Ela franziu a testa ligeiramente para a caixa, mas me acenou para entrar. "Ele está de mau humor a manhã toda. Talvez você possa animá-lo."
Subi a escada familiar, cada passo um pequeno eco na casa silenciosa. A porta do quarto dele estava entreaberta. Ouvi risadas. A risada de uma garota.
Empurrei a porta sem bater.
E lá estavam eles. Leo estava sentado na cama, encostado na cabeceira, e Sofia estava aninhada ao lado dele, a cabeça em seu ombro. Ela estava usando a camisa de futebol dele, aquela com "ALMEIDA" e seu número impressos nas costas. A mesma camisa que ele me deu depois de seu primeiro jogo no time principal, aquela em que eu costumava dormir.
Foi como um soco físico no estômago. O ar saiu dos meus pulmões em um silvo silencioso.
Sofia olhou para cima, seus olhos se arregalando em surpresa fingida antes de se acomodarem em um brilho presunçoso e triunfante. "Ah, Laura. Não ouvi você entrar." Ela se aninhou mais perto de Leo, um pequeno gesto possessivo. "O Leo estava só me emprestando isso. Estava um pouco frio."
Leo não se moveu. Ele apenas olhou para mim, sua expressão indecifrável por um momento antes de endurecer em impaciência. "O que você quer, Lau?"
Não Laura. Não Laurinha, seu apelido de infância para mim. Apenas Lau. Curto. Irritado.
Uma onda de amargo auto-ódio me invadiu. O que eu esperava? Que ele estivesse sentado aqui, ansiando por mim? Que ele estivesse cheio de remorso por suas ações na noite anterior? Eu era uma tola. Uma tola de primeira categoria.
Lembrei-me de todas as vezes que ele ficou na minha porta na chuva torrencial, implorando para que eu não o deixasse. Ele uma vez dirigiu três horas no meio da noite apenas para se desculpar por uma discussão estúpida. Ele havia gravado nossas iniciais no velho carvalho atrás da escola e jurado que me amaria para sempre.
Ele usou meu amor, meu perdão, minha incapacidade de deixá-lo ir, como uma rede de segurança. Ele continuou forçando, continuou testando, apenas para ver até onde poderia ir antes que eu o puxasse de volta. Ele fez do ato de partir meu coração um esporte, confiante de que eu sempre estaria lá para juntar os pedaços para ele.
Mas a cola tinha acabado. Os pedaços agora eram apenas poeira.
"É isso", pensei, a percepção se instalando em meus ossos com uma finalidade fria e dura. "Esta é a última vez."
Levantei a caixa. "Só vim devolver suas coisas." Minha voz estava estranhamente calma, desprovida das lágrimas que ele estava tão acostumado a ouvir.
Ele olhou para a caixa, depois de volta para o meu rosto, um lampejo de algo - irritação? confusão? - cruzando suas feições. Ele acenou com uma mão desdenhosa. "Joga fora. Não preciso de nada disso."
Suas palavras foram feitas para machucar, para me dizer que nossa história compartilhada era lixo. E elas machucaram. Mas também cortaram o último e fino cordão que me conectava a ele.
Sem um momento de hesitação, virei-me e caminhei até o topo da escada. O quarto dele dava para o hall de entrada de pé-direito duplo. Inclinei-me sobre o corrimão e simplesmente soltei a caixa.
Ela caiu, girando, e atingiu o piso de madeira polida abaixo com um baque doentio. O som foi alto, definitivo. Um som de quebra.
Não olhei para ver o conteúdo se espalhar. Não precisei. Voltei-me para a porta.
"Espera", disse Leo, sua voz afiada. Ele estava de pé agora, as sobrancelhas franzidas. "E as suas coisas? Você ainda tem coisas aqui."
Ele queria um rompimento limpo também, ao que parecia. Tudo bem.
"Leve tudo", ele ordenou, sua voz carregada de uma fúria fria. "Não quero nenhuma lembrança sua no meu espaço."
Não respondi. Voltei para o quarto, meus movimentos rígidos e robóticos. Comecei pela estante. Tirei a cópia gasta de O Grande Gatsby que eu havia deixado lá, a foto emoldurada de nós no baile do segundo ano, o ridículo bonequinho de uma bailarina que ele comprou para mim. Empilhei-os em meus braços.
O tempo todo, ele e Sofia voltaram para seu próprio mundo. Ele sentou-se de volta na cama, e ela começou a tagarelar sobre alguma festa que estava por vir, sua voz irritando meus nervos em carne viva. Ela acidentalmente derrubou um copo de água em sua mesa de cabeceira, e eu me preparei para sua explosão. Leo odiava bagunça. Ele era obsessivamente arrumado.
Mas ele apenas suspirou, pegou uma toalha e começou a limpar. "Cuidado, Sofi", ele disse, e sua voz era gentil. Uma gentileza que ele não usava comigo há meses.
Ele costumava ficar com raiva se eu deixasse um livro fora do lugar. Mas por ela, ele mesmo limpou a bagunça.
Então ele fez algo que fez o sangue em minhas veias virar gelo. Ele se levantou, foi até o armário e tirou uma camisa de futebol nova e impecável. "Aqui", ele disse, entregando-a a Sofia. "Esta está limpa. Pode ficar com ela."
Meu coração, que eu pensei já ter sido estilhaçado, de alguma forma encontrou uma maneira de quebrar ainda mais. Eu estava entorpecida. Total e completamente entorpecida. A dor era tão vasta que se tornou um vazio.
Terminei de juntar minhas coisas do quarto principal e fui em direção ao banheiro da suíte para pegar minha escova de dentes e sabonete facial.
Sofia bloqueou meu caminho. Ela parou na minha frente, um sorriso malicioso brincando em seus lábios. "Tentando chamar a atenção dele, Laura? Se fazendo de difícil? Não está funcionando. Ele está cansado dos seus joguinhos."
