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O portão de Nihlys ergueu-se diante de Morpheus como um gigante de mármore negro, parecendo consumir o horizonte com sua imponência. Decorado pelos brasões das linhagens mágicas mais ilustres, o portão não apenas delimitava território - ele separava mundos. Cada curva esculpida em suas colunas era um lembrete de que aquele lugar era reservado aos escolhidos, à elite que moldaria o futuro do Império.
Para Morpheus, que agora vestia a máscara de Dain Vors, um suposto nobre da Corte Leste, aquele portão era muito mais que uma barreira física. Era um desafio ao disfarce que ele carregava e, ao mesmo tempo, um aviso silencioso de que qualquer erro poderia lhe custar a vida.
Quando finalmente chegou ao portão, um mestre corpulento aguardava ali. Ele tinha sobrancelhas espessas e um olhar severo que parecia dissecá-lo antes mesmo de pedir seus documentos. Com a mão estendida, exigiu o pergaminho, e Morpheus, respirando fundo, entregou o documento forjado com dedos firmes. Ele manteve a expressão confiante, sua fachada cuidadosamente treinada, enquanto o suor escorria lentamente por sua nuca.
O mestre segurou o pergaminho, girando-o sob a luz das tochas encantadas. A cera do selo Vors brilhou em tons dourados, refletindo o poder do disfarce cuidadosamente construído. Após alguns segundos de análise, o homem estreitou os olhos e soltou uma observação que fez Morpheus sentir o coração acelerar:
- Curioso... - murmurou o mestre, fitando-o com o olhar desconfiado. - Pensei que todos os Vors estivessem mortos.
Morpheus manteve a compostura. Ele precisava responder sem vacilar, como alguém acostumado às suspeitas.
- O mundo é maior do que parece - disse, com um leve tom de arrogância, como seria esperado de um nobre. - Nem todos os rumores são verdadeiros.
O homem continuou encarando-o, como se estivesse buscando algo além das palavras. Por fim, devolveu o pergaminho com um olhar avaliador.
- Os Vors sempre produziram magos medíocres, mas leais - comentou ele, quase como uma provocação. - Não desonre sua linhagem, garoto.
O peso da tensão se dissipou por um instante, e Morpheus ajustou sua postura, absorvendo o significado das palavras. Ele sabia que havia superado o primeiro obstáculo, mas também que a jornada estava apenas começando. Quando deu um passo adiante, os portões de Nihlys se abriram lentamente, revelando um mundo completamente novo.
A luz das torres mágicas iluminou o interior com um brilho fantasmagórico, revelando um cenário impressionante de estruturas geométricas e corredores amplos, onde runas pulsavam em harmonia com os ecos da magia que preenchia o ar. Nihlys não era apenas uma escola - era um símbolo de controle, poder e hierarquia.
1. O Primeiro Ano: Submissão e Hierarquias
Nihlys era mais do que uma escola; era um microcosmo de poder e controle, onde cada detalhe do cotidiano reforçava a desigualdade e lembrava aos alunos que magia não era apenas uma habilidade, mas uma marca de superioridade.
Os novatos, chamados de "Corvos", eram alojados na ala mais fria e sombria do campus, um reflexo simbólico de sua posição inferior. Mesmo carregando sobrenomes nobres e sendo herdeiros de linhagens poderosas, todos enfrentavam o mesmo rigor inicial:
Dormiam em camas simples, acompanhadas por baús onde guardavam os uniformes - vermelho para iniciantes, azul para intermediários e negro para graduandos.
Suas refeições, servidas em prataria encantada com runas anti-veneno, eram um paradoxo: luxuosas na aparência, mas sempre temperadas com uma atmosfera de vigilância e desconfiança.
Punições eram constantes e variavam de tarefas físicas humilhantes, como limpar os estábulos infestados de criaturas mágicas, até práticas exaustivas, como copiar manuscritos intermináveis.
Morpheus, agora disfarçado como Dain Vors, dividia seu quarto com três colegas que representavam diferentes facetas do elitismo de Nihlys:
Pell, magricela e desajeitado, parecia carregar uma tragédia em seu nome nobre. Era alvo constante de risadas, mas havia uma inteligência quase silenciosa em seus olhos.
