No Altar com o Inimigo
img img No Altar com o Inimigo img Capítulo 5 Casamento de espinhos
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Capítulo 6 Reconhecimento de Terreno Inimigo img
Capítulo 7 Coleira invisível img
Capítulo 8 Entre Correntes e Espelhos img
Capítulo 9 O Jogo e o Limite img
Capítulo 10 À Beira do Precipício img
Capítulo 11 Fissuras no Espelho img
Capítulo 12 Desejo e Submissão img
Capítulo 13 Cordeiros e Leões img
Capítulo 14 A Herança do Silêncio img
Capítulo 15 O Veneno Doce img
Capítulo 16 Apenas uma Distração img
Capítulo 17 Jogo de Famílias img
Capítulo 18 Entre Promessa e Ameaça img
Capítulo 19 Sob o Olhar da Corte img
Capítulo 20 O Rato e a Coroa img
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Capítulo 5 Casamento de espinhos

Alessio

O carro parou diante da casa que, a partir de agora, seria minha nova prisão. O caminho até ali fora preenchido por um silêncio denso. Giovanni fingia que eu não estava no mesmo carro, e eu lhe devolvia o favor.

Ainda assim, sua presença era impossível de ignorar. Ombros largos, cabelos penteados para trás, apenas uma mecha escura teimando em cair sobre a testa. O terno se moldava a cada músculo do seu corpo como se tivesse sido feito para exibir poder. Mas eram os olhos que mais prendiam minha atenção - a marca inconfundível da linhagem Rinaldi. Olhos que pareciam abrigar dois demônios lutando pelo mesmo espaço.

A casa era ampla demais para dois prisioneiros. Não importava o luxo das paredes, nem os móveis escolhidos a dedo para disfarçar o cativeiro. Eu sabia reconhecer grades invisíveis quando as sentia. Estive dentro delas durante toda minha vida. E Giovanni... Giovanni era mais uma delas.

Ele caminhava pelo espaço como quem tentava dominar o território, tocando objetos, ocupando cada canto com a arrogância de quem acha que já venceu. Quase sorri. Que erro subestimar alguém só porque parece aceitar o jogo.

- Não parece tão animado em conhecer sua jaula - disse ele, a voz escorrendo ironia.

Não desviei o olhar. Inclinei a cabeça, como quem mede a presa.

- Jaula ou não, continuo sendo mais perigoso do que você imagina.

O silêncio que se seguiu foi pesado. Pude ver em seus olhos a surpresa contida - ele queria me reduzir à fragilidade, mas encontrou aço. E isso, percebi, mexia com ele.

Giovanni se aproximou demais, tentando quebrar meu espaço. Me pressionar um passo a mais. Era um teste. Respirei fundo, e foi então que seu perfume me cercou. Cheirava a especiarias quentes e couro gasto. Minha mente gritava para manter distância, mas, ainda assim, inspirei mais fundo.

Mesmo tomado por essa estranha proximidade, mantive fachada de calma. Ele sorriu - um sorriso que prometia banhos de sangue. Quando falou, sua voz soou perigosamente controlada.

- Cuidado com o que deseja, Moretti - disse Giovanni, cada palavra medida, gélida. - Às vezes, feras enjauladas se acostumam com as correntes... e acabam acreditando que ainda são perigosas.

Seu tom era cortante, mas havia algo ali, por trás da máscara, que não era apenas ameaça. Era a necessidade de me testar, de me empurrar contra o limite, talvez para descobrir até onde eu podia ir.

- E às vezes - retruquei, erguendo o queixo, firme - é a mão que segura a corrente que acaba sangrando primeiro.

Nossos olhares se prenderam. Não havia espaço para fuga naquele instante, apenas a corda esticada entre nós, prestes a arrebentar. Giovanni sustentava o sorriso frio, mas seus olhos... seus olhos ardiam de um jeito que não se disfarça com palavras.

Ele se inclinou só o bastante para que seu ombro roçasse o meu. O contato foi mínimo, quase acidental, mas deixou atrás de si o calor de uma faísca acesa.

- Vamos ver quanto tempo você aguenta antes de quebrar - murmurou, a voz baixa, quase íntima. - Porque, no fundo, você já sabe... você pertence a mim.

Senti todos os músculos do meu corpo se enrijecerem com aquelas palavras, como se cada uma fosse uma corrente invisível se fechando ao redor de mim. Não raiva. Não apenas. Algo que eu não queria nomear.

Giovanni não queria apenas minha rendição; queria despir minhas defesas, tocar o que eu escondia até de mim mesmo.

- Cuidado - murmurei, cada palavra um fio de resistência - nem todo silêncio é rendição.

