O Preço de uma Mentira Perfeita
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Capítulo 3

Acordei com o cheiro estéril de antisséptico e o bipe suave de uma máquina. Minha cabeça latejava. Eu estava em um quarto de hospital. Gustavo estava sentado ao lado da minha cama, com a cabeça entre as mãos. Ele olhou para cima quando me mexi, seu rosto marcado pela preocupação.

"Bela", ele disse, a voz embargada de emoção. "Você acordou. Você me deu um susto de morte."

Eu apenas o encarei. A preocupação em seus olhos parecia outra performance.

A porta se abriu e uma enfermeira entrou, seguida por Helena Soares. Ela segurava a mão de João Pedro.

"O que ela está fazendo aqui?", perguntei, minha voz um sussurro rouco.

Gustavo se levantou, colocando-se entre mim e a porta. "Bela, acalme-se. Helena estava preocupada. Ela viu você desmaiar. Foi ela quem chamou a ambulância."

"Tire-a daqui", eu disse, minha voz se elevando. Tentei me sentar, mas uma onda de tontura me atingiu.

Helena caiu de joelhos ao lado da minha cama, seu rosto uma máscara de tristeza manchada de lágrimas. "Isabela, sinto muito. Eu nunca quis isso. Por favor, deixe-me ficar. Só quero ter certeza de que você está bem."

Foi uma performance magistral. A mulher injustiçada, a amante lamentável.

"Saia. Daqui.", repeti, cada palavra um caco de vidro.

De repente, o menino, João Pedro, avançou. Ele bateu com seus pequenos punhos na minha perna, bem onde o soro estava inserido. Uma dor aguda e lancinante subiu pelo meu braço.

"Você é uma mulher má!", ele gritou, o rosto contorcido em uma careta. "Você fez minha mamãe chorar!"

"João Pedro, pare com isso!", Gustavo gritou, puxando o menino para trás. Mas seus movimentos foram lentos, seu aperto não tão firme quanto deveria ser.

"Ele é apenas uma criança, Gustavo", Helena soluçou, puxando João Pedro para seus braços. "Ele não entende. Ele é meu sobrinho. Ele é muito protetor comigo."

Sobrinho. A mentira era tão audaciosa, tão descarada, que me deixou sem fôlego.

Gustavo voltou sua atenção para mim, seu foco no soro deslocado, no sangue que brotava na minha pele. Ele chamou a enfermeira, sua voz afiada com comando. Mas seus olhos continuavam a se desviar para a porta, para onde Helena estava confortando o menino chorando. Sua prioridade era clara. Ele estava protegendo eles.

A enfermeira consertou meu soro, sua expressão profissional, mas tensa. Gustavo agradeceu, depois se virou para mim, seu rosto uma mistura de preocupação e impaciência.

"O médico disse que você desmaiou de exaustão e desidratação. Você precisa descansar."

"Aquele menino", eu disse, minha voz tremendo de raiva. "Ele me atacou."

"Ele tem quatro anos, Bela", disse Gustavo, seu tom apaziguador. "Ele não quis fazer mal. Ele só estava com medo."

Ele não estava me defendendo. Ele estava defendendo o menino. O filho dele. O homem que uma vez largou um negócio de um bilhão de reais porque eu tive febre agora estava me dizendo que uma agressão física não era motivo de preocupação. A percepção foi um golpe físico, um soco no estômago que me deixou sem fôlego. Uma cãibra aguda tomou meu abdômen, e eu me encolhi, um grito silencioso preso na garganta.

Virei as costas para ele, puxando o fino cobertor do hospital até o queixo. Foi uma dispensa clara. Ouvi-o suspirar, um som de frustração, antes de sair do quarto, fechando a porta suavemente atrás de si.

Devo ter caído em um sono exausto, porque a próxima coisa que soube foi a porta do meu quarto se abrindo com um estrondo. Eu estava sendo sacudida para acordar, bruscamente.

Gustavo estava sobre mim, seu rosto contorcido por uma raiva que eu nunca tinha visto antes. Seus olhos estavam injetados, sua mandíbula tensa.

"O que você fez?", ele rosnou, seu aperto em meus ombros se intensificando. "Onde ele está?"

"Do que você está falando?", perguntei, minha mente nebulosa de sono e confusão.