Theron, arrogante e cheio de si, exalava o peso de sua linhagem prestigiosa e tratava os colegas como inferiores.
Ryk, reservado e analítico, mantinha um mistério inquietante. Suas runas eram tão precisas quanto sua postura era intimidante.
Logo nos primeiros dias, enquanto os outros novatos organizavam seus baús com uniformes e instrumentos mágicos, Morpheus cuidadosamente guardou sua espada curta, envolta em um tecido. Para ele, a lâmina não era apenas um objeto, mas uma conexão com Athor, seu pai, e um símbolo de tudo o que havia perdido.
A decisão, no entanto, não passou despercebida. Certo dia, enquanto ele fechava o baú com cuidado, Ryk soltou uma risada seca do outro lado do quarto.
- Uma espada, Vors? - disse, com sarcasmo evidente, enquanto ajustava um pergaminho de runas que escrevia à mão. - Não sabia que magos precisavam de armas. Ou confundiu Nihlys com algum campo de treinamento militar?
Theron, que estava ao lado polindo um anel mágico, riu baixinho.
- Deve ser algum apego emocional. Não é como se fosse útil por aqui.
Morpheus manteve a calma e fechou o baú antes de olhar diretamente para Ryk.
- Talvez. Mas eu prefiro ter uma opção a mais do que confiar apenas em poder que pode me abandonar.
Ryk ergueu uma sobrancelha, surpreso pela resposta. Ele olhou para Morpheus com curiosidade antes de dar de ombros e voltar ao pergaminho.
Theron, por sua vez, balançou a cabeça com desdém.
As aulas do primeiro ano não eram menos rigorosas. Cada disciplina parecia projetada para exaurir os limites dos alunos:
Magia Elemental Básica exigia que acendessem velas ou criassem pequenas correntes de ar. Erros eram punidos severamente, mas Morpheus completava as tarefas com precisão silenciosa.
História do Império era uma ode às conquistas de Hurok, omitindo deliberadamente as atrocidades. Para Morpheus, ouvir sobre "os traidores naturais" - referência aos metamorfos - era um lembrete constante de seu disfarce e do perigo que ele corria.
Runas Aplicadas desafiava a destreza dos alunos. Cada erro nas complexas inscrições resultava em punições mágicas automáticas. Pell tropeçava nas aulas, enquanto Ryk demonstrava habilidade impressionante. Morpheus observava e aprendia, absorvendo cada detalhe.
A relação entre Ryk e Morpheus rapidamente se transformou em uma competição silenciosa.
Ryk parecia desafiar Morpheus em cada aula, buscando expor falhas ou provocar reações.
Morpheus, por outro lado, respondia com precisão e calma, evitando entrar nos jogos de ego que Ryk criava.
Certa noite, enquanto organizavam seus pertences, Ryk parou para comentar casualmente:
- Deve ser difícil ser tão... meticuloso, Vors. A precisão não é nada sem poder.
Morpheus respondeu sem hesitar:
- E o poder não é nada sem controle.
O silêncio que se seguiu foi tenso, mas carregado de reconhecimento mútuo. Ambos sabiam que competiam em níveis diferentes, mas entendiam que cada um tinha suas próprias forças.
Ao final do primeiro ano, Morpheus havia aprendido mais do que as aulas ensinavam. Ele entendeu que, para sobreviver, precisava não apenas ser competente, mas estratégico.
Ele cultivava uma relação discreta com Pell, oferecendo ajuda e ganhando sua confiança. Theron permanecia como um adversário distante, enquanto Ryk era uma constante - um rival cuja força e inteligência desafiavam Morpheus a ser melhor.
Morpheus sabia que aquele era apenas o começo. Nihlys era um jogo de sobrevivência, e ele precisaria de cada pedaço de seu intelecto e habilidade para triunfar.
2. Desenvolvendo Habilidades: A Estratégia da Sobrevivência
O primeiro ano em Nihlys foi marcado por transformações profundas em Morpheus, tanto em corpo quanto em mente. Mais do que uma simples escola, Nihlys era um labirinto de poder, desconfiança e aprendizado constante. Cada lição aprendida nas salas de aula era apenas uma fração do verdadeiro treinamento, que acontecia nas sombras, nos sussurros trocados e no silêncio introspectivo das noites insones.
