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Na manhã seguinte, Franco estava de volta, interpretando o papel do marido arrependido que foi forçado a trabalhar a noite toda. Ele me trouxe o café da manhã na cama, seu rosto uma máscara de preocupação amorosa. Eu interpretei meu papel, a esposa que perdoa. Éramos dois atores em uma peça grotesca.
A escola ligou. Léo estava aprontando de novo. Como psicóloga da escola, esperava-se que eu resolvesse. Franco insistiu em vir comigo. Ele queria mostrar que era um parceiro "solidário".
No meu consultório, Léo sentou-se emburrado, com Karine ao seu lado, parecendo presunçosa. Franco ficou atrás de mim, a mão apoiada no meu ombro em um gesto possessivo.
"Léo tem sido disruptivo", eu disse, mantendo minha voz profissional. "Ele se recusa a participar das atividades da classe."
"Ele é apenas sensível", disse Karine, sua voz escorrendo falsa preocupação. "Ele tem estado tão preocupado com o pai." Ela olhou para Franco com olhos grandes e cheios de lágrimas.
"E ele diz que você é má com ele", ela acrescentou, virando-se para mim. "Ele diz que você não gosta dele."
A mão de Franco apertou meu ombro. "Elisa é uma profissional, Karine. Ela nunca..."
"Mas ele é apenas uma criança", ela interrompeu, a voz falhando. "Ele sente falta da mãe."
Era uma performance para o benefício de Franco, e estava funcionando. Eu podia sentir a simpatia dele se voltar para ela, para a "mãe solteira em dificuldades".
Mais tarde naquele dia, eu estava voltando de uma reunião. Um carro de polícia sinalizou para eu parar. Eu obedeci, meu coração batendo com um pavor sem nome. O policial se aproximou da minha janela.
"Senhora, preciso que saia do veículo."
No momento em que saí do carro, tudo ficou preto. O mesmo cheiro químico. As mesmas mãos ásperas.
Acordei em um espaço escuro e úmido. Um armazém, pelo cheiro de poeira e mofo. Eu estava amarrada a uma cadeira. Os dois homens do primeiro ataque estavam diante de mim.
"O chefe não está feliz", disse um deles, cuspindo no chão perto dos meus pés. "Você está causando problemas para a nova família dele."
"Ele disse para te dar uma lição que você não vai esquecer", acrescentou o outro, estalando os nós dos dedos.
Então era isso. Essa era a solução de Franco. Não me matar, ainda não. Apenas me machucar. Me quebrar até eu ser um brinquedo dócil e quebrado novamente.
Ele achava que eu não sabia. Ele achava que eu ainda era a mesma tola confiante.
Eles começaram a me bater. Não com os punhos desta vez. Com uma barra de metal. A dor era excruciante, mas um estranho e frio distanciamento se instalou em mim. Isso não era mais sobre mim. Era sobre ele. Sobre sua fraqueza, sua patologia.
"Ele quer que você saiba o seu lugar", um deles grunhiu, acertando um golpe na minha perna que me fez ver estrelas.
Devo ter desmaiado. Quando voltei a mim, eles tinham ido embora. Um deles pareceu ter mudado de ideia. Ele cortou minhas cordas e deixou uma garrafa de água. "Ele é um monstro", o homem sussurrou antes de correr. "Fuja dele."
Ele deixou as chaves do meu carro no chão. Arrastei meu corpo quebrado até o carro e dirigi. Não fui à polícia. O que eu diria? Meu não-marido, o amado bilionário da tecnologia, mandou seus capangas me espancarem porque eu disciplinei nosso filho secreto? Eles achariam que eu estava louca.
Em vez disso, dirigi para o único lugar que eu sabia que ele estaria.
Era um parque público, lindamente ajardinado. No centro havia um coreto, decorado com luzes pisca-pisca. Uma pequena multidão estava reunida. E no centro de tudo estava Franco.
Ele estava de joelhos. Diante dele estava Karine, vestida com um deslumbrante vestido branco. Ela estava chorando, a mão pressionada contra a boca em uma imitação perfeita de surpresa.
Léo estava ao lado dela, segurando uma caixa de anel de veludo.
"Karine Bastos", disse Franco, sua voz ressoando, cheia de uma emoção profunda e apaixonada que eu uma vez acreditei ser reservada para mim. "Você trouxe fogo e vida de volta ao meu mundo. Você me deu um filho. Você me daria a honra de se tornar minha esposa?"
Ela assentiu, soluçando. "Sim! Oh, Franco, sim!"
Ele deslizou um anel de diamante maciço em seu dedo. A multidão explodiu em aplausos. Ele se levantou e a beijou, um beijo longo e cinematográfico.
Eu sentei no meu carro, escondida nas sombras do estacionamento, e observei. Observei o homem que construiu sua vida sobre o meu amor, sobre a minha suposta pureza, pedir em casamento a mulher que representava tudo o que ele afirmava desprezar. Observei-o dar a ela a vida, o anel, a declaração pública que deveria ter sido minha.
E observei meu filho, meu lindo e perdido menino, sorrir enquanto chamava outra mulher de "mamãe".
A dor era uma coisa física, um golpe que me deixou sem ar. Meu sangue gelou. A mulher que amava Franco Medeiros morreu naquele momento. O que restou foi algo totalmente diferente. Algo frio, duro e inquebrável.
Observei-os celebrar, uma família perfeita banhada no brilho quente da adoração pública.
Então, engatei a marcha e fui embora. Eu não chorei. Não havia mais lágrimas.
Peguei meu telefone e disquei para Caio.
"Está na hora", eu disse.