Eles eram um turbilhão de atividade em pânico, tudo por uma marca quase invisível. Enquanto isso, meu vestido era uma pira, as chamas subindo avidamente em direção à minha cintura, o cheiro de tecido e carne queimando enchendo o ar.
Meus gritos se transformaram em soluços sufocados de agonia e desespero. Eles não podiam me ouvir. Ou não queriam.
Então, uma nova figura irrompeu pelo caos. Um jovem tripulante com olhos arregalados e horrorizados. Ele não hesitou. Arrancou o casaco e se jogou em cima de mim, abafando as chamas com o próprio corpo.
"Senhorita! Senhorita, fique comigo!", ele gritou, seu rosto a centímetros do meu, sua expressão uma máscara de terror.
Através de uma névoa de dor, eu os vi. João Pedro e meus irmãos, escoltando cuidadosamente uma Helena chorosa para fora do convés, de costas para mim. Nenhum deles olhou para trás. Nenhum deles poupou um único olhar para a irmã, a noiva, que estavam deixando para trás.
Quando o tripulante e o médico do navio me levaram de volta para minha cabine, eu mal estava consciente. Minhas pernas eram uma confusão de queimaduras cruas e exsudativas. O médico trabalhou rapidamente, seu rosto sombrio. Ele me deu uma injeção de morfina, e o mundo começou a se desfocar nas bordas.
Ele saiu para buscar mais suprimentos, deixando-me sozinha na cabine silenciosa.
Minha mão, aquela que a aranha havia picado, tateou no bolso do meu vestido arruinado. Meus dedos se fecharam em torno do meu celular. Era um celular pré-pago barato que eu havia comprado semanas atrás. Ele vibrou. Uma mensagem de texto.
Com os dedos trêmulos, eu a abri. Era do escritório do Sr. Abreu.
Todos os documentos foram finalizados e arquivados sob seu novo nome. A ilha é oficialmente sua. Os arranjos finais de transporte estão confirmados para amanhã ao amanhecer.
Uma súbita e feroz vontade de viver surgiu em mim. Digitei uma resposta, meus dedos desajeitados e rígidos. PROSSEGUIR. CONFIRMADO.
"Com quem você está trocando mensagens?"
A voz de João Pedro, fria e afiada, cortou a névoa da morfina. Ele estava parado na porta, de braços cruzados, o rosto uma máscara de suspeita.
Desliguei rapidamente o celular e tentei escondê-lo sob o travesseiro.
Ele viu o movimento. Seus olhos se estreitaram. "O que você está escondendo, Beatriz?"
Ele entrou no quarto, mas ao se aproximar, seus olhos caíram sobre minhas pernas. O médico havia cortado o tecido queimado, deixando os ferimentos horríveis expostos. A pele em carne viva, empolada e supurando, era uma cena de pesadelo.
João Pedro parou abruptamente. A cor sumiu de seu rosto. "Meu Deus", ele sussurrou. "Beatriz... por que você não gritou? Por que não disse nada?"
Uma risada amarga e quebrada escapou dos meus lábios. "Eu gritei, João Pedro. Você só não estava ouvindo."
Vi um lampejo de horror genuíno em seus olhos, um vislumbre do homem que eu pensei conhecer. Ele correu para o meu lado, sua voz carregada de uma preocupação em pânico que parecia cinco anos atrasada. "O médico está voltando. Vamos conseguir o melhor tratamento para você."
Ele se sentou na beira da minha cama, sua mão pairando sobre meu cabelo como se quisesse me acalmar, mas não ousasse. "Helena está descansando. Os irmãos estão com ela. Eu ficarei aqui com você."
Eu apenas olhei para ele, meu coração uma coisa morta e oca no meu peito. Essa ternura, essa preocupação... o que valia agora? Ele era o marido de Helena. Ele havia feito sua escolha, repetidamente. Nós não éramos nada.
"Dói?", ele perguntou, sua voz um murmúrio baixo.
Eu balancei a cabeça, não confiando em mim mesma para falar. As queimaduras nas minhas pernas não eram nada. A dor real, aquela que estava me comendo viva, era uma ferida que ele nunca poderia ver e nunca entenderia.
O médico voltou, e João Pedro observou, seu rosto pálido e sombrio, enquanto minhas feridas eram limpas e curadas. Foi uma agonia que suportei em silêncio. Eu não lhe daria a satisfação das minhas lágrimas.
Assim que o médico estava terminando, a voz melosa de Helena veio do convés. "João Pedro! Querido! Os golfinhos voltaram! Você tem que vir vê-los!"
João Pedro hesitou. Por um único momento de tirar o fôlego, pensei que ele poderia ficar.
Mas então ele se levantou. Ele olhou para mim, seus olhos cheios de um conflito que eu não me importava mais em decifrar. "Vamos", disse ele, ajudando-me gentilmente a ficar de pé. "Você deveria vê-los também."
Ele me acomodou em uma espreguiçadeira acolchoada no convés, envolvendo um cobertor em meus ombros. O sol estava se pondo, pintando o céu em traços de fogo de laranja e ouro. Um grupo de golfinhos saltava e dançava na água cintilante, seus corpos elegantes capturando os últimos raios de luz. Era lindo. E era uma mentira.
Helena estava na amurada, flanqueada por meus irmãos, as mãos unidas na frente do peito como uma santa em uma pintura. "Ah, eles são tão lindos", ela suspirou. "Vamos todos fazer um pedido."
João Pedro e meus irmãos fecharam os olhos, seus rostos sérios e cheios de esperança. Eu sabia o que eles estavam desejando. Que Helena fosse curada. Que ela vivesse. Que sua preciosa e perfeita Helena fosse salva.
Olhei para seus rostos devotos, e uma certeza fria e clara se instalou em mim. Fechei meus olhos também.
"O que você desejou, Beatriz?", Helena perguntou, virando-se para mim com um sorriso enjoativamente doce depois de um momento. Todos olharam para mim, esperando.
Abri os olhos e encontrei seu olhar. Deixei o silêncio pairar no ar, pesado e significativo. Então, sorri, um sorriso real desta vez, cheio de uma paz estranha e libertadora.
"Eu desejei", disse eu, minha voz clara e firme, cada palavra uma pedra caindo em um poço profundo e silencioso, "que eu nunca, jamais, tivesse que ver nenhum de vocês novamente."