Eu apenas olhei para ele, um sorriso frio brincando em meus lábios. Ele queria cuidar de mim? O homem que me deixou quase morrer de coração partido? O homem que ficou parado enquanto sua nova amante mandava espancar meu cachorro até a morte?
De repente, Karina gritou do corredor, agarrando a barriga. "Davi! Minha barriga dói!"
A atenção de Heitor se voltou para ela instantaneamente. Ele correu para o lado dela, o rosto marcado pela preocupação, e a pegou nos braços.
"Estou te levando para o hospital", disse ele, a voz cheia de pânico. Ele desceu as escadas apressado sem olhar para trás.
A casa ficou em silêncio novamente.
Lentamente, deslizei para o chão, envolvendo os braços em volta dos joelhos. A máscara que eu usava se desfez, e lágrimas silenciosas escorreram pelo meu rosto.
Depois de um momento, eu as enxuguei. Eu não choraria mais por ele.
Levantei-me e comecei a embalar o resto das coisas de Heitor eu mesma. Enchi caixa após caixa, selando cada memória, cada pedaço de nossa vida juntos.
Enquanto trabalhava, ouvi os sons fracos e inconfundíveis dos gemidos falsos de Karina e dos sussurros calmantes de Heitor do quarto deles no final do corredor. Eles já haviam voltado.
Fechei os olhos, bloqueando tudo.
Mais tarde naquela noite, a casa foi lançada no caos. Luzes se acenderam e ouvi passos frenéticos.
Abri minha porta para ver Heitor carregando Karina escada abaixo novamente, seu rosto uma máscara de terror.
Os empregados sussurravam. "O sangramento dela está piorando." "O Sr. Almeida está tão preocupado." "Ouvi dizer que ela pode perder o bebê."
Fechei a porta, bloqueando o barulho e o drama fabricado deles.
Eles voltaram no dia seguinte. Um banquete comemorativo foi servido na mesa de jantar para recebê-los em casa. Cada prato era um dos favoritos de Karina.
"Obrigada, Davi", ela arrulhou, encostando-se nele. Então ela olhou para mim com falsa simpatia. "Sinto muito, o Davi estava tão preocupado comigo que deve ter te negligenciado."
Heitor olhou para mim, seu pedido de desculpas breve e desdenhoso. "Vou mandar fazerem seus pratos favoritos da próxima vez."
Sentei-me e peguei meu garfo, comendo em silêncio. A comida tinha gosto de cinzas na minha boca.
Karina riu, aninhando-se nos braços de Heitor enquanto ele descascava um camarão para ela. Ela deliberadamente lambeu a ponta do dedo dele, seus olhos me desafiando a reagir.
Eu a ignorei, mas um aperto na garganta tornou difícil respirar.
Forcei-me a engolir, depois perguntei ao chef: "Que tipo de óleo foi usado nesses pratos?"
Minha voz estava tensa com um horror crescente. Cuspi a comida no guardanapo.
O chef respondeu: "É tudo feito com óleo de amendoim, senhora. O Sr. Almeida disse que é bom para a Srta. Andrade e para o bebê."
Minha mão apertou a toalha de mesa.
Eu sou extremamente alérgica a amendoim.
Heitor sabia disso. Ele sabia desde o nosso primeiro ano juntos, quando tive uma reação tão forte que ele me levou às pressas para o pronto-socorro no meio da noite. Ele segurou minha mão o tempo todo, o rosto pálido de medo.
Mas ele havia esquecido. Por ela, pelo bebê deles, ele havia esquecido a única coisa que poderia me matar.
Minha visão começou a embaçar. Meu peito ficou apertado e minha respiração veio em arquejos curtos e irregulares.
Heitor finalmente percebeu que algo estava errado. "Helena? O que foi?", ele perguntou, a testa franzida.
Tentei falar, mas nenhum som saiu.
Seu rosto empalideceu quando ele se levantou, movendo-se como se fosse vir até mim.
Mas então Karina soltou um grito agudo, agarrando a barriga novamente. "Davi! Dói!"
Heitor congelou.
Ele olhou para mim, meu rosto ficando azul, depois olhou para Karina, o rosto dela uma máscara de dor.
Ele fez sua escolha.
Ele retirou as mãos de mim.
Ele se virou e levantou Karina em seus braços.
"Aguente firme, querida, estou te levando para o hospital", disse ele, a voz frenética.
Ele não olhou para mim novamente.
Enquanto eu perdia a consciência, a última coisa que vi foi suas costas enquanto ele a carregava para longe, me deixando para morrer.