Era Daniel Campos.
"Meu Deus, Helen, o que aconteceu com você?", ele perguntou, arregalando os olhos de preocupação ao ver meu rosto machucado. "Eu soube de Evertt... eu sinto muito mesmo."
Forcei um sorriso quase imperceptível. "Isso já ficou para trás."
Ele me encarou, sua expressão suavizando, e começou com um certo tom de brincadeira: "Sabe, se por acaso algum dia você resolver virar essa página, a minha oferta continua de pé."
Antes que eu tivesse a chance de dizer algo, um homem corpulento - um dos seguranças de Evertt - surgiu e deu um empurrão brusco em Daniel.
"Mantenha distância da senhora Martin", o homem disse com rispidez.
No mesmo instante, posicionei-me na frente de Daniel. "O que você pensa que está fazendo?"
Evertt apareceu logo em seguida, o olhar cravado em mim e o maxilar travado. "Estou garantindo sua proteção, Helen. A mando de Evertt."
Ajudei Daniel a se levantar, e meu olhar, frio e duro, se encontrou com o de Evertt. "Você não tem nenhum poder sobre a minha vida."
Ele segurou meu pulso com uma força que não admitia contestação. "Vamos embora."
Ele me puxou, sem dar a mínima para os meus protestos, e deixou Daniel para trás, completamente paralisado.
Nessa mesma noite, ele invadiu meu quarto, completamente embriagado. O odor forte de uísque dominava todo o cômodo.
"Helen..." Ele caminhou de forma instável e desabou sobre mim na cama, suas mãos desajeitadas tentando mexer nas minhas roupas.
Usei toda a minha força para empurrá-lo. "Saia de cima de mim!"
"Qual é o seu problema?", ele reclamou, tentando levantar a minha blusa.
Bati em sua mão para afastá-la e perguntei, com a voz afiada como uma lâmina: "Você por acaso sabe quem eu sou?"
Ele parou no mesmo instante, como se sua confusão alcoólica tivesse se dissipado por um segundo.
Usei esse momento de hesitação para tirá-lo de cima de mim e me arrastei para o outro lado da cama.
A porta se escancarou de repente, e Kylee entrou com um olhar desconfiado. "O que está havendo aqui dentro?"
Respirei fundo, tentando me recompor. "Ele entrou no quarto errado."
Eu a encarei, minha expressão serena. "Acho melhor você levar o seu noivo de volta para a cama."
Ela o amparou para que ficasse de pé, seus olhos carregados de suspeita enquanto o guiava para fora do cômodo.
Na manhã seguinte, durante o café, Kylee fez uma cena dizendo que sua comida não estava quente o suficiente.
Evertt, sem pensar duas vezes, pegou o prato dela e trocou com o meu.
Não falei uma palavra, apenas fiz o caminho inverso com os pratos.
"Os empregados devem ter feito confusão", ele comentou, evitando me olhar diretamente. "Vou ter uma conversa com eles."
Kylee abriu um sorriso, uma expressão esperta e maliciosa no rosto. "Tem gente que simplesmente não suporta a felicidade alheia. Está sempre buscando um jeito de ser o centro das atenções."
Evertt continuou a comer seu mingau, fingindo não ouvir.
Observei seu rosto impassível e uma náusea de desprezo subiu pela minha garganta. Toda essa encenação era ridícula!
Soltei meu garfo na mesa e me retirei.
Eu mal havia entrado no meu quarto quando a porta foi aberta com um solavanco. Kylee estava parada ali, um sorriso debochado nos lábios.
"Tentando escapar? Está se sentindo culpada?", ela me alfinetou.
Virei para encará-la, minha voz completamente vazia de sentimentos. "Por qual motivo eu deveria me sentir culpada? Não pretendo tirar absolutamente nada de você. Pode ficar com ele."
Ela veio em minha direção e me empurrou com violência, fazendo minha cabeça se chocar contra a quina de uma cômoda. Uma dor aguda e lancinante percorreu meu crânio.
Um líquido morno começou a escorrer pela minha têmpora.
Fiquei de pé, minha vista um pouco embaçada. "Vou embora logo, logo. Você terá toda esta casa só para você."
Ela não pareceu acreditar em uma palavra. Passos ecoaram pelo corredor, e seus olhos se viraram na direção da porta, transformando-se completamente.
Ela se jogou no chão, agarrando a barriga e começando a gritar com uma dor que não existia.
A porta foi aberta violentamente, e Evertt entrou apressado. Ao ver que Kylee estava caída no chão, sua expressão se fechou em pura fúria.
"Meu bebê", Kylee choramingou, lágrimas rolando pelo rosto. "Helen, o bebê não tem culpa de nada!"
Pressionei uma das mãos contra a minha cabeça que sangrava, sentindo o mundo girar. "Eu nem sequer encostei nela."
Evertt deu uma risada de escárnio. "Então me explique por que ela está caída?"
Ele deu uma instrução ríspida aos seus seguranças. "Levem-na para o porão e tranquem a porta."
Meus olhos se arregalaram de pavor.
Escuridão... A porta bateu com um estrondo surdo, jogando-me em um breu total.
As paredes ao redor pareciam se fechar contra mim. Lembranças antigas e apavorantes da minha infância vieram à tona.
Eu sofria de claustrofobia, e Evertt sabia disso. Era ele quem costumava me abraçar durante as crises de pânico, sussurrando que tudo ficaria bem.
Comecei a esmurrar a porta, com a voz embargada pelo pânico. "Deixem-me sair! Por favor!"
Apenas o silêncio me respondeu.
Minha respiração ficou ofegante e descompassada. A escuridão ganhava formas distorcidas ao meu redor. Deslizei até o chão, fincando as unhas nas palmas das mãos na tentativa de me manter presente.
"Evertt", eu sussurrei, num apelo desesperado que saiu sem que eu percebesse.
Então eu comecei a rir, um riso sem controle e carregado de desespero. As lágrimas desciam livremente pelo meu rosto.
O que eu estava fazendo? Foi o próprio Evertt que havia me prendido aqui. Meu salvador era o meu tirano. Ele não estava morto, apenas havia deixado de existir para mim.