Memórias Queimadas, A Virada Incendiária de Uma Esposa
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Capítulo 3

Ponto de Vista de Helena Ferraz:

"Por quê?" A pergunta era uma coisa crua, quebrada, arrancada das profundezas da minha alma. "Ele era seu filho, Arthur. Por que você está tentando apagar cada vestígio dele? Por que está tentando matá-lo de novo?"

Arthur estava parado na porta, seu rosto uma máscara fria e indecifrável.

"Estou tentando seguir em frente, Helena. Algo que você parece incapaz de fazer."

Ignorei as chamas que lambiam as bordas da fogueira, o calor queimando minha pele. Caí de joelhos, mergulhando minhas mãos nas cinzas quentes, desesperada para salvar qualquer coisa. O calor era excruciante, mas a dor em meu coração era infinitamente pior. Puxei o plástico derretido do caminhão de brinquedo, os restos carbonizados de um livro de histórias, meus dedos empolando. Não eram apenas coisas. Eram as últimas peças tangíveis do meu filho.

"Pare com isso! Você vai se queimar!" Arthur avançou, agarrando meu braço para me afastar.

Eu lutei contra ele, um animal selvagem e encurralado.

"Me solta! Isso é tudo o que me resta!"

Ele praguejou, pegando um extintor de incêndio próximo de seu suporte na parede. Uma nuvem espessa de espuma branca irrompeu, sufocando as chamas e cobrindo as preciosas e arruinadas relíquias com um cobertor químico. O fogo estava apagado, mas também a última centelha de esperança em meu coração.

"Isso é uma lição, Helena", disse ele, jogando o extintor vazio de lado. Sua voz estava perigosamente calma. "Uma lição sobre deixar ir. Quanto antes você aprender, melhor será para todos."

Olhei para ele, para o homem que estava sistematicamente desmantelando minha vida, minha sanidade, meu passado. Havia algo sobrando do homem com quem me casei? Algum amor, alguma história compartilhada que pudesse ser alcançada? Ou tudo havia sido consumido por sua ambição e sua obsessão por Bárbara?

Não disse nada. Apenas me ajoelhei na bagunça de espuma e cinzas, reunindo cuidadosamente as peças queimadas e quebradas da vida de Léo. Levei-as para dentro, lavei-as com ternura e as tranquei em uma pequena caixa de jacarandá onde ele nunca mais poderia encontrá-las.

Naquela tarde, um fogo se acendeu dentro de mim. Não era o fogo do luto, mas o fogo frio e duro da vingança. Arthur queria que eu deixasse ir. Tudo bem. Eu deixaria ir. Deixaria ir ele, nosso casamento, a empresa que eu construí. Mas não antes de queimar tudo até o chão.

Eu precisava de ajuda. Não podia fazer isso sozinha. Pensei em Isaac Rocha, o maior rival de negócios de Arthur. Um investidor de capital de risco que era perspicaz, íntegro, e que uma vez tentou me contratar, dizendo que meu talento estava sendo desperdiçado à sombra de Arthur. Ele viu meu valor quando meu próprio marido havia deixado de ver.

Encontrei um celular pré-pago antigo e não rastreável que guardava para emergências. Enviei-lhe uma única mensagem criptografada: *Preciso conversar. Tenho algo que você quer. O código-fonte principal do 'Nexus'.*

"Eu juro, Arthur", sussurrei para o quarto vazio, apertando a pequena caixa de jacarandá contra o peito. "Eu vou fazer você pagar por isso. Vou fazer você sofrer como eu sofri. Vou tirar tudo de você, e não sentirei um pingo de remorso. Darei minha alma ao diabo se isso significar que posso ver você queimar."

Mais tarde naquele dia, um médico veio tratar as queimaduras em minhas mãos. Ele trabalhou em silêncio, aplicando pomada e bandagens. Arthur observava da porta, com os braços cruzados.

"Bárbara está se sentindo um pouco fraca", disse ele, assim que o médico saiu. "Ela está com desejo da sua paella de frutos do mar. Vá fazer para ela."

Olhei para minhas mãos enfaixadas e inúteis.

"Arthur, nosso filho está morto há menos de um mês."

"E? Existe alguma regra que diz que temos que passar fome para provar nosso luto?" ele zombou.

"Existe uma tradição, pelo menos, de luto", eu disse, minha voz baixa, mas firme. "De se abster de... indulgências. De comidas ricas. De prazeres carnais." As últimas palavras foram um dardo pontiagudo.

Ele ignorou.

"Isso é bobagem sentimental. Ela está grávida. Ela precisa de nutrição."

Bárbara apareceu atrás dele, um modelo de beleza frágil.

"Oh, Arthur, não a force", disse ela, sua voz suave e doce. "Eu posso tomar uma sopa. Não gostaria de incomodar a Helena, não quando ela está sentindo tanta dor." Seus olhos encontraram os meus por cima do ombro dele, e estavam cheios de alegria maliciosa.

"Viu? Ela é mais atenciosa com você do que você com ela", Arthur retrucou. "Ela está carregando meu filho, Helena. O mínimo que você pode fazer é cozinhar uma refeição decente para ela. É sua responsabilidade como a dona desta casa."

O fogo em meu peito rugiu para a vida.

"Não."

A palavra pairou no ar, pequena, mas inflexível.

O rosto de Arthur escureceu.

"O que você disse?"

"Eu disse, não. Não vou cozinhar para sua amante. Nem hoje. Nem nunca."

Seus olhos se estreitaram em fendas perigosas. Ele deu um passo em minha direção, sua voz um rosnado baixo.

"Você está testando minha paciência, Helena."

"E você destruiu a minha", retruquei, mantendo minha posição.

Ele me encarou por um longo e silencioso momento, uma tempestade se formando em seus olhos. Então, ele se virou para os dois seguranças que estavam sempre de prontidão na porta.

"Levem-na para a estufa de vidro. Trancem-na lá dentro. Ela pode ficar lá até reconsiderar suas 'responsabilidades'."

Meu sangue gelou. A estufa de vidro. Era um belo conservatório ensolarado nos fundos da propriedade, cheio de plantas exóticas e floridas de todo o mundo. Arthur a construiu para Léo, que amava as cores e a luz. Mas para mim, era uma câmara de tortura. Tenho uma alergia severa e potencialmente fatal ao pólen. Eu não punha os pés lá há anos.

Era minha única vulnerabilidade conhecida. E ele ia usá-la contra mim.

A ironia era tão espessa, tão amarga, que me sufocou. O belo santuário que ele construiu para nosso filho era agora a prisão que ele usaria para punir a mãe de seu filho.

            
            

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