Capítulo 5 O quadro e o porteiro

Ponto de vista de Diana

Diana estava no antigo ateliê do irmão, no porão da casa. Havia poeira nos pincéis e telas esquecidas empilhadas contra a parede. Ela não vinha ali desde 2006. O cheiro de tinta seca e mofo parecia o mesmo.

No canto, coberta por um lençol, encontrou a última pintura inacabada de Gustavo.

Ela a puxou com cuidado. O quadro mostrava uma cena urbana - um homem de costas, de terno, diante de um portão de ferro. Na parte inferior, quase escondido sob a tinta, estavam rabiscadas três letras: J.L.S.

Gustavo nunca assinava com iniciais. Aquilo era uma pista. Tinha certeza.

Decidiu ligar para o único homem que talvez ainda soubesse algo: Seu Alfredo, o antigo porteiro do prédio da família, que morava agora em uma pensão no Ipiranga.

Ela foi até lá naquela tarde.

O velho a reconheceu de imediato.

- Dona Diana... cresceu, hein. Mas o olhar continua igual. Igual do seu irmão.

Ela mostrou a pintura.

- O senhor lembra de alguém com essas iniciais? "J.L.S."?

Seu Alfredo pigarreou, incomodado.

- Não devia mexer nisso, menina. Tem coisa que dá doença quando a gente cutuca.

- Foi meu irmão. Eu nunca aceitei o que disseram. Nem o que não disseram.

Ele hesitou. Depois olhou para os lados e disse, quase sussurrando:

- J.L.S. era o segurança do seu pai. Nome completo: João Luiz Silva. Sumiu da noite pro dia... uma semana depois do seu irmão.

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Ponto de vista de Marcos

Enquanto Diana cavava lembranças, Marcos vasculhava arquivos antigos na biblioteca da faculdade. A seção de jornais em microfilme era um baú de poeira e revelações.

Procurou pelo nome "João Luiz Silva". Encontrou apenas uma nota de rodapé, datada de 14 de outubro de 2006:

> "Homem encontrado morto no bairro do Sacomã. Sem documentos. Polícia acredita tratar-se de segurança desaparecido dias antes. Caso arquivado."

Ao lado da nota, um pequeno retrato em preto e branco. Rosto borrado, mas no canto da imagem, quase imperceptível, um reflexo no chão: uma pulseira de couro caída no asfalto.

Igual à que Diana usava. Igual à que ele usava.

E tudo começou a doer.