partes de mim mesma para pertencer àquele círculo. Eu acreditava que era necessário, um investimento no futuro da nossa família. Eu acreditava que eles eram meus amigos.
Que tola eu fui.
Quando o escândalo de fraude do meu pai explodiu na mídia e nossos bens foram congelados, o telefone parou de tocar. Os convites para festas pararam de chegar. Lucas, Bruno e Pedro, meus "amigos" de uma vida inteira, desapareceram. Nenhuma mensagem, nenhuma ligação. Apenas um silêncio ensurdecedor que gritava a verdade: nossa amizade era condicional, baseada no status e no dinheiro que não tínhamos mais.
A humilhação no restaurante e a revelação no estacionamento foram apenas a confirmação final. Eu estava sozinha.
Alguns dias depois do desastre do jantar, eu estava voltando para casa a pé. O carro havia sido confiscado, e o dinheiro para táxi era um luxo que não podíamos mais pagar. A noite estava caindo, e a rua estava deserta.
De repente, uma van preta parou bruscamente ao meu lado. A porta deslizou e dois homens mascarados saltaram para fora.
Antes que eu pudesse gritar, um deles tapou minha boca com uma mão suja e me arrastou para dentro do veículo.
Tudo aconteceu muito rápido. O cheiro de suor e mofo, o motor acelerando, a escuridão. Fui jogada no chão da van, meu corpo tremendo incontrolavelmente.
Eles me levaram para um armazém abandonado. O lugar fedia a umidade e poeira. Amarraram minhas mãos e pés a uma cadeira de metal fria.
Um dos homens tirou a máscara. Era um rosto que eu não conhecia, duro e cruel.
"Olha o que temos aqui", ele disse, circulando ao meu redor. "A filhinha do grande arquiteto. Não parece tão grande agora, parece?"
Ele pegou meu celular da minha bolsa. "Vamos ligar para o papai. Acho que ele vai querer pagar um bom resgate para ter a princesinha de volta. Se é que ele ainda tem algum dinheiro."
Meu coração batia descompassado no peito. Medo. Um medo puro e gelado como eu nunca havia sentido. Meu pai não tinha como pagar nada. Estávamos arruinados.
"Ele... ele não tem dinheiro", gaguejei.
O homem riu. "Então vamos ter que encontrar outra forma de pagamento."
Ele se aproximou, o hálito azedo batendo no meu rosto. Ele passou a mão no meu cabelo, e eu me encolhi de nojo e pavor.
"Você é bonita. Muito bonita. Talvez a gente possa se divertir um pouco antes de te descartar."
O outro homem riu. O desespero tomou conta de mim. Eu fechei os olhos, esperando o pior, rezando para que acabasse logo.
E então, um barulho. A porta do armazém foi arrombada com um estrondo.
Luzes fortes invadiram a escuridão, ofuscando meus olhos. Silhuetas apareceram na entrada.
Os dois homens que me sequestraram ficaram em pânico, sacando armas. Mas era tarde demais.
Uma figura se moveu mais rápido que as outras, desarmando o homem mais próximo de mim com uma velocidade impressionante. Barulhos de luta, gritos. Em segundos, tudo ficou em silêncio.
Meus sequestradores estavam no chão, gemendo de dor.
A figura que me salvou se aproximou. Quando meus olhos se ajustaram à luz, meu coração parou.
Era Pedro.
Ele correu até mim, o rosto pálido de preocupação.
"Sofia! Meu Deus, você está bem?"
Ele cortou as cordas que me prendiam com uma faca. Assim que minhas mãos ficaram livres, eu me agarrei a ele, tremendo, soluçando, o alívio e o choque me dominando completamente.
Ele me abraçou forte, sua mão afagando meu cabelo.
"Calma, está tudo bem agora. Eu estou aqui. Eu estou aqui."
Naquele momento, no meio do caos e do medo, o episódio do estacionamento foi esquecido. A humilhação, a traição. Tudo desapareceu. Tudo o que importava era que ele estava ali. Ele me salvou.
Ele era meu herói.