Capítulo 6

Ponto de Vista: Elisa

Meu celular tocou quando eu estava saindo do escritório. Era Heitor. Deixei cair na caixa postal, mas ele ligou de volta imediatamente. Atendi, me preparando.

"Você viu a foto?", ele perguntou, a voz tensa com uma casualidade forçada.

Um grupo de conversa com seus amigos da faculdade, do qual eu inexplicavelmente ainda fazia parte, tinha se agitado uma hora atrás. Uma foto de Heitor e Kátia em uma recepção de casamento no fim de semana. Eles estavam na pista de dança, pressionados um contra o outro, a cabeça dela descansando em seu peito. Pareciam o casal feliz.

"Por que eu precisaria ver?", perguntei, minha voz calma. "Eu já sei."

"Você está com raiva?", ele perguntou, uma nota de esperança em sua voz. Ele queria uma briga. Uma briga era território familiar.

"Por que eu estaria com raiva?", rebati.

Houve uma longa pausa do outro lado da linha. Minha indiferença o estava desestabilizando.

"Escuta", ele disse, seu tom mudando para autoritário. "Vou jantar com alguns clientes hoje à noite no O Terraço. Esteja pronta às sete. Eu te pego."

Ele desligou antes que eu pudesse recusar.

Às sete em ponto, seu Tesla parou em frente ao meu prédio de escritórios. Quando entrei, Kátia já estava no banco do passageiro. Ela se virou para mim, um sorriso enjoativamente doce no rosto.

"Elisa! O Heitor disse que você não se importaria se eu viesse junto. Espero que não tenha problema." Sua voz estava carregada de uma condescendência triunfante.

Dei a ela um sorriso pequeno e apertado e entrei no banco de trás sem dizer uma palavra. Eu era a outra no carro do meu próprio marido.

Durante o trajeto, Heitor tentou me envolver na conversa, seus olhos encontrando os meus no retrovisor. Eu dava respostas de uma palavra, minha atenção fixa no meu celular.

No restaurante, um dos amigos de Heitor, Marcos, me puxou de lado. "Ei, Elisa. Sobre aquela foto... o Heitor se sente péssimo. Foi só um erro de bêbado." Ele estava tentando amenizar a situação, como já havia feito uma dúzia de vezes antes.

"Eu não estou com raiva, Marcos", eu disse, olhando-o nos olhos. "Na verdade, parabéns. Você e a Sarah finalmente se casaram."

Ele pareceu chocado. A antiga Elisa teria feito uma cena, ou no mínimo, aceitado suas desculpas esfarrapadas com resignação chorosa. Esta Elisa calma e distante era uma estranha para ele. Ele se lembrou da vez em que o encurralei em uma festa de Natal, acusando-o de acobertar o caso de Heitor com uma estagiária de marketing. Ele gaguejou e fugiu.

O gerente do restaurante se aproximou da nossa mesa. "Sr. Pontes, Sra. Hill. Devo abrir a garrafa de champanhe que vocês têm guardada conosco?"

Meu olhar passou do rosto em pânico de Heitor para o rosto presunçoso de Kátia. Então eles eram clientes assíduos aqui. Eles tinham sua própria garrafa.

"Claro", eu disse animadamente, antes que Heitor pudesse falar. "Abra todas. É uma celebração."

Pedi licença para ir ao banheiro, andando com pernas firmes. Heitor me seguiu, agarrando meu braço no corredor.

"Elisa, espere. O champanhe, não é o que você pensa. Era para um cliente..."

Acenei com uma mão desdenhosa, puxando meu braço de seu aperto. "Heitor, eu não me importo." Entrei no banheiro feminino, deixando-o parado ali, de boca aberta.

Quando voltei, a festa estava a todo vapor. Heitor estava se defendendo de um brinde, colocando-se entre um cliente bêbado e Kátia, protegendo-a. "Ela não pode beber muito", ele dizia, a voz firme, mas gentil. "Ela tem baixa tolerância."

Uma lembrança, nítida e fria, atravessou a névoa da minha indiferença. Um jantar, anos atrás. Eu era alérgica a álcool, um fato que Heitor frequentemente escolhia esquecer quando era inconveniente. Um cliente continuava me pressionando para beber, para brindar a um novo negócio. Olhei para Heitor em busca de ajuda, mas ele apenas riu.

"Não seja estraga-prazeres, Elisa. Apenas beba. Se você tiver uma reação, eu te levo para o pronto-socorro para uma lavagem estomacal."

Eu bebi o vinho. O resto da noite foi um borrão de urticária, febre e cólicas estomacais incapacitantes. Fomos para o hospital. Uma médica entrou no quarto, o rosto sério. Ela me disse que eu estava grávida. Ela me disse que eu tinha sofrido um aborto espontâneo.

Quando Heitor ouviu a notícia, ele não me abraçou. Ele não me consolou. Ele se virou contra mim, o rosto contorcido de raiva.

"Você perdeu? Como pôde ser tão descuidada? Eu te disse para não sair para beber com suas amigas!"

Ele me culpou. Pelo erro dele. Pela nossa perda.

A lembrança era tão vívida que roubou o ar dos meus pulmões. Olhei para ele agora, galantemente protegendo Kátia de uma única taça de champanhe, e algo dentro de mim finalmente, irrevogavelmente, quebrou.

Peguei minha bolsa da mesa e saí do restaurante sem dizer uma palavra.

Ele me seguiu para casa, é claro. Entrou furioso em nosso apartamento, o rosto uma tempestade.

"Que porra foi essa, Elisa? Você simplesmente foi embora! Você me envergonhou na frente de todo mundo!"

Eu não respondi. Apenas fiquei parada no meio da nossa sala de estar, minha bolsa ainda apertada na mão.

Ele zombou. "Qual é o problema agora? Vai ameaçar me deixar de novo?" Ele riu, um som curto e feio. "Tudo bem. Vamos nos divorciar."

Ele já tinha dito isso antes. A última vez foi porque eu comprei a marca errada de café. Eu implorei, soluçando, para que ele retirasse o que disse. Eu prometi ser melhor, ser mais cuidadosa.

Desta vez, olhei-o diretamente nos olhos. Minha voz era baixa, mas ecoou na sala silenciosa.

"Ok."

                         

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