Era um deepfake. Um grotescamente convincente. Eles pegaram um clipe do filme independente para maiores que foi meu último trabalho como atriz - um papel cru, desesperado, que me rendeu aclamação da crítica e notoriedade na indústria - e o misturaram perfeitamente com pornografia explícita. O áudio era um loop distorcido das falas mais vulneráveis da minha personagem, transformadas em algo obsceno.
Um suspiro coletivo percorreu o salão de festas luxuosamente decorado. Os pais dos colegas de classe de Bernardo, a elite de São Paulo, congelaram com taças de champanhe a meio caminho da boca. Seus sorrisos educados se transformaram em máscaras de nojo e julgamento.
Eu vi nos olhos deles, a conclusão rápida e condenatória. Essa é Alice Barros. A atriz decadente com quem Heitor Montenegro inexplicavelmente se casou. A interesseira. O lixo que ele trouxe para seu mundo imaculado.
Eu sabia, com uma certeza tão fria e afiada quanto um caco de vidro no meu estômago, quem tinha feito isso. Tinha a crueldade de Bernardo e Bruno escrita por toda parte, guiada pela mão precisa e maliciosa de sua mãe, Carolina. Este era o presente de aniversário deles para o irmão. Minha execução pública.
Meu celular, apertado na minha mão, vibrou com notificações. Eu não precisava olhar. Eu sabia o que eram. O clipe estaria em toda a internet em minutos. As manchetes se escreveriam sozinhas. Os comentários seriam um esgoto de slut-shaming e veneno, desenterrando toda mentira e meia-verdade já impressa sobre mim.
Eu disse que ela era uma vagabunda.
Não é à toa que ela não consegue segurar o marido. Ele provavelmente tem nojo.
Ela não tem filhos por um motivo. Que desastre.
Do outro lado do salão, eu os vi. Meus enteados. Bernardo estava de braços cruzados, um sorriso presunçoso e triunfante no rosto. Bruno, sempre o mais fraco, estava filmando a reação da multidão com seu celular, rindo.
"Ela vai surtar", eu podia imaginar Bruno sussurrando. "Espera só pra ver. Ela vai gritar e chorar e fazer uma cena enorme."
Eles estavam esperando que eu desmoronasse. Eles queriam o drama, a validação de que finalmente me levaram ao limite.
Mas assim que a primeira onda real de náusea me atingiu, Heitor apareceu. Ele se moveu com a eficiência rápida e brutal que geralmente reservava para aquisições hostis. Ele pegou o controle mestre de um coordenador de eventos em pânico e bateu o polegar no botão de desligar.
A tela ficou preta.
Um silêncio sufocante caiu sobre o salão. O rosto de Heitor era uma nuvem de tempestade. Ele se virou, seu olhar travando em seus filhos. Ele não gritou. Não precisava. Ele caminhou até eles, agarrou os dois pelo braço com uma força que os fez estremecer, e os arrastou para fora do salão sem uma única palavra. As pesadas portas se fecharam atrás deles, me deixando sozinha em um mar de olhos hostis.
Eu precisava sair. Eu não conseguia respirar. Tropecei em direção a uma porta lateral que levava a um terraço deserto, minhas pernas tremendo. O ar frio da noite foi um choque para meus pulmões. Apoiei-me na balaustrada de pedra, meus nós dos dedos brancos.
Minhas mãos tremiam enquanto eu tirava um cigarro da pequena bolsa que carregava. Eu raramente fumava mais, mas esta noite, eu precisava. Acendi, a pequena chama dançando na escuridão, e dei uma tragada longa e desesperada.
A nicotina atingiu meu sistema, uma calma suja e química que momentaneamente acalmou a batida frenética do meu coração.
"O que diabos você pensa que está fazendo?"
A voz de Heitor era afiada, cortando o silêncio. Ele arrancou o cigarro dos meus lábios e o esmagou sob o calcanhar de seu sapato de couro italiano.
"Você enlouqueceu?", ele sibilou, o rosto a centímetros do meu. Seu hálito cheirava a uísque caro. "Você não pode fumar. E se você estiver grávida?"
Seus olhos não estavam cheios de preocupação por mim. Estavam cheios de condenação. O mesmo olhar que ele me deu quando tomei uma segunda taça de vinho no jantar na semana passada.
Grávida.
Uma risada estranha e histérica borbulhou na minha garganta. Ah, a ironia era espessa o suficiente para sufocar. Grávida. Um bebê. Nosso bebê.
