Entre sombras e lembranças
img img Entre sombras e lembranças img Capítulo 3 Guarda‐costas
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Capítulo 6 Sempre na defensiva img
Capítulo 7 Casamento por contrato img
Capítulo 8 Quero ver o Apolo img
Capítulo 9 Quero que seja amigo de Amy img
Capítulo 10 So quero um amigo... img
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Capítulo 3 Guarda‐costas

15 anos depois

O sol estava no auge de seu domínio, pendendo majestoso no céu e lançando seus raios implacáveis sobre a arena. O suor escorria pelo meu corpo, cada gota uma testemunha do esforço e da determinação que pulsavam em minhas veias. Minha respiração era cadenciada e ritmada, cada inalação e exalação um reflexo da concentração que eu havia alcançado. Meus olhos fixavam-se intensamente em um único alvo, e a tensão no ar era quase palpável.

O disparo do sinal soou como uma trombeta de guerra, e eu avancei com a força de toda minha determinação, cada passo me aproximando da batalha que definiria meu destino. Meu adversário, igualmente preparado e feroz, aguardava-me na arena, e o confronto entre nós prometia ser uma verdadeira guerra de gigantes.

O barulho da plateia era ensurdecedor, uma cacofonia de gritos e aplausos que refletiam a divisão de opiniões sobre quem emergiria vitorioso. A excitação no ar era quase tangível, uma mistura de expectativa e ansiedade que envolvia cada espectador. Eu estava ali não apenas para competir, mas para triunfar. Cada músculo em meu corpo estava tenso, preparado para a colisão que se aproximava.

Quando nossos bastões se chocaram, o som ressoou como uma explosão. Os impactos reverberavam em meus braços, a força do golpe sendo um lembrete constante da intensidade da luta. Nossos olhares se encontraram no meio do tumulto, e o que vi nos olhos do meu adversário foi um espelho do que sentia: fúria, determinação e uma necessidade desesperada de vencer.

A luta não era apenas um teste de força física, mas também uma batalha de espíritos. Estávamos ali há anos, acumulando habilidades e experiências, e esta luta era nossa chance de conquistar a liberdade de um inferno que havia se tornado nossa prisão. As histórias de que o vencedor seria nomeado o guarda-costas oficial do governador eram um farol de esperança para todos nós, uma promessa de uma nova vida além dos muros opressivos da arena.

Não era apenas uma competição; era uma oportunidade de transformação, de sair das sombras da orfandade e se elevar a um status de prestígio e segurança. A chance de passar de um órfão sem futuro para um guarda-costas oficial, com todas as vantagens e respeito que isso implicaria, era uma