Eu a encontrei na sala de conferências uma tarde, conversando com o engenheiro-chefe sobre o deck de observação em balanço, a assinatura do prédio - minha característica mais inovadora.
"Tenho algumas ideias sobre como melhorar a integridade estrutural", ela estava dizendo, segurando minhas plantas.
Fui até o chefe do projeto, um homem com quem trabalhei por anos. "Marcos, o que ela está fazendo com meus projetos?"
Ele não me encarou. "Ordens do Caio, Clara. Helena está assumindo o deck de observação."
Meu sangue gelou. "Esse é o meu trabalho de assinatura. Ela não tem a experiência para lidar com isso."
Ele apenas deu de ombros, uma imagem de impotência. A Construtora Hanson era nosso maior cliente. A palavra de Caio era lei.
Mais tarde, Helena se aproximou de mim, com um olhar de falsa simpatia no rosto. "Clara, eu sei que isso é difícil para você. Mas Caio acha que é para o melhor. Ele disse que eu tenho uma perspectiva mais fresca."
Ela então apontou para uma cena no material de marketing do projeto, uma representação dramática de um confronto entre desenvolvedores rivais que deveria ser simbólica. "O diretor quer que a gente encene essa cena para o vídeo promocional. Envolve um tapa. Ele quer que pareça real. Espero que você seja profissional sobre isso."
"Um tapa? Isso não está no storyboard original", eu disse, confusa.
Encontrei o diretor do vídeo. "Por que o roteiro foi mudado?"
Ele gaguejou, evitando meu olhar. "Foi uma... decisão de cima. Para adicionar mais drama."
Eu sabia quem estava no topo. Virei-me e vi Caio do outro lado da sala, nos observando. Ele estava sempre lá, uma sombra pairando sobre minha carreira, orquestrando minha queda. Ele estava aqui para garantir que eu cumprisse.
Senti uma onda de resignação. Eu estava presa.
Nos preparamos para a cena. O roteiro pedia que a personagem de Helena desse um tapa na minha.
"Vamos fazer parecer bom", disse Helena com um sorriso doce. "Pela arte."
O diretor gritou "Ação!"
Helena balançou o braço. O tapa foi real, e foi forte. Minha cabeça virou para trás, minha bochecha ardendo.
"Corta!", gritou o diretor. "Helena, seu tempo estava errado. Vamos de novo."
Fomos de novo. E de novo. E de novo.
Cada vez, Helena "errava". Ela perdia a deixa, seu ângulo estava errado, ela tropeçava. Mas cada vez, sua mão se conectava com meu rosto. Os tapas eram cruéis, intencionais.
Minha bochecha estava vermelha e inchada. Lágrimas brotaram em meus olhos pela dor e humilhação. A equipe estava em silêncio, assistindo desconfortavelmente. Até o diretor parecia aflito.
"Vamos fazer uma pausa de cinco minutos", ele finalmente disse, incapaz de assistir mais.
Minha assistente, Lilian, correu com uma bolsa de gelo, seus próprios olhos cheios de lágrimas. "Isso é uma loucura, Clara. Você não pode deixar ela fazer isso."
"Estou bem, Lilian", sussurrei, tentando confortá-la, mas minha voz falhou.
Nesse momento, Caio se aproximou. Ele segurava uma bolsa de gelo. Por um momento, uma parte tola de mim pensou que era para mim.
"Dói?", ele perguntou, sua voz surpreendentemente gentil.
Olhei para ele, minha bochecha inchada latejando. "O que você acha?"
Ele suspirou, sua expressão gentil evaporando. "Helena é nova nisso, Clara. Você precisa ser paciente com ela. Precisamos terminar essa cena. Ela tem uma reserva para o jantar."
A reserva de jantar dela era mais importante que minha dor física. A crueldade pura daquilo era de tirar o fôlego. Eu apenas o encarei, sem palavras.
"Não acredito que um dia te amei", eu disse para mim mesma, um pensamento amargo e silencioso.
Helena se aproximou então, esfregando a própria mão. "Ai, minha mão está começando a doer com tudo isso, Caio."
Caio imediatamente se virou para ela, seu rosto cheio de preocupação. Ele entregou a ela a bolsa de gelo. A minha bolsa de gelo.
"Aqui, use isso", disse ele suavemente. "Você está bem?"
"Acho que sim", ela choramingou. "Clara, você está pronta para ir de novo amanhã? Podemos tentar de novo então."
De um ângulo onde Caio não podia ver, ela me lançou um olhar de pura e triunfante malícia.
Eu já tinha aguentado o suficiente.
"Não", eu disse, minha voz fria e clara. "Não vamos."
"Mas minha mão está doendo muito", ela choramingou, mostrando a Caio sua palma perfeitamente normal.
Antes que eu pudesse pensar, minha própria mão voou para cima. Eu a esbofeteei, com força, no rosto. O som ecoou pela sala silenciosa.
Ela me encarou, atordoada, antes de se virar para Caio com olhos arregalados e cheios de lágrimas. "Caio... ela me bateu."