Depois do que pareceu uma eternidade, a porta do porão finalmente se abriu.
Cambaleei em direção à luz, meu corpo fraco.
Heitor bloqueou meu caminho. "Você aprendeu a lição?", ele perguntou, a voz fria.
Tentei falar, mas minha garganta estava em carne viva. Nenhum som saiu.
"Peça desculpas à Karina", ele ordenou.
Balancei a cabeça, minha voz um sussurro rouco. "Eu não fiz... nada... de errado."
Agarrei o batente da porta para não desabar.
Seus olhos se estreitaram. "Se você não admitir seu erro, pode ficar aqui embaixo." Ele fez um gesto para os guardas fecharem a porta.
A ideia da escuridão sufocante me fez quebrar. O terror me dominou.
"Eu peço desculpas", engasguei, meus olhos vermelhos e selvagens.
Karina estava recostada em sua cama, um sorriso triunfante no rosto enquanto se apoiava em Heitor.
Eu estava diante deles, meu corpo doendo, e repeti mecanicamente as palavras. "Sinto muito."
Meu rosto estava manchado de lágrimas secas. Eu era um desastre.
"Isso não parece muito sincero", Karina fez beicinho.
A voz de Heitor foi como um estalo de chicote. "Ajoelhe-se."
Olhei para ele, chocada.
Um empregado se adiantou e empurrou meus ombros para baixo. Resisti por um segundo e vi um lampejo de algo - arrependimento? hesitação? - nos olhos de Heitor. Desapareceu em um instante, substituído por uma fria indiferença.
Meus joelhos bateram no chão duro. Minha visão escureceu por um momento com a dor. A ferida no meu joelho, de quando ele me forçou a ajoelhar em cacos de vidro, reabriu, encharcando a barra do meu vestido de sangue.
Meu rosto estava pálido.
Karina me observava, aproveitando o espetáculo.
Heitor franziu a testa, depois chamou um guarda-costas. "Dê uma lição nela. Continue até que ela entenda o que fez de errado."
Eu o encarei, minha mente entorpecida de incredulidade. Ele ia mandar me espancar.
O primeiro tapa foi forte e ardido. Minha cabeça virou para o lado. Senti o gosto de sangue.
Os golpes vieram um após o outro. Meu rosto estava em chamas, minha cabeça zumbindo.
"Davi, pare", disse Karina, puxando a manga dele com uma demonstração de falsa preocupação. "Já chega."
Heitor resmungou e dispensou o guarda. "Você tem sorte que a Karina tem um bom coração", disse ele para mim. "Agora, peça desculpas direito."
Eu estava no chão, a dor uma coisa surda e latejante. Tudo o que eu sentia era uma humilhação profunda e esmagadora. Eu só queria que acabasse.
"Sinto muito", sussurrei.
Karina me ignorou, virando-se para arrulhar para Heitor sobre alguma comida que ela queria. Ele lhe deu um pedaço de fruta, sua atenção completamente nela, como se eu não existisse. Como se eu não estivesse sangrando no chão deles.
Sangue pingava da minha testa no tapete caro. Minha visão embaçou.
"Oh, meu Deus", disse Karina com falsa surpresa. "Ela ainda está no chão. As pessoas vão pensar que estou a maltratando."
Um empregado me ajudou a levantar. Enquanto eu era levada para fora, ouvi Karina sussurrar para Heitor: "Ela é uma ótima atriz, não é?"
Cambaleei de volta para o meu quarto e toquei a ferida na minha testa.
Lembrei-me de Heitor me prometendo, anos atrás, que nunca deixaria ninguém me machucar. Que ele sempre me protegeria.
Apenas palavras vazias.
Sentei-me em frente à penteadeira, minha expressão em branco.
No espelho, vi uma estranha. Seu rosto estava machucado e inchado. O corte na testa havia começado a formar uma crosta, uma marca escura e feia.
Uma empregada aplicou antisséptico suavemente.
"É um corte profundo, senhora", ela sussurrou. "Provavelmente vai deixar uma cicatriz."
Eu quase sorri. Uma cicatriz no meu rosto não era nada comparada às cicatrizes na minha alma.
Meu olhar se desviou para o meu celular. A tela mostrava uma contagem regressiva.
Apenas mais alguns dias.
Os dias passaram em um borrão de resistência silenciosa. À noite, eu finalmente dormia. Os pesadelos que me atormentaram por meses haviam desaparecido. Agora que eu havia desistido dele, eu finalmente podia descansar.
Uma noite, uma batida forte me acordou de um sono profundo.