"João Pedro! Ele desapareceu! Helena disse que você foi a última a falar com ele. Ela disse que você a ameaçou!"

Antes que eu pudesse processar sua acusação, seus pais, o Sr. e a Sra. Almeida, invadiram o quarto. Eles foram seguidos por uma Helena frenética e chorosa.

"Sua mulher malvada!", a Sra. Almeida gritou, seu dedo perfeitamente manicure apontando para mim. "Você não pôde dar um herdeiro a Gustavo, então decidiu se livrar do único filho dele! Você o sequestrou!"

João Pedro foi ensinado a apontar para mim. Seu pequeno dedo, guiado por sua mãe, selou meu destino. A polícia chegou. Fui acusada de orquestrar o sequestro do filho ilegítimo do meu marido. O motivo? Ciúmes. Loucura.

Olhei para Gustavo, meus olhos implorando para que ele visse a verdade, para que confiasse em mim. "Gustavo, você sabe que eu nunca faria algo assim."

Seu rosto era uma máscara fria e dura. "Eu não sei mais do que você é capaz, Isabela." Ele se virou para os policiais. "Levem-na."

Eles me colocaram em uma cela. Era fria, imunda e cheirava a desespero. As horas se arrastaram por uma eternidade. Revivi cada promessa que ele já me fez. Eu vou te proteger. As palavras zombavam de mim, ecoando no silêncio sufocante. As lágrimas finalmente secaram, deixando para trás uma dormência oca e dolorida.

Dois dias depois, a porta se abriu. Um guarda me disse que eu estava livre para ir. João Pedro havia sido "encontrado". Aparentemente, ele havia se afastado e sido encontrado por um segurança em um parque próximo. Foi um milagre.

Saí da delegacia para a luz dura do dia. Gustavo estava me esperando. Ele me puxou para um abraço que parecia uma jaula.

"Sinto muito, Bela", ele sussurrou. "Foi tudo um mal-entendido. Eu estava tão preocupado."

Eu não respondi. Deixei que ele me levasse para o carro e me dirigisse de volta ao nosso apartamento. Quando entramos, Helena estava lá, sentada no meu sofá, segurando um João Pedro adormecido.

"O que ela está fazendo aqui?", perguntei, minha voz monótona.

"Helena e João Pedro ficarão conosco por um tempo", anunciou a Sra. Almeida, saindo da cozinha. Sua voz pingava condescendência. "Para a segurança deles. Não podemos permitir que sejam alvos novamente."

"Não vou sair do lado de Gustavo", disse Helena, sua voz baixa, mas firme, uma declaração clara de sua nova posição nesta casa.

Virei-me para sair, para ir para o meu quarto, para escapar deste pesadelo. Ao passar pelo sofá, o pé de João Pedro se esticou, me fazendo tropeçar. Gritei ao cair, meu corpo batendo no chão duro. Uma dor aguda e insuportável rasgou meu abdômen.

Olhei para baixo. O sangue estava se acumulando no chão sob mim, uma mancha escura se espalhando no mármore branco. Os olhos de Helena encontraram os meus, e vi um lampejo de malícia triunfante neles. João Pedro, dos braços de sua mãe, fez uma careta grotesca para mim.

Gustavo correu para o meu lado, seu rosto pálido de choque. Ele me pegou nos braços, gritando para alguém chamar uma ambulância. Minha visão estava embaçando, o quarto girando. A última coisa que vi antes de desmaiar foi o sorriso presunçoso de Helena.

Acordei novamente em um quarto de hospital. Estava quieto. Quieto demais. Eu estava sozinha. Apertei o botão de chamada da enfermeira. Ninguém veio.

Ouvi vozes do lado de fora da minha porta. Gustavo e seu advogado, Jairo.

"Como ela está?", Jairo perguntou.

"Ela está estável", respondeu Gustavo, a voz pesada. "Ela perdeu o bebê. Era cedo, apenas oito semanas. Ela nem sabia que estava grávida."

Uma pausa.

"E... houve complicações. A queda causou uma hemorragia grave. Eles tiveram que... tiveram que fazer uma histerectomia. Ela não pode mais ter filhos."

O mundo se dissolveu em um grito silencioso. Um bebê. Nosso bebê. Perdido. Minha capacidade de ter outro, perdida. Arrancada de mim por uma criança maliciosa e pela mulher que roubou minha vida.

            
            

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