Da Sua Prisão À Doce Liberdade
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Capítulo 4

Ponto de Vista de Alina Campos:

João Ricardo ficou ao meu lado por três dias, uma caricatura de marido preocupado. Ele me trazia refeições, afofava meus travesseiros e lia relatórios financeiros em voz alta, num tom monótono e maçante.

Mas seus olhos estavam sempre no celular. Ele trocava mensagens com Gênesis constantemente. Eu via o canto de sua boca se curvar em um sorriso, uma suavidade em seus olhos que nunca, jamais, era para mim. Ele estava a um milhão de quilômetros de distância, perdido em um mundo que ela havia construído para ele.

"Você sente falta dela, não é?" perguntei uma tarde, minha voz rouca.

Ele ergueu os olhos, assustado, e rapidamente guardou o celular no bolso. "O quê? Não. Estou aqui com você."

A mentira era tão descarada, tão insultuosa. Apenas fechei os olhos. Não adiantava discutir. Ele não estava ali porque se importava. Estava ali para garantir que eu não tentasse fugir, para garantir que eu não causasse mais problemas.

Pensei no homem que ele costumava ser. O João Ricardo que cancelaria uma reunião de um bilhão de reais se eu tivesse uma dor de cabeça. O João Ricardo que me abraçava a noite toda quando eu tinha um pesadelo. Aquele homem se foi, substituído por este estranho frio e obcecado.

A mulher que ele um dia amou era agora apenas um inconveniente. Um problema a ser gerenciado. Uma piada.

No dia em que recebi alta, o sol de São Paulo estava forte, mas eu não sentia nada além de um frio que chegava aos ossos.

No carro, a caminho de casa, João Ricardo quebrou o silêncio. "O aniversário da Gênesis é na próxima semana. Preciso que você compre um presente para ela."

Eu o encarei, incrédula. "Você só pode estar brincando."

"Não estou", disse ele, os olhos fixos na estrada. "Quero que vocês duas se deem bem. Isso seria um bom gesto."

"Eu não vou comprar um presente para a mulher que está destruindo minha vida", disse eu, minha voz tremendo de raiva renovada. "Eu não vou 'me dar bem' com ela."

A atmosfera no carro instantaneamente caiu vinte graus. A mandíbula de João Ricardo se contraiu. Ele parou o carro no acostamento com um guincho de pneus.

Ele se virou para mim, e seus olhos eram aterrorizantes. Toda a preocupação fingida havia desaparecido, substituída por uma frieza glacial.

"Você vai fazer isso, Alina", disse ele, sua voz perigosamente baixa. "Ou o que resta da sua mãe naquela urna... pode simplesmente ser espalhado ao vento. Seria um retorno muito 'natural' aos elementos, não acha?"

A ameaça pairava no ar, me sufocando. Ele faria isso. Eu sabia que faria. Ele destruiria o último pedaço da minha mãe que me restava, apenas para agradar aquela mulher.

Um soluço estrangulado escapou dos meus lábios. "Você uma vez disse que me amava mais que a própria vida", sussurrei, as palavras rasgando minha garganta. "E agora você usa as cinzas da minha mãe para me ameaçar? Você pisa no meu coração, me humilha, quase me mata, e para quê? Por ela?"

Lágrimas escorriam pelo meu rosto. "Você disse que nunca deixaria nada me machucar de novo, João Ricardo. Você jurou."

Ele apenas me observou chorar, sua expressão impassível. O homem que costumava enxugar minhas lágrimas agora parecia obter uma satisfação fria delas.

"Suas lágrimas não funcionam mais comigo, Alina", disse ele secamente.

Algo dentro de mim se partiu. Os soluços pararam. Olhei para ele, e um sorriso amargo e quebrado tocou meus lábios. Ele estava certo. O amor se fora. Tudo o que restava era essa performance feia e distorcida.

Enxuguei o rosto com as costas da mão. "Tudo bem", disse eu, minha voz oca. "O que você quer que eu compre para ela?"

O presente que ele queria era uma rara "Lótus Pétala-de-Lua", uma flor que diziam florescer apenas uma vez por década em uma montanha remota e sagrada. Para obtê-la, era preciso mostrar piedade absoluta.

Isso significava ajoelhar-se nos degraus de pedra fria e dura do templo da montanha do amanhecer até o amanhecer seguinte. Vinte e quatro horas completas de oração.

Depois, significava caminhar descalço por um caminho de quinze metros de brasas ardentes até o bosque sagrado onde a única lótus crescia.

Por uma semana, eu fiz isso. Ajoelhei-me até meus joelhos ficarem em carne viva e sangrando. Caminhei sobre aquelas brasas, a dor lancinante subindo pelas minhas pernas, cada passo uma agonia. Mordi o lábio até sangrar para não gritar.

Quando finalmente colhi aquela única e perfeita lótus branca, meu corpo cedeu. Eu desmaiei, meus pés uma bagunça de queimaduras e bolhas, meu corpo tremendo de exaustão e dor.

Arrastei-me montanha abaixo e passei os dias seguintes na cama, recuperando-me da provação, a lótus cuidadosamente preservada em um vaso de cristal. Era tudo para ela. Tudo para Gênesis.

                         

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