Ela Salvou Seu Amado Morto
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Capítulo 4

Por um instante, o tempo congelou. Bianca ficou paralisada, os olhos fixos na silhueta que se contorcia na fumaça. Sua mente gritava que era impossível, uma ilusão de ótica causada pela fumaça, pela dor e pelo estresse. Sua avó sempre a avisou para não deixar as emoções interferirem no trabalho, pois a mente pode pregar peças terríveis em lugares de luto.

Mas então a silhueta tomou uma forma mais definida. A forma de um homem se levantando.

O pânico ameaçou sufocá-la. Ela deu um passo para trás, tropeçando em sua própria maleta. O som do metal batendo na madeira quebrou o feitiço. A fumaça se dissipou um pouco, e a silhueta desapareceu.

Não havia nada lá.

Ela estava ofegante, o coração martelando contra as costelas. "Controle-se, Bianca", ela murmurou. "É a sua imaginação."

Mas o medo já estava instalado. Um medo primitivo que ela raramente sentia.

Ela se forçou a continuar. O trabalho. Foco no trabalho. Ela precisava terminar o que veio fazer, pegar o dinheiro e desaparecer daquela casa maluca para sempre.

A parte final do "ritual" era a mais íntima e, neste caso, a mais perturbadora. Era a "preparação final", um eufemismo para limpar o local exato da morte. Neste caso, a mancha de sangue no tapete.

Com as mãos trêmulas, ela pegou um pano de linho branco e uma tigela de água infundida com ervas. Ajoelhou-se ao lado da mancha escura. O cheiro de ferro e do produto químico que ela sentiu antes era mais forte ali.

Ela fechou os olhos, recitando as palavras de purificação que sua avó lhe ensinara. Palavras para acalmar a terra e liberar o espírito.

"Espírito que aqui partiu, encontre seu caminho para a luz. Que esta terra seja limpa. Que a paz seja restaurada."

Enquanto falava, sentiu novamente a queda de temperatura, mais intensa desta vez. Era como se um freezer tivesse sido aberto ao seu lado. Ela abriu os olhos.

A mancha no tapete. Parecia... fresca. Úmida.

Impossível. A polícia havia liberado a cena horas atrás. O sangue deveria estar seco, quase preto. Mas sob a luz fraca do abajur, a mancha tinha um brilho avermelhado, quase vivo.

Com o coração na garganta, ela estendeu a mão e tocou a borda da mancha com a ponta do dedo.

Estava morna.

E pegajosa.

Bianca puxou a mão para trás como se tivesse tocado em fogo. O pânico voltou com força total. Aquilo não era sangue antigo. Aquilo era recente.

Sua mente correu, tentando encontrar uma explicação lógica. Talvez os produtos químicos da polícia tenham reagido com o tecido. Talvez fosse um truque de luz.

Mas seu instinto, a mesma intuição que a mantinha segura em sua estranha profissão, dizia outra coisa.

Dizia que ela não estava sozinha.

Um barulho. Um rangido suave, vindo da cama.

Ela se virou lentamente, o pescoço rígido de tensão.

O edredom sobre a cama. Ele se moveu. Apenas um centímetro, mas se moveu.

Bianca prendeu a respiração. Seus olhos varreram o quarto, procurando uma janela aberta, uma corrente de ar. Nada. O ar estava parado, pesado.

Ela se levantou devagar, recuando em direção à porta. Seu plano era simples: sair correndo, esquecer o dinheiro, esquecer tudo.

Mas a foto na sua mão a deteve. "Minha Bianca. Minha única verdade."

Se havia uma chance, por menor que fosse, de que algo estivesse terrivelmente errado ali, ela devia a ele, ao Rafa que ela conheceu, descobrir o que era. A profissional em busca de dinheiro estava em guerra com a mulher que ainda o amava.

Com uma coragem que ela não sabia que possuía, ela deu um passo em direção à cama.

"Rafa?", ela sussurrou, a voz um fio.

Silêncio.

Ela deu mais um passo. Seus olhos estavam fixos na colcha.

Foi quando ela viu as marcas no pescoço dele.

No corpo que não deveria estar ali.

Ela deu um grito abafado, levando a mão à boca. Ele estava deitado na cama, sob o edredom, pálido como a morte. Mas ele estava ali. O corpo dele estava na cama.

E ao redor de seu pescoço, não havia a marca profunda e uniforme de um enforcamento. Havia marcas de dedos. Equimoses roxas e feias. Alguém o estrangulou. E as marcas de unhas sob a cama... ele lutou.

Isso não foi suicídio. Foi assassinato.

O choque da descoberta foi tão grande que ela quase não ouviu o som do intercomunicador na parede.

"Bianca? Está tudo bem aí dentro? Já terminou?"

A voz era do Sr. Costa. Fria, impaciente. E ele a chamou pelo nome. Não "Srta. Silva". Bianca. Como ele sabia seu primeiro nome? A não ser que... a não ser que o fato de ela conhecer Rafael fizesse parte do plano dele desde o início.

Ela era a testemunha perfeita. A ex-namorada com um histórico de trabalho bizarro. Se algo mais "acontecesse" naquela noite, quem acreditaria nela?

O pavor a envolveu. Ela era uma peça em um jogo que não entendia. Uma peça descartável.

Ela olhou novamente para o corpo na cama. Para o rosto pálido de Rafael. E enquanto o medo a paralisava, ela viu algo.

Algo que desafiava toda a lógica.

O peito dele.

Subiu. E desceu.

Uma única, quase imperceptível, respiração.

                         

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