O Peão do Sistema: Raelyn e o Seu Destino
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Capítulo 2

Acordei na poltrona desconfortável ao lado da cama do hospital, com o pescoço dorido. O sol da manhã entrava pela janela, iluminando o rosto do Kieran. Ele já estava acordado, a olhar para o telemóvel com um sorriso que eu nunca tinha visto dirigido a mim. Era um sorriso terno, cheio de saudade.

Ele estava a ver fotos da Fiona.

"Raelyn," disse ele sem desviar os olhos do ecrã. "A Fiona vai voltar do Brasil. Vai haver uma festa de boas-vindas para ela na propriedade esta noite. Vais comigo."

Não era um pedido, era uma ordem. O meu estômago revirou-se. Eu sabia o que aquilo significava: mais uma noite de humilhação, desta vez em frente à mulher que ele realmente amava.

"Kieran, eu..."

"Vais," repetiu ele, finalmente olhando para mim, o seu olhar frio como gelo. "E veste-te de forma apropriada. Não me envergonhes."

A festa na Gordon Port Wine Estate era um espetáculo de riqueza e poder. O cheiro a vinho do Porto e a comida cara pairava no ar. Eu sentia-me deslocada no meu vestido simples, um peixe fora de água no meio de tubarões.

Assim que chegámos, um grupo de amigos do Kieran, liderado pelo Afonso, cercou-nos. A Fiona estava com eles, deslumbrante num vestido vermelho, com um sorriso vitorioso nos lábios.

"Kieran, querido!" disse o Afonso, com a voz alta para que todos ouvissem. "Estávamos a falar sobre a tua... nova aquisição. Ela parece muito dedicada. Ouve, as regras da casa dizem que tens de beber um copo de Porto por cada ano que a Fiona esteve fora. São três anos. Mas tu acabaste de sair do hospital. Não podes beber."

Ele olhou para mim com um brilho malicioso nos olhos.

"Mas a tua noiva pode beber por ti, não pode?"

O Kieran encolheu os ombros, um sorriso cruel a formar-se nos seus lábios. Ele não disse nada, o que era uma resposta em si. A humilhação era o prato principal da noite, e eu era o sacrifício.

Um a um, eles encheram três grandes copos com o vinho do Porto mais forte da propriedade. Peguei no primeiro copo, a minha mão a tremer ligeiramente. O líquido escuro desceu a queimar pela minha garganta. Depois o segundo. E o terceiro. O meu estômago começou a protestar, uma dor aguda a espalhar-se pelo meu corpo. Senti o suor frio na minha testa.

Corri para a casa de banho, vomitando tudo numa torrente violenta. Quando voltei, pálida e a tremer, ouvi a Fiona a falar com o Kieran num canto.

"Ela realmente faz tudo o que tu mandas, não é? É como um cãozinho obediente."

"Ela sabe o seu lugar," respondeu o Kieran, a sua voz cheia de arrogância. "É submissa. Gosta de servir."

Senti uma onda de náusea, mas não era do álcool. Era da dor, da verdade nua e crua das suas palavras. Eu era invisível para ele, um objeto a ser usado e descartado.

Nesse momento, a Fiona fez o seu grande anúncio, a sua voz a ecoar pela sala.

"Queridos amigos, tenho uma notícia maravilhosa para partilhar. Eu e o meu querido noivo, o maior magnata do café do Brasil, vamos casar-nos no próximo mês!"

O copo na mão do Kieran estilhaçou-se no chão. O seu rosto ficou pálido, os seus olhos fixos na Fiona com uma mistura de choque e fúria. A sua mandíbula estava tensa, os nós dos dedos brancos.

A festa acabou abruptamente. O Kieran agarrou-me pelo braço, a sua força a magoar-me, e arrastou-me para fora. Ele estava cego de raiva, e eu sabia que a noite estava longe de terminar. Eu apenas o segui, uma sombra silenciosa na sua tempestade de fúria.

            
            

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