Forcei um sorriso, mas meus olhos buscaram os de minha mãe. Ela fez um leve, quase imperceptível, aceno de cabeça na direção de Clara. A mensagem era clara, como sempre foi: não brilhe demais. Não a ofusque.
Minha vida inteira foi uma longa performance de mediocridade forçada. Tudo em nome da "justiça" da minha mãe.
Helena era uma estilista de renome, uma mulher que construiu um império com base na estética e na perfeição. Mas em casa, sua obsessão era outra: a igualdade absoluta entre suas filhas gêmeas. Uma igualdade que se tornou minha prisão.
Desde pequenas, tudo era idêntico. As mesmas roupas, os mesmos brinquedos, os mesmos cortes de cabelo. Se eu ganhava um doce, Clara tinha que ganhar um igual, mesmo que não gostasse. Se ela caía e ralava o joelho, eu tinha que colocar um curativo no meu joelho, mesmo que estivesse intacto.
"Justiça", ela chamava. "Ninguém pode se sentir deixado para trás."
Essa "justiça" era a desculpa para a sua tirania.
Lembro de uma vez, quando tínhamos uns dez anos. A escola organizou um concurso de desenho. Eu sempre amei desenhar, era a única coisa que me fazia sentir eu mesma. Passei semanas trabalhando em um vestido de fada, com detalhes minuciosos e cores que sonhei.
Clara, por outro lado, desenhou um sol e uma casa com pressa, mais interessada em ir brincar.
Quando os resultados saíram, meu desenho ganhou o primeiro lugar. Eu estava radiante. Corri para casa com o pequeno troféu de plástico, meu coração batendo forte de orgulho.
"Mãe, olha! Eu ganhei!"
Helena olhou para o troféu na minha mão, depois para o rosto desapontado de Clara ao meu lado. Sua expressão se tornou fria.
Ela não disse uma palavra. Apenas pegou o troféu da minha mão, foi até a lareira e, sem hesitar, o jogou no fogo.
O plástico estalou e derreteu, as chamas engolindo meu prêmio, minha alegria.
"Isso não é justo com a sua irmã", ela disse, sua voz calma e cortante. "Em casa, vocês são iguais. Nenhuma é melhor que a outra."
Eu fiquei paralisada, olhando para o fogo, as lágrimas escorrendo silenciosamente pelo meu rosto. Clara não parecia feliz com o que aconteceu, apenas confusa. Naquela noite, entendi que meu talento não era um dom, era um crime. Um crime contra a frágil harmonia da nossa família.
A partir daquele dia, comecei a me sabotar.
Nos trabalhos de arte da escola, eu desenhava com a mão esquerda para que meus traços ficassem trêmulos e inseguros, mais parecidos com os de Clara. Nas provas, eu deliberadamente errava questões que sabia a resposta, apenas para que nossas notas fossem próximas.
A ansiedade se instalou em mim como uma sombra permanente. Eu desenvolvi tiques nervosos, a necessidade constante de verificar se tudo estava "equilibrado". Minha autoestima foi pulverizada. Eu não sabia mais quem eu era sem o reflexo de Clara.
Quando fiz quinze anos, a ansiedade se tornou insuportável. Eu tinha ataques de pânico, meu coração disparava sem motivo, eu não conseguia respirar. Meu pai, Ricardo, que já era divorciado da minha mãe há anos, percebeu em uma de suas raras visitas permitidas.
Ele me levou a um psicólogo às escondidas. O diagnóstico veio rápido: transtorno de ansiedade generalizada e depressão.
Quando meu pai confrontou Helena com os laudos médicos, ela apenas deu de ombros.
"Bobagem. É só drama de adolescente", ela disse, folheando uma revista de moda. "Clara não tem nada disso, e elas são criadas exatamente da mesma forma. Se Sofia está assim, a culpa é dela por ser fraca."
Para Helena, minha doença mental era mais uma prova da minha "injustiça". Eu estava, de alguma forma, roubando a paz de espírito que Clara, por direito de igualdade, também deveria ter. Minha dor era um desequilíbrio na sua equação perfeita.
A obsessão dela se estendia a tudo. Uma noite, eu estava estudando para uma prova importante de química. Eu tinha mais facilidade, então terminei mais cedo e ajudei Clara com a matéria dela.
Minha mãe chegou em casa tarde, com duas caixas de pizza, nossa favorita. Ela viu que eu já estava relaxando, enquanto Clara ainda suava sobre os livros.
"Por que você não está estudando?", ela perguntou, a voz carregada de desaprovação.
"Eu já terminei, mãe. E ajudei a Clara."
"Isso não é justo. Vocês deveriam estudar juntas, pelo mesmo tempo."
Ela pegou a caixa de pizza que seria minha e a colocou na frente de Clara.
"Você só vai comer quando sua irmã terminar. E vai comer a sua pizza fria. É o preço da sua pressa."
Eu me sentei na mesa da cozinha, em silêncio, enquanto o cheiro da pizza quente enchia o ar. Observei Clara comer devagar, quase se deliciando com a situação. E eu esperei. Por mais de uma hora.
Quando finalmente pude comer, a pizza estava fria, a massa borrachuda, o queijo duro. Cada mordida era um lembrete da minha punição. Eu não estava sendo punida por ser preguiçosa ou desobediente. Estava sendo punida por ser competente. Por ser eu.
Aquele troféu de formatura na minha mão parecia pesar uma tonelada. Ele não era uma conquista, era uma sentença. Eu sabia o que viria a seguir. E pela primeira vez na vida, eu não estava disposta a aceitar a punição.