"Você sabe que são quase dez da noite, certo? E que para casar amanhã, precisamos de uma licença especial ou de um juiz de paz muito compreensivo e provavelmente subornado?" ele reclamou, mas o tom dele não era de recusa. Era mais como se ele estivesse resolvendo um problema de logística. "Isso é loucura."
"Eu sei. Mas você é Gabriel. Você consegue coisas," Laura disse, uma pontada de culpa a atingindo. Ela estava usando a reputação dele, a admiração que ele tinha por ela, para sua própria vingança. Era egoísta e impulsivo, mas a dor era tão avassaladora que a racionalidade tinha desaparecido.
"Isso não é um negócio imobiliário, Laura. É um casamento," ele disse, a voz um pouco mais suave agora. "O que aconteceu? O Pedro..."
"O Pedro não importa mais," ela o cortou. "Escuta, Gabriel, eu não vou mentir para você. Isso não é sobre amor eterno. É sobre necessidade. É sobre... sobrevivência, de certa forma. Se você não puder, eu entendo. Eu vou ligar para outra pessoa." Era uma mentira. Não havia outra pessoa.
Houve outra pausa. Laura prendeu a respiração.
"Não ligue para outra pessoa," ele disse, e a firmeza em sua voz a surpreendeu. "Você tem certeza disso? Casar comigo? Um casamento de verdade, no papel?"
"Tenho," ela respondeu, sem hesitar.
"Tudo bem," ele disse, e o som de fundo mudou. Ela o ouviu andando, talvez pegando as chaves do carro. "Me mande seu endereço. E os documentos que você tiver aí. Identidade, certidão de nascimento. O que for. Vou dar um jeito."
Laura sentiu uma onda de alívio tão forte que suas pernas fraquejaram. Ela se apoiou na penteadeira.
"Obrigada, Gabriel."
"Não me agradeça ainda. Você pode se arrepender disso amanhã," ele disse, com um tom seco. "Mas eu não vou. Eu venho esperando por uma chance com você há anos, Laura. Mesmo que não seja do jeito que eu imaginei."
A confissão dele a pegou de surpresa. Ela sempre soube que ele a admirava, mas nunca percebeu a profundidade disso. A culpa voltou, mais forte. Ela estava arrastando um homem decente para o seu drama.
"Gabriel, eu..."
"Não diga nada," ele a interrompeu. "Apenas me mande as informações. O cartório abre às nove. Esteja pronta. Vou buscar você às oito. E Laura?"
"Sim?"
"Jogue o champanhe do Pedro fora. Eu levo um melhor."
Ele desligou. Laura ficou olhando para o telefone por um momento, um turbilhão de emoções dentro dela. Ela mandou uma foto de seus documentos e seu endereço para ele. Depois, caminhou para fora do closet, passando por Pedro, que ainda estava parado ali, paralisado.
Ela foi até a sala, pegou a garrafa de champanhe que ele trouxera, foi até a cozinha e despejou todo o conteúdo na pia. O som do líquido borbulhando pelo ralo foi estranhamente satisfatório.
Ela voltou para o quarto, pegou uma mala e começou a jogar suas roupas dentro, de forma aleatória. Ela não ia passar mais um segundo naquela casa.
Pedro finalmente pareceu sair do transe.
"Você não pode estar falando sério," ele disse, seguindo-a. "Casar com o Gabriel? Você o odeia! Ele é meu maior concorrente!"
"Eu não o odeio. Eu mal o conheço," Laura corrigiu, sem olhar para ele. "E a partir de amanhã, ele será meu marido. Então talvez seja bom você se acostumar com a ideia."
Ela fechou a mala. Pegou sua bolsa. No caminho para a porta, ela parou e se virou para ele.
"O casamento era amanhã, às dez, na igreja matriz. Não se atrase. Você e a Sofia podem pegar meu lugar. Tenho certeza que ela vai adorar. É uma pena que o vestido não vá servir nela."
Com isso, ela se virou e saiu, fechando a porta atrás de si, deixando Pedro sozinho no meio do que deveria ser o apartamento deles.
Laura entrou no elevador, e só então se permitiu tremer. Ela apertou o botão do térreo e, enquanto descia, fez uma última coisa. Abriu o aplicativo do banco e transferiu metade do saldo da conta conjunta que tinha com Pedro para sua conta pessoal. Era o dinheiro que ela havia investido para mobiliar o apartamento. Ela não ia deixar isso para ele também.
Quando as portas do elevador se abriram no saguão, ela respirou fundo. A mulher que entrou naquele elevador não era a mesma que sairia dele. A noiva ingênua e apaixonada estava morta. Em seu lugar, havia uma mulher com o coração partido, mas com uma determinação de aço. Ela ia sobreviver a isso. E ela ia fazer Pedro e Sofia se arrependerem do dia em que a traíram.
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