- Eu posso fazê-la aqui, e se eu me tornar freira como a senhora?
Minha tia sorriu, achando que eu estivesse a brincar.
- Todos já vimos que não combina nada contigo, mas sempre podes dar amor de outras formas. Quero muito que vivas de outra forma, e que me dês muitos netos.
- Eu não vou conseguir viver lá fora! Tenho medo.
- O medo é parte do desenvolvimento humano. Vais te sair muito bem, tenho certeza disso, sempre foste muito inteligente e dedicada no que fazes. Lá fora. Será moleza para ti, vais ver.- ela passou a mão pelos meus cabelos e limpou uma lágrima que deslizava em minha bochecha.
- E se eu não conseguir enquadrar-me? O mundo lá fora é assustador.
- Eu sei que vais! Não duvides das tuas capacidades, mas lembra-te sempre, Deus está contigo, e eu também e se o mundo for muito perigoso, aqui você tem uma família, as freiras e noviças são a tua família e esse convento é o teu lar, nunca te esqueças disso- falou a freira me segurando nos ombros. Me envolveu em um abraço caloroso e cheio de ternura.
A única demonstração de amor materno que tenho.
- Tenho algo para ti.
- O que é isso? - recebi uma carta antiga. Que dizia: Para Laila e Elira.
- A sua mãe deixou aqui, há 17 anos, estava com você nas mãos, eras tão nova naquele tempo, nem acredito que já és uma mulher adulta.
- Porquê a senhora está me dando ela agora?
- Acho que precisas saber pelo menos porquê ela fez o que fez.
- Não existe nenhuma justificação para abandonar um filho- murmurei ao olhar para a carta em minhas mãos.
- Eu sei, apenas lê.
Minha tia saiu de perto de mim, me deixando ali, olhando o que parecia ser minha sentença final. E quando abri, lá eu vi o nome dela, como quem estava prestes a se desfazer de um fardo.
Laila, minha querida irmã.
"Peço desculpa pela maneira invulgar com que te deixo a minha pequena Elira, não encontrei outra pessoa para deixá-la. E quando ela estiver a ler isso... espero que entenda que com toda dor do mundo eu tive que deixar o meu bem mais precioso para trás. Não sei se algum dia voltarei ou se sobreviverei a isso. Mas saiba que a minha irmã é a pessoa ideal para cuidar de você. E quando fores maior de idade não me procure, deixa que eu mesmo vou até você.
Com amor Mãe."
Com ironia, eu sorri, amarga, com raiva, mas tudo isso se desvaneceu ao olhar para o grande convento.
Talvez foi melhor assim mesmo.
Entrei para dentro do convento e no meu quarto, vozes femininas gritaram.
- Surpresa. - o quarto estava decorado, balões rosas, faixas brancas com detalhes cor de rosas, presentes e flores. Noviças e Freiras todas lá.
- O que é isso? - perguntei surpresa. Mas alegre com a pequena celebração embora não soubesse exatamente para que fim.
- Pensou mesmo que te deixaríamos ir sem uma festa de despedida? - falou uma das noviças e minha amiga Ruth.
- Muito obrigada! Não esperava isso! - agradeci com um sorriso sincero.
- Vamos sentir muito a tua falta! - Falou a Madre superiora.
- Eu também vou sentir muito...
- Nem parece que ontem você chegou aqui- se virou e olhou para minha tia- Ela tinha apenas 4 anos quando chegou aqui.
- Sim! A minha Lira cresceu muito- concordou a minha tia, vindo em minha direção para me abraçar.
- Eu sei que não vou conseguir sobreviver lá fora, então eu volto, de qualquer forma.
Todas sorriram.
- Todas sabemos que se voltar é porque nem tentou. Então vá e viva com muita cautela.- falou a outra freira.
Uma das noviças chegou perto do meu ouvido e disse.
- Depois me conta como são os gatos lá fora. - falou brincando.
- Ruth! - chamou a madre superiora. Ouvindo o que ela disse.
- pode deixar - sussurrei.
E nós as duas rimos.
- Vamos? - Perguntou a minha tia.
- Sim! Podemos ir.
Fomos até a saída e abraçamo-nos.
Não conseguia segurar as lágrimas, era estranho deixar aquele lugar assim.
- vai correr tudo bem! - falou a minha tia.
Não respondi, apenas limpei as lágrimas e subi no carro.
Durante o caminho, o motorista do convento estava calado e eu também, Jonas era falador, mas naquele instante parecia entender o meu momento. A viagem durou pouco tempo, chegamos a Nova Iorque em apenas uma hora. Nova Jersey não ficava assim tão longe.
- Seja bem-vinda a Nova Iorque menina Elira. - falou o senhor Jonas, finalmente quebrando o silêncio.- uma das mais belas cidades do nosso país.
- Uau! - meus olhos vagueavam pela enorme cidade e os prédios lindos e altos demais para conseguir olhar de baixo e ainda dentro do carro.
- O senhor vive aqui? - perguntei curiosa.- como faz para não se perder?
O homem sorriu!
- Em breve vai conhecer como a palma da sua mão. Acredita em mim, não tem nenhum segredo nisso.
- Se o senhor diz eu acredito - falei baixo.
Trinta minutos depois chegamos a um prédio, não era tão alto nem tão luxuoso quanto os outros, mas era igualmente lindo.
- É aqui! - falou o homem, parando bem a frente dele.- que lugar é esse?
- Sua nova casa! A Freira Laila comprou ela antes de se tornar Freira, então agora é onde a menina vai morar.- Ele fechou o porta malas após tirar todas as minhas coisas. Me ajudou a levar as malas até a portaria.
Um homem de aparentemente 60 anos levantou-se ao nos ver.
- Sejam bem-vindos, em que posso ajudar.
O senhor Jonas se colocou a frente e falou com o homem enquanto eu olhava ao redor da portaria. Era lindo, antigo mas elegante.
O velho olhou para mim, seus olhos brilharam, um sorriso bobo se formou em seus lábios depois de alguns segundos disse finalmente.
- Sigam-me! É por aqui.- falou o porteiro nos dirigindo até ao elevador.- Esse prédio é antigo, mas tudo ainda funciona, o dono trata de fazer a manutenção pessoalmente.
- Ele parece lindo mesmo- sussurrei.
- É sobrinha da dona do 125? - perguntou o velho.