"Com licença", eu disse, minha voz plana.
"Ele é meu agora", ela sussurrou, sua voz um silvo venenoso. "Eu vou para a USP com ele. Estarei no dormitório dele, na cama dele. Serei eu quem ele manda bom dia e boa noite. Eu vou te apagar completamente."
Tentei contorná-la, mas ela agarrou meu braço, suas unhas cravando na minha pele. "Seus pais são ricos, né? O que você fez, comprou seu lugar na vida dele? Bem, dinheiro não compra amor. Ele me ama."
Suas palavras eram absurdas, mas a menção aos meus pais acendeu uma faísca de fúria no vazio gelado do meu peito.
"Me solta", eu disse, minha voz perigosamente baixa.
Ela riu. "Ou o quê? Vai chorar para o papai?"
Foi o suficiente. Puxei meu braço de volta, uma súbita onda de adrenalina percorrendo meu corpo. O movimento foi brusco, e ela tropeçou para trás, seus olhos arregalados de choque.
Assim que ela perdeu o equilíbrio, ouvi passos subindo as escadas correndo.
Leo.
Os olhos de Sofia dispararam em direção ao som e, em uma fração de segundo, um olhar de pura e calculada astúcia brilhou em seu rosto. Enquanto caía para trás, ela estendeu a mão e agarrou a frente da minha camisa, me puxando para baixo com ela.
Caímos para trás juntas, um emaranhado de membros.
E fomos direto por cima do corrimão baixo no topo da escada.
A queda pareceu acontecer em câmera lenta. Um grito rasgou minha garganta, misturando-se com o guincho de Sofia. Atingimos o piso de madeira abaixo com um impacto brutal e de quebrar os ossos.
Uma dor lancinante atravessou minha cabeça quando ela se chocou com o chão. Senti algo quente e úmido escorrer pela minha têmpora. Sangue.
Sofia já estava chorando, sua voz se transformando em um lamento histérico. "Leo! Ela me empurrou! A Laura me empurrou da escada!"
Vi o rosto de Leo aparecer no topo do patamar, seus olhos arregalados de horror. Ele desceu as escadas furioso, seu rosto uma máscara de raiva trovejante. Ele correu direto para Sofia, ajoelhando-se ao lado dela, suas mãos pairando sobre ela como se ela fosse feita de vidro.
"Você está bem? Sofi, você se machucou?", ele perguntou, sua voz grossa de pânico.
"Eu... eu acho que quebrei meu tornozelo", ela soluçou, apontando um dedo trêmulo para mim. "Ela fez de propósito! Ela disse que ia me matar!"
A cabeça de Leo se virou para mim. Eu estava tentando me levantar, minha visão turva, a dor na minha cabeça me deixando enjoada.
"Leo, eu não...", comecei, minha voz fraca.
"Cala a boca!", ele rugiu, sua voz ecoando no hall. "Não quero ouvir suas mentiras!"
"Ela me agarrou", eu implorei, lágrimas de dor e frustração finalmente se libertando. "Ela me puxou com ela."
"Eu vi você, Laura", ele cuspiu, seus olhos cheios de um nojo que cortou mais fundo do que qualquer golpe físico. "Eu vi você puxá-la. Você está louca?"
Ele nem mesmo me ouvia. Ele nem mesmo olhava para mim, para o sangue emaranhado no meu cabelo. Todo o seu foco estava em Sofia, que agora chorava suavemente em seu ombro.
"Saia da minha casa", ele disse, sua voz caindo para um rosnado baixo e ameaçador. "Saia antes que eu chame a polícia."
Ele cuidadosamente pegou Sofia em seus braços, embalando-a como se ela fosse a coisa mais preciosa do mundo. Ao passar por mim, ele nem sequer olhou para baixo.
Lembrei-me de uma vez em que caí e ralei o joelho, e ele me carregou até em casa, beijando o ferimento e prometendo lutar contra o "monstro do asfalto". Aquele garoto se foi. Em seu lugar havia um estranho, um estranho cruel e frio que olhava para mim com nada além de desprezo.
Todas as explicações, todos os anos de amor e devoção, toda a dor e tristeza, morreram em meus lábios. Era inútil. Ele já havia escolhido sua verdade.
De alguma forma, consegui me levantar. Cada movimento enviava uma pontada de agonia pela minha cabeça. Deixei minhas coisas espalhadas no chão dele. Eu não as queria mais. Eu não queria nenhuma parte dele.
Saí cambaleando de sua casa para a luz ofuscante do sol, deixando um pequeno rastro do meu próprio sangue no imaculado capacho de boas-vindas.
Dirigi até o pronto-socorro.
O médico me disse que eu tive uma concussão e precisava de três pontos acima da sobrancelha. Enquanto eu estava deitada na sala branca e estéril, esperando minha mãe vir me buscar, meu celular vibrou.
Era uma mensagem com foto de um número que eu não reconheci. Eu abri.
Era uma foto de Leo, a testa franzida em concentração, envolvendo gentilmente uma bolsa de gelo no tornozelo de Sofia. Ela olhava para ele com olhos de adoração. O fundo era claramente o quarto dele.
O texto abaixo dizia: Ele está cuidando tão bem de mim. Algumas pessoas simplesmente sabem como tratar uma garota.
Olhei para a foto, para o olhar terno em seu rosto que costumava ser reservado apenas para mim. Não senti nada. Nenhuma raiva, nenhum ciúme, nem mesmo uma pontada de dor. Apenas um vazio oco e ecoante. A parte de mim que amava Leo Almeida finalmente, verdadeiramente, morreu.
Apaguei a mensagem, bloqueei o número e desliguei meu celular.