Nihlys, vista de fora, era uma fortaleza monumental. Seus portões imponentes davam acesso a apenas uma fração de suas verdadeiras dimensões, que se estendiam para baixo em túneis cavados na pedra e para os céus com torres que desapareciam entre as nuvens. Cada bloco de mármore negro que compunha suas paredes parecia exalar magia ancestral, e as runas gravadas brilhavam em tons opacos como se estivessem observando os alunos.
Apesar de sua vastidão, o acesso dos estudantes era severamente limitado. Os "Corvos", como eram chamados os alunos do primeiro ano, tinham permissão de se mover apenas por um pequeno setor designado para iniciantes. Este setor incluía os dormitórios, as salas de aula básicas, um refeitório simplificado e corredores que os levavam a um pátio murado, onde a magia mais básica era praticada.
Corredores proibidos eram guardados por barreiras encantadas e patrulhados por criaturas mágicas, de tal forma que até os mais ousados pensavam duas vezes antes de tentar explorar além dos limites estabelecidos. Para os Corvos, Nihlys era um mundo vasto, mas restrito, um lembrete constante de sua posição inferior na hierarquia.
Enquanto os outros alunos lutavam para aprender a magia formal, Morpheus tinha que equilibrar um desafio único: usar seus dons metamórficos de forma discreta e segura, garantindo que sua verdadeira identidade permanecesse oculta.
Ele começou a treinar silenciosamente, utilizando os momentos solitários nas madrugadas para aperfeiçoar detalhes cruciais de suas transformações:
Fortalecia os músculos das mãos, suportando pequenas doses de dor para aprimorar a resistência física, necessária para suportar provas sem demonstrar fraqueza.
Ajustava suas pupilas, aprendendo a enxergar melhor na penumbra, permitindo que ele navegasse pelos corredores desprotegidos durante as noites, quando a supervisão era mais fraca.
Cada pequena melhoria era um passo em direção à sobrevivência, mas o peso de manter a forma de Dain Vors começou a se manifestar lentamente. Na solidão do dormitório, Morpheus às vezes sentia a identidade de Dain fundir-se à sua própria, um risco que ele sabia não poder ignorar.
Morpheus entendia que, em Nihlys, conhecimento era tão vital quanto a própria magia. Ele observava atentamente os mestres e os alunos, criando mapas mentais para garantir que estivesse sempre um passo à frente.
Identificou quais mestres eram mais rígidos, incapazes de tolerar falhas, e quais eram mais manipuláveis, com pontos cegos que poderiam ser explorados.
Ficava atento às alianças que surgiam entre os alunos mais antigos, reconhecendo quem comandava o respeito e quem era apenas uma sombra dos mais influentes.
Morpheus sabia que sua posição como "Dain Vors" dependia tanto de evitar chamar atenção indesejada quanto de se inserir estrategicamente nas hierarquias invisíveis de Nihlys.
Enquanto os meses passavam, Nihlys moldava Morpheus em algo novo. Ele não era mais apenas um sobrevivente: estava se transformando em um estrategista, alguém que sabia como usar cada ferramenta ao seu alcance, seja ela um aliado, uma habilidade ou um segredo.
A relação entre ele e Ryk tornou-se uma dança tensa. Ryk parecia constantemente testar os limites de Morpheus, enquanto Morpheus, por sua vez, fazia o possível para nunca ceder terreno. Apesar da tensão, havia momentos em que eles quase se respeitavam - um reconhecimento mútuo de que ambos jogavam um jogo mais complexo do que os outros alunos poderiam imaginar.
Ao final do ano, enquanto os outros Corvos comemoravam pequenos triunfos, Morpheus olhava para o reflexo de seu próprio rosto na água de uma fonte isolada. Ele sabia que Nihlys havia mudado quem ele era, mas não podia permitir que mudasse quem ele seria.
3. Rumo à Graduação: Um Nobre Entre Lobos
Aos quinze anos, Morpheus já não era mais o iniciante hesitante. Seu disfarce como Dain Vors estava consolidado. Ele tinha:
Dominado as cinco formas elementais básicas - fogo, água, ar e terra e raio - com precisão rara para um aluno de seu nível.
Decifrado runas proibidas, graças à ajuda clandestina de Ryk, que se tornara um aliado improvável.
