"Como...?", grasnei, minha garganta seca. "O médico disse que o veneno agia rápido."
"Foi um milagre, senhorita", disse ela, a voz trêmula. "Eles disseram que se eu tivesse demorado cinco minutos a mais para chamar a ambulância particular, você... você não teria sobrevivido."
Seu rosto se contraiu. "Eu implorei a eles, Senhorita Beatriz. Implorei ao Sr. Monteiro e aos seus irmãos para olharem para você, para verem a marca da picada, para chamarem um médico. Mas eles não quiseram ouvir. Estavam todos amontoados ao redor da Senhorita Helena, que chorava sobre como você tinha jogado uma caixa nela. Uma caixa! Enquanto você estava no chão, convulsionando."
Ela torceu as mãos, seus nós dos dedos brancos. "Eles me chamaram de velha histérica. O Sr. Caio me disse para parar de fazer cena e lembrar do meu lugar."
Meu lugar. A reserva esquecida.
"Eu os lembrei", Maria sussurrou, a voz embargada de lágrimas, "de todas as vezes que você cuidou deles. Quando o Sr. Daniel teve aquela gripe terrível, foi você quem ficou acordada a noite toda, trocando suas compressas frias. Quando o Sr. Bruno quebrou a perna esquiando, foi você quem o levou para a fisioterapia três vezes por semana porque ele odiava as enfermeiras. Quando a primeira grande empresa do Sr. Caio quase faliu, você vendeu as joias que sua avó lhe deixou para ajudá-lo, e você nunca nem contou a ele."
Suas palavras eram pequenos punhais, cada um perfurando a casca entorpecida que eu havia construído ao redor do meu coração.
"E o Sr. Monteiro", ela engasgou num soluço. "Por cinco anos, você administrou toda a casa dele, sua agenda social, você até aprendeu a fazer sua sopa favorita que só a mãe dele sabia a receita. Você fez tudo por eles. E eles não viram nada. Eles não veem nada além dela."
Eu ouvi em silêncio, uma única lágrima quente traçando um caminho pela minha têmpora e em meu cabelo. A dor no meu coração era muito pior do que a pulsação na minha mão.
Só mais um pouco, eu disse a mim mesma, o pensamento da ilha um bálsamo distante e fresco na minha alma em chamas. Só mais um pouco, e então você estará livre.
Dois dias depois, a clínica particular me deu alta. Voltei para a mansão e a encontrei enfeitada com balões e serpentinas. O som da celebração jubilosa me atingiu como um golpe físico. Eles estavam dando uma festa. Uma festa de aniversário para Helena. Era meu aniversário também. Ninguém se lembrou.
Eles estavam todos reunidos na sala de estar, presenteando Helena com uma montanha de presentes luxuosos. Um colar de diamantes de João Pedro. Um carro esportivo vintage de Daniel. Uma bolsa de edição limitada de Bruno. Um livro raro de primeira edição de Caio.
Quando me viram parada na porta, as risadas morreram. Os sorrisos congelaram em seus rostos.
"Olha só quem apareceu", disse Bruno, seu tom escorrendo sarcasmo. "Decidiu nos agraciar com sua presença, é? Teve umas boas férias no spa?"
"Nós ligamos para a clínica", acrescentou Caio, seus olhos frios e duros. "Eles disseram que foi uma picada de aranha sem importância. Você foi liberada ontem. Precisava ser tão dramática?"
"Mentir está se tornando um mau hábito para você, Beatriz", debochou Daniel.
João Pedro se aproximou de mim, sua expressão uma máscara de decepção gentil que era mais cortante do que qualquer raiva. "Beatriz, por favor", disse ele suavemente, como se falasse com uma criança difícil. "Helena se sente péssima com o que aconteceu. Ela acha que você a está culpando. Você não vê como ela é frágil? Ela é sua irmã. Ela é minha esposa. Somos uma família."
Minha esposa. Ele disse isso com tanta facilidade. Os cinco anos que passamos juntos, a vida que construímos, foram apagados por aquele único documento legal que ele assinou tão avidamente por ela. E ele tinha a audácia de ficar aqui e falar comigo sobre família.
A raiva, pura e incandescente, surgiu em mim. Minha visão turvou. Senti o sangue sumir do meu rosto, mas forcei meus lábios a um sorriso. Parecia frágil, como se pudesse quebrar meu rosto em dois.
"Você está certo, João Pedro", eu disse, minha voz estranhamente doce. "Você está absolutamente certo."
Ele pareceu surpreso, um lampejo de inquietação em seus olhos. Ele não esperava que eu concordasse tão prontamente.
Nesse momento, Helena bateu palmas. "Ah, está na hora! Hora do meu vídeo de aniversário!"
As luzes diminuíram e a grande tela sobre a lareira piscou e acendeu. Deveria ser uma montagem de fotos da infância de Helena. Em vez disso, a tela foi preenchida com uma imagem em alta definição de Helena, cinco anos mais jovem, em uma posição comprometedora com dois homens em uma boate decadente. Sua blusa estava rasgada, sua expressão de abandono selvagem.
Então outra foto piscou. E outra. Cada uma mais escandalosa que a anterior. O ar na sala ficou pesado de choque e horror.
Na tela, em letras vermelhas e garrafais, uma legenda apareceu: FELIZ ANIVERSÁRIO PARA A MAIOR VADIA DE SÃO PAULO.
A sala explodiu em caos.
"Desliga isso!", berrou Daniel, seu rosto roxo de raiva.
Bruno pulou para o cabo de força, arrancando-o da parede. A tela ficou preta.
Caio agarrou o gerente do evento pelo colarinho. "Se uma palavra disso vazar, eu vou destruir você", ele sibilou.
Helena ficou congelada por um momento, seu rosto uma máscara de horror teatral. Então, seus olhos encontraram os meus do outro lado da sala. Ela apontou um dedo trêmulo para mim.
"Beatriz", ela lamentou, sua voz quebrando com angústia ensaiada. "Como você pôde? Como pôde fazer isso comigo?"
E então, na hora certa, seus olhos reviraram e ela desabou no chão, desmaiando graciosamente nos braços de João Pedro.
"Helena!", ele gritou, sua voz cheia de pânico. "Alguém chame um médico! Agora!"
Ele a pegou nos braços, mas antes de se virar para levá-la para cima, seus olhos se encontraram com os meus. O olhar neles não era mais gentil ou decepcionado. Era ódio puro e absoluto.
"Você vai pagar por isso", ele rosnou, sua voz uma promessa baixa e aterrorizante.