O advogado que a Clara encontrou, o Dr. Silva, era um homem calmo e metódico.
Ouvia-me atentamente no seu escritório poeirento, sem me interromper.
"Legalmente," disse ele finalmente, "a situação é complexa. Ambos os pais têm de consentir num procedimento médico para um menor. Se tu não consentes, eles não podem forçar-te."
"Mas o Pedro ameaçou chamar a polícia."
"Ameaças vazias. Não raptaste o teu próprio filho. Apenas te mudaste. No entanto, ele pode iniciar um processo de custódia de emergência, alegando que estás a pôr em perigo a saúde da Sofia ao reter o dador."
"Mas eu não estou! Eu estou a proteger o Tiago!"
"Eu sei," disse o Dr. Silva, com uma voz gentil. "E é isso que vamos argumentar. Que o procedimento representa um risco inaceitável para o bebé, e que existem alternativas. Vamos precisar de uma segunda opinião médica."
Ele recomendou uma pediatra especialista, a Dra. Neves.
Clara foi comigo à consulta. Levei o Tiago.
A Dra. Neves examinou o Tiago cuidadosamente. Ela era calorosa e profissional.
Depois, sentou-se à nossa frente.
"A doação de medula óssea de um bebé é um procedimento sério," disse ela. "Embora muitas vezes seja seguro, existem riscos. Anestesia, infeção, dor. Ele é muito pequeno. O seu sistema imunitário ainda está a desenvolver-se."
"O hospital onde a Sofia está disse que era controlável," disse eu.
"Controlável não significa inexistente," respondeu a Dra. Neves. "Na minha opinião profissional, submeter um recém-nascido saudável a este procedimento, quando outras opções de dadores, embora mais difíceis de encontrar, podem existir, levanta sérias questões éticas."
Ela concordou em escrever um relatório a detalhar os seus receios.
Senti uma onda de alívio. Eu não estava louca. A minha preocupação era válida.
Quando saímos do consultório, senti-me mais forte. Tinha uma opinião médica a apoiar-me.
Mas a minha paz durou pouco.
Quando chegámos a casa de Clara, havia um carro da polícia estacionado à porta.
O meu coração parou.
Pedro e Elvira estavam no passeio, a falar com dois agentes.
Pedro viu-me e o seu rosto contorceu-se de raiva.
"Ali está ela! Agente, ela raptou o meu filho!"
Elvira apontou um dedo trémulo na minha direção. "Aquela mulher está a tentar matar a minha neta! Ela é um monstro!"