A memória, aquela que eu mantinha trancada no cofre mais profundo e escuro da minha alma, se libertou.
Foi há cinco anos. Nosso primeiro filho. Um menino. Nós o chamamos de Léo. Ele foi uma surpresa, uma pequena e milagrosa rachadura na fundação contratual do nosso casamento. Por dois anos, eu me permiti acreditar que ele poderia ser a cola que nos manteria juntos. Ele tinha os olhos de Heitor, mas o meu sorriso. Ele era perfeito.
E então ele se foi.
Ele tinha acabado de aprender a andar, um bebê desajeitado e alegre que amava a água. Estávamos na propriedade de verão dos Montenegro. Eu o observava chapinhar na parte rasa da piscina. Virei-me por um segundo - apenas um único e imperdoável segundo - para responder a uma mensagem da minha irmã.
Quando olhei de volta, ele não estava lá.
Pânico, frio e absoluto, me dominou. Gritei seu nome. Léo. LÉO! Corri ao redor da piscina, meus olhos varrendo a água azul cristalina, meu coração batendo um ritmo frenético e aterrorizante contra minhas costelas.
Então eu vi. Uma pequena sandália azul flutuando perto do ralo da parte funda.
Eu o encontrei no fundo da piscina, seu corpinho imóvel, seu cabelo espalhado como uma auréola escura. Mergulhei, a água um choque de frio, e o puxei para fora. Ele era tão pesado. Tão mole.
"Não, não, não", eu cantava, deitando-o nos azulejos quentes da beira da piscina. Comecei a reanimação cardiopulmonar, meus movimentos frenéticos, desajeitados. Soprei em sua boca minúscula e sem resposta, sentindo o gosto do cloro e das minhas próprias lágrimas salgadas. "Vamos, bebê, respire. Respire para a mamãe."
"Alice! O que você está fazendo?!", a voz de Heitor era um rugido. Ele estava em uma ligação de negócios lá dentro.
Ele arrancou Léo dos meus braços. Eu me agarrei a ele, um animal selvagem protegendo sua cria. "Me devolva ele! Eu posso salvá-lo!"
TAPA.
O som estalou no ar de verão. A marca da mão dele floresceu na minha bochecha, quente e ardente.
"Ele se foi, Alice!", Heitor gritou, seu rosto contorcido por uma dor tão crua que era aterrorizante. "Ele se foi! Ele está morto! OLHA PRA ELE!"
Caí de joelhos, meu mundo inteiro desmoronando naquele único e horrível momento. O sol estava tão forte. Os pássaros ainda cantavam. Como o mundo podia continuar quando meu filho se foi?
"Por favor", eu implorei, rastejando em direção a ele, minha voz um sussurro rasgado. "Por favor, Heitor. Deixa eu levá-lo. Só me deixa ficar com ele. Nós podemos ir embora. Eu o levo e nunca mais te peço nada. Por favor."
Ele não ouviu. Ele segurou o corpo de Léo e apenas me encarou, seus olhos cheios de uma acusação que me assombraria pelo resto da minha vida.
Ele me fez assistir enquanto o levavam. Ele me fez ir ao funeral. Ele me fez sentar na primeira fila do crematório e observar enquanto o pequeno caixão branco desaparecia atrás de uma cortina de veludo.
Uma parte da minha alma queimou com meu filho naquele dia. Tornei-me um fantasma na minha própria vida, uma casca oca vivendo no automático. Os médicos chamaram de depressão. Eu chamei de sobrevivência.
Eu nunca mais chorei por isso. Não na frente dele. Não na frente de ninguém.
E agora, ele estava falando de outro bebê.
"Alice?", a voz de Heitor suavizou, uma ocorrência rara. Ele viu o olhar no meu rosto, o mesmo olhar vago que eu tive por meses depois que Léo morreu. Ele confundiu meu trauma com vergonha pelo vídeo. "Está tudo bem. Eu vou lidar com os meninos. Vou lidar com a imprensa. Tudo isso vai passar."
Ele estendeu a mão, tentando me puxar para um abraço.
"Não se preocupe", ele murmurou, sua voz tingida com a calma condescendente que ele usava para acalmar acionistas histéricos. "Eu vou cuidar de você."
Eu me afastei de seu toque quando as pesadas portas do salão de festas atrás de nós foram abertas, banhando o terraço em uma súbita inundação de luz.
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