Ela Salvou Seu Amado Morto
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Capítulo 2

A revelação a atingiu como um soco no estômago. Rafa. O segurança gentil, de sorriso fácil, que lhe contava histórias sobre querer uma vida simples, era, na verdade, Rafael Costa, o herdeiro de um império multibilionário. A mentira era tão colossal que sua mente se recusava a aceitá-la.

Sua cabeça girava. O segurança que ela conheceu era uma farsa. Aquele relacionamento, que ela pensou ter sido real, talvez fosse apenas um capricho de um menino rico entediado. A dor da traição passada se misturou com o choque do presente. E agora, o pai dele a estava contratando para um ritual macabro sobre o corpo do próprio filho.

"Srta. Silva? Algum problema?", a voz gélida do Sr. Costa a trouxe de volta à realidade.

Bianca piscou, forçando-se a recompor a máscara de profissionalismo. Ela não podia demonstrar nada. Não ali. Não para eles. Qualquer sinal de uma conexão pessoal poderia colocar tudo a perder. Poderia colocá-la em perigo.

"Nenhum problema", ela respondeu, a voz surpreendentemente firme. "Apenas me concentrando no trabalho. É um ambiente carregado."

A Sra. Costa, ainda chorando baixinho, olhou para ela com gratidão.

"Obrigada. Por favor, faça o que for preciso. O quarto é a última porta do corredor."

Bianca pegou sua própria maleta de trabalho, que continha suas ervas, óleos e ferramentas, e o pequeno refrigerador. Cada passo escada acima parecia pesar uma tonelada. A cada degrau, uma lembrança de Rafa vinha à sua mente: o primeiro encontro, a forma como ele segurava sua mão, a promessa de que ficariam juntos. Tudo mentira.

Ao chegar à porta do quarto, ela parou e respirou fundo. Preparou-se para o que veria lá dentro. Mas nada poderia prepará-la para a realidade.

O quarto era enorme, decorado com luxo e tecnologia de ponta. Mas tudo estava manchado pela tragédia. Havia uma mancha escura e seca no tapete persa, onde o corpo dele deve ter sido encontrado. Uma corda estava jogada em um canto, um objeto sinistro em meio à opulência. O ar estava pesado, parado, com um cheiro fraco de sangue e... outra coisa. Algo químico.

Ela viu a cama desarrumada, as roupas jogadas sobre uma cadeira. Parecia a cena de uma luta, não de um suicídio planejado. Seu instinto, afiado por anos lidando com a morte, gritava que algo estava errado.

"Isso vai custar mais", disse Bianca em voz alta, para si mesma, mas sabendo que eles poderiam estar ouvindo. Era uma tática, uma forma de se distanciar emocionalmente e reafirmar seu controle.

Ela se virou, como se esperasse que alguém estivesse atrás dela. A porta ainda estava aberta. O Sr. Costa estava parado no final do corredor, observando-a.

"O quê?", ele perguntou, a voz ecoando pelo corredor silencioso.

"A energia aqui. Está mais perturbada do que o normal. O ritual será mais complexo. E perigoso para mim. O preço da complexidade é de cem mil a mais", ela disse, o rosto impassível. Era uma aposta, mas ela se sentia no direito de fazê-la. Eles a queriam para algo repulsivo. Eles iriam pagar por isso.

O Sr. Costa a encarou por um longo momento, seus olhos como lascas de gelo. Bianca sustentou o olhar, sem piscar. Ela não era uma faxineira implorando por um emprego. Ela era uma especialista vendendo um serviço exclusivo.

"O dinheiro será transferido para sua conta amanhã de manhã", ele finalmente cedeu. "Agora, faça o seu trabalho."

"Quem é você, afinal?", ele perguntou, um toque de curiosidade em sua voz fria. "Uma médium? Uma charlatã?"

"Nenhum dos dois", respondeu Bianca. "Minha família faz isso há gerações. Antigamente, éramos chamadas de 'carpideiras' ou 'rezadeiras'. Acalmávamos os mortos e confortávamos os vivos. Hoje, os problemas são outros. As pessoas não têm mais medo de fantasmas, têm medo de que o trauma de uma morte violenta contamine suas fortunas, suas casas, suas vidas. Eu modernizei a profissão. Eu ofereço paz de espírito. Um placebo caro para os ricos e culpados."

A explicação pareceu satisfazer o magnata, que apenas assentiu e se afastou. Antes que Bianca pudesse fechar a porta, dois seguranças enormes se aproximaram.

"O senhor pediu para verificarmos seus equipamentos", disse um deles, a voz grave.

Bianca suspirou. Era esperado. Ela abriu sua maleta, mostrando as ervas secas, os frascos de óleos, as velas e alguns objetos de metal polido que pareciam antigos. Eles revistaram tudo superficialmente, sem entender o propósito de nada. Também abriram o refrigerador, viram o recipiente de metal selado e o fecharam. Por fim, passaram um detector de metais pelo corpo dela.

Quando terminaram, Bianca os encarou.

"Agora, minhas regras", ela disse firmemente. "Ninguém, absolutamente ninguém, entra neste quarto até eu sair. Nenhuma câmera, nenhum microfone. O ritual exige privacidade total. Qualquer interferência pode ter... consequências imprevisíveis e permanentes. Para a energia da casa e para a alma que estamos tentando guiar. Vocês entendem?"

Ela usou o jargão da sua profissão, as palavras que seus clientes supersticiosos temiam.

Os seguranças se entreolharam e depois assentiram.

"O Sr. Costa deu ordens para que sua privacidade fosse respeitada", disse um deles.

"Ótimo", disse Bianca.

Ela fechou a porta pesada de madeira, girando a tranca. O som do clique ecoou no silêncio do quarto. Finalmente, sozinha.

Sozinha com o fantasma do homem que ela amou.

Ela se encostou na porta, o corpo tremendo. A fachada profissional desmoronou. As lágrimas que ela segurou arderam em seus olhos. Era demais. A mentira, a morte, o pedido bizarro.

De repente, uma corrente de ar frio passou por ela. A temperatura no quarto pareceu cair vários graus. Não era uma brisa da janela, pois todas estavam fechadas. Era um frio que vinha de dentro, um frio que parecia emanar das próprias paredes.

Bianca se encolheu, não de medo, mas de um reconhecimento sombrio. Ela já sentira aquilo antes. Era a sensação de uma presença que não queria ser perturbada.

Ela enxugou as lágrimas, a profissional assumindo o controle novamente. O luto teria que esperar. Primeiro, o trabalho. E o primeiro passo do trabalho era sempre o mesmo: inspecionar o local.

Ela começou a andar pelo quarto, seus olhos treinados buscando por qualquer coisa fora do lugar. E não demorou para encontrar. Atrás de uma cortina pesada, perto do teto, havia uma pequena luz vermelha piscando discretamente.

Uma câmera.

Eles mentiram.

Claro que mentiram.

A raiva substituiu o frio. O Sr. Costa não queria apenas privacidade. Ele queria vigiá-la. Queria ter certeza de que ela faria exatamente o que foi paga para fazer. E talvez, só talvez, ele quisesse uma gravação para usar contra ela mais tarde.

Aquele trabalho estava ficando cada vez mais perigoso.

            
            

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