Desta vez eu me lembrava bem do que havia acontecido.
Eu confundi novamente o irmão gêmeo do Simon com ele.
Mas, desta vez, bastou abraçá-lo para saber que ele não era o Simon.
Eles eram totalmente diferentes, desde o cheiro, até o jeito de falar e olhar.
O Simon tinha um olhar gentil e carinhoso, o irmão dele parecia extremamente frio.
Pelo visto, eles só eram parecidos por fora, por dentro eram totalmente o oposto.
Mas, de alguma forma eu consegui acabar desmaiando nos braços dele de novo.
Abri os olhos e encarei o teto.
O apartamento estava claro, mas não eram as luzes do apartamento, era luz solar. Como assim? Eu passei a noite toda naquele lugar?
Ok. Ele certamente ainda estaria dormindo, eu só precisava me levantar e deixar aquele lugar, antes que ele me visse ali.
Me levantei do sofá e comecei a calçar meus sapatos.
- Você acordou! - uma voz masculina ecoou atrás de mim, me fazendo arrepiar.
Lentamente, me virei em direção do dono da voz.
O homem servia uma mesa de café da manhã.
- Bom dia! - ele disse sério
- Que bom que acordou, eu já estava começando a me preocupar.
- Você me trouxe para o sofá? - questionei.
- Sim. Não pareceu muito certo te deixar desacordada no chão! - ele respondeu.
- Eu acabei dormindo aqui! - comentei preocupada.
- Você parecia cansada, por isso eu não quis te acordar! - ele disse com um sorriso de canto
- Venha, tome café da manhã comigo.
Apesar de serem irmãos gêmeos, ele não era mesmo parecido com Simon, mas o sorriso de canto dele era exatamente igual ao do Simon. E isso me deixava doente de saudades do Simon.
- Obrigada, mas eu preciso ir! - dei uma desculpa
- Fica para outro dia.
- Você não parece nada bem! - ele observou
- Aposto que está há dias sem comer nada. Simon não iria gostar de te ver se desgastando assim. Então, pelo Simon, fique e tome café da manhã comigo.
Eu não sabia ao certo se deveria aceitar ou não, mas por um impulso, talvez por ele ser o irmão gêmeo do Simon, eu acabei aceitando o convite dele para o café da manhã.
Ou, eu simplesmente queria estar mais perto de alguém que me lembrasse ele. Mesmo que fosse só fisicamente.
- Deveria comer algo mais nutritivo! - ele disse empurrando a tigela de mingau de aveia em minha direção
- Acho que vai te fazer bem. Você parece exausta e tenho certeza de que não come nada há dias.
Como ele sabia disso? Como ele acabou chegando a essa conclusão. Será que a minha aparência estava tão deplorável assim?
- Eu devo estar com uma aparência péssima! - comentei.
- Sendo bem sincero, sim! - ele afirmou.
A sinceridade dele não era nada parecida com o Simon, que sempre fazia de tudo para agradar a todos. Mesmo que tivesse que mentir ou usar termos mais leves, ele sempre se esforçava para não magoar os sentimentos de ninguém.
- Talvez o Simon devesse ter sido mais como você! - comentei baixinho
- E então, talvez ele ainda estivesse aqui!
- Ele nunca poderia ser assim! - ele disse, me deixando surpresa por ter conseguido me ouvir, mesmo que a minha voz soasse quase como um sussurro
- Ele seria incapaz de machucar alguém através da sinceridade. Ele preferia morder a própria língua a fazer isso.
Pelo visto eu não era a única que pensava dessa forma sobre o Simon.
O auditório estava lotado. Diretores, acionistas, parceiros, todos aguardavam que um anúncio oficial fosse feito. O ar parecia pesado, como se a sombra da tragédia ainda pairasse sobre cada um de nós.
No palco, Madeleine Prescott Ravenwood, imponente em seu luto impecável, ergueu o olhar sobre a plateia. Sua voz soou firme, embora houvesse uma dor velada em cada sílaba.
- É com orgulho e também com pesar que apresento a vocês o novo CEO do Ravenwood Group, meu filho, Maxon Ravenwood.
O silêncio que se seguiu foi quase palpável. Um murmúrio de surpresa começou a se espalhar. Não pelo cargo em si, mas porque todos pareciam ter a mesma reação que eu tive ao vê-lo pela primeira vez, incredulidade. Simon e Maxon. Eram gêmeos idênticos.
Novamente eu senti aquele desconforto.
Mais uma vez, era como ver Simon ressurgir diante de mim, mas sem o calor no olhar, sem o sorriso gentil, sem a vida que ele carregava. Maxon tinha a mesma face, mas os olhos, eram frios, distantes, como vidro partido.
Madeleine continuou, com a mesma elegância ensaiada:
- E aqui também está conosco Sabrina Hart, arquiteta talentosa, colaboradora dedicada e melhor amiga de Simon.
Todos se voltaram para mim, e por um instante me senti exposta demais. Forcei um sorriso discreto e assenti em silêncio. Então Maxon se aproximou. Por um segundo, nossos olhares se cruzaram. O mesmo rosto, a mesma expressão que eu conhecia tão bem, mas tão diferente.
- Senhorita Hart - disse ele, a voz grave, quase mecânica
- É um prazer conhecê-la.
- Senhor Ravenwood - respondi, sem saber como esconder o tremor em minha voz.
Ele sustentou o contato por um instante, mas logo se afastou, como se aquele ambiente fosse sufocante demais. Sem explicação, virou-se e deixou o salão, ignorando os olhares curiosos.
Foi puro impulso. Antes que eu pudesse pensar, minhas pernas já o seguiam. Subi as escadas em ritmo acelerado até chegar ao terraço. O vento frio chicoteava meu rosto, e a chuva fina começava a cair.
Foi então que o vi.
Maxon, parado sobre o parapeito do prédio, a cidade inteira se estendendo abaixo de seus pés. O terno negro contrastava com o tom de sua pele. Ele não parecia ouvir a tempestade, nem o ruído do trânsito lá embaixo.
Por um instante, meu coração congelou.
Ele ia pular.
Não, eu não poderia ver o Simon partindo diante dos meus olhos novamente.
- Maxon! - minha voz saiu antes que eu pudesse controlar.
Ele se virou, devagar, como se só então tivesse notado minha presença. Os olhos, iguais aos de Simon, estavam cheios de algo que me partiu em dois, dor crua, raiva e um vazio profundo.
O vento frio batia forte em meu rosto, como se quisesse me tragar aos poucos.
Eu estava apavorada.
Eu sempre odiei lugares altos, então por que o segui até ali?
Ele não teria mesmo coragem, não é?
Não. Eu não poderia arriscar. Não poderia deixá-lo cometer uma loucura daquelas.
- Por favor, me dê a sua mão! - pedi sentindo um aperto no peito
- Me dê a sua mão, por favor.
- Acha que o Simon se arrependeu? - Maxon questionou.
- Em algum momento, acha que ele se arrependeu?
- Tenho certeza que sim! - afirmei
- Tenho certeza de que ele se sentiu culpado em um último momento. Você não quer se sentir assim também, não é? Se não quer, por favor, me dê a sua mão.
- Então, acha que ele sentiu medo?