Desenvolvido uma personalidade independente para Dain Vors, que já não dependia tanto de imitações, mas exalava a arrogância e o carisma esperados de um nobre.
No segundo ano em Nihlys, os alunos ganharam um privilégio muito aguardado: o acesso à biblioteca da escola. Mas, como tudo em Nihlys, o privilégio vinha acompanhado de limitações. Embora a biblioteca fosse um espaço vasto, com paredes que tocavam o teto abobadado e corredores intermináveis de conhecimento, apenas algumas sessões eram liberadas para os alunos do segundo ano. O acesso à biblioteca para os "Corvos" era restrito às áreas que cobriam magia básica e intermediária, história e teorias arcanas.
Para Morpheus, a biblioteca representava mais do que uma oportunidade de estudo: era um portal para descobrir as verdades ocultas que seus pais haviam mencionado sobre o mundo e as raças que o habitavam. Ele passou horas mergulhado em livros antigos, absorvendo fragmentos de informação que traziam consigo um misto de fascínio e inquietação.
4. Magia nas Raças
Foi em um livro, escondido no canto de uma prateleira pouco movimentada, que Morpheus descobriu algo que mudaria sua visão sobre as raças e suas conexões com a magia. O texto era simples, quase didático, mas carregava informações detalhadas sobre como cada raça expressava sua relação com a magia:
Anões: Eram incapazes de conjurar ou manipular magia diretamente, mas possuíam uma habilidade única de atribuir efeitos mágicos ao metal. As armas e armaduras forjadas pelos anões eram lendárias, imbuidas com propriedades que ultrapassavam os limites da magia humana.
Orks: Embora não conseguissem usar magia como os magos humanos, sua força física descomunal era um reflexo de sua conexão mágica. Sua magia era passiva, manifestando-se como energia que amplificava suas capacidades corporais.
Metamorfos: O texto afirmava que, como os anões e orks, os metamorfos não podiam controlar a magia em sua forma mais pura. Sua habilidade de transformar-se em outras formas era descrita como uma expressão passiva de magia natural.
Morpheus ficou profundamente confuso ao ler sobre os metamorfos. Ele sempre soubera que sua habilidade de mudar de forma era especial, mas por que o texto ignorava completamente o fato de que ele podia conjurar magia? Seus mencionaram que era uma habilidade muito rara entre os metamorfo. Seria esse um traço tão raro, desconhecido até mesmo entre os próprios metamorfos que apenas alguns poucos sabiam? Ou o autor do livro simplesmente omitira essa informação de propósito?
Continuando sua leitura, Morpheus encontrou detalhes sobre as raças humanas e élficas:
Humanos: Os humanos eram descritos como uma raça versátil, capaz de dominar as magias elementais como base para seus poderes. Embora tivessem limitações comparadas às outras raças, alguns indivíduos podiam alcançar feitos impressionantes, como manipular magia pura - embora com grande esforço. Era mencionado que os humanos também podiam criar metais mágicos, embora inferiores aos dos anões em qualidade.
Elfos: Considerados os mestres da magia pura. Eles eram a única raça com uma habilidade natural para canalizar magia de forma pura, sem a necessidade de núcleos ou intermediários. Os elfos eram descritos como os mais avançados em sua conexão mágica, algo que Morpheus via como tanto uma bênção quanto um peso.
Enquanto retornava ao dormitório naquela noite, os pensamentos de Morpheus se tornaram uma tempestade. Ele sabia que a descoberta sobre os metamorfos era mais do que apenas uma curiosidade. Se aquilo era raro e desconhecido, então por que ele possuía essas habilidades? Será que havia algo mais em sua herança, algo que nem mesmo seus pais compreendiam totalmente?
Ryk notou seu comportamento distraído e soltou um comentário casual:
- Você está muito quieto, Vors. Algo no laboratório de runas deu errado?
Morpheus olhou para ele, mas preferiu não responder diretamente. Ryk era perspicaz, e o silêncio apenas parecia confirmar que havia algo fora do comum.
Mesmo em meio às conversas ocasionais e à rivalidade com Ryk, Morpheus carregava consigo a sensação de que havia muito mais para descobrir. Nihlys era uma escola poderosa, mas as informações que omitia talvez fossem ainda mais importantes do que as que ensinava.