Ele fixou os olhos nos meus, e eu senti a intensidade de algo que ia além da provocação. Curiosidade. Interesse. Cada segundo naquela proximidade parecia sugado por uma força própria, como se o espaço ao nosso redor tivesse se estreitado, deixando apenas nós dois.

O sorriso de Giovanni era venenoso, cruelmente sedutor, como se tivesse arrancado de mim algo que nem eu sabia que existia.

- No fim, não é questão de força... é questão de quando você vai se render - disse, e o tom da voz dele fez o ar entre nós vibrar, carregado de uma tensão quase impossível de ignorar.

Mantive o queixo erguido; não cederia. Não havia mais nada ali a ser quebrado. Por um instante, esqueci a missão que meu pai me dera, e a vontade de desafiar Giovanni falou mais alto, incendiando algo que eu nem sabia que existia em mim.

Virei-me na sala, tentando apagar o calor que a presença dele provocava, ignorando cada provocação que pairava no ar.

- Preciso descansar. Onde fica meu quarto?

Giovanni não se moveu. Seus olhos me prendiam com uma calma inquietante, e o sorriso sutil nos lábios parecia brincar com cada palavra e gesto meus, como se já soubesse o efeito que causava.

- Nosso quarto, você quer dizer - disse, a voz baixa, medida, carregada de provocação.

O impacto das palavras me atingiu como um choque elétrico. Meu corpo paralisou; cada fibra implorava para fugir, mas minha mente teimava em permanecer ali, diante dele. Ele não podia estar falando sério

Respirei fundo, tentando recuperar o controle, mas o ar parecia mais denso, como se cada movimento dele aumentasse a pressão ao meu redor.

- Você está brincando - disse, a voz mais firme do que me sentia. - Não pode estar falando sério.

Giovanni deu um passo lento em minha direção, cada gesto calculado, como se desafiasse minha resistência.

- Eu estou falando sério - respondeu, o sorriso malicioso sem vacilar. - Mas não precisa se apressar. Podemos... explorar cada detalhe com calma.

Senti um calor subir pelo rosto; a respiração ficou presa por um instante, e ele percebeu. Claro que percebeu. Seu olhar percorreu meu corpo com precisão calculada, avaliando cada gesto, cada reação, como quem examina um objeto com potencial e, no final, encontra imperfeições.

Quando falou novamente, sua voz cortou o ar, afiada e gélida:

- Não se preocupe, Moretti. Não vou me rebaixar a esse nível.

Giovanni não se moveu. Apenas me observava, o sorriso sutil brincando nos lábios, como se tivesse previsto cada palavra e gesto meus.

- Seu quarto... - disse, a voz baixa, medida, provocadora - fica subindo as escadas, no corredor à direita. Ao lado do meu. Mas acho que antes de descansar, você poderia... se recompor.

Cada sílaba dele parecia cuidadosamente desenhada para me testar, para me fazer vacilar.

Segurei a vontade de responder com provocação, respirando fundo. Mantive o passo firme, mesmo com o calor que subia pela espinha a cada segundo em que nossos olhares se cruzavam. Por fora, controle total; por dentro, o caos que ele provocou ameaçava escapar.

Passei por ele com passos mais firmes do que realmente me sentia. Mas ele seguiu atrás de mim. Cheguei à porta do quarto, mas antes que conseguisse girar a maçaneta, ouvi sua voz mais próxima, quase um sussurro:

- Não se iluda. Mesmo quando estiver sozinho, não estará livre de mim.

Meu coração disparou, mas finquei os pés no chão. Entrei e fechei a porta com cuidado. O silêncio do quarto era sufocante, e ainda assim, cada pensamento me arrastava de volta àquele olhar, àquela provocação.

Puxei a gravata, desfazendo o nó, como se assim pudesse arrancar a sensação de aperto. Giovanni parecia determinado a me mostrar o quanto me odiava - e o quanto desejava me ver em pedaços.

Deixei a gravata cair no chão e passei a mão pelo rosto, tentando apagar qualquer rastro dele em mim. Mas era inútil. Giovanni não precisava estar aqui para me cercar. Bastava a lembrança da voz dele, baixa, certeira, cravando como lâmina.

Respirei fundo, mas o ar parecia denso, pesado. Como se cada sombra do quarto carregasse um pedaço dele. Odiava admitir, mas a raiva que ele provocava vinha misturada a algo que eu não sabia nomear - algo que me corroía de dentro, como se minha própria mente fosse o campo de batalha que ele queria conquistar.

Apertei os olhos, forçando a mim mesmo a não ceder. Giovanni podia querer me quebrar, mas eu não lhe daria esse prazer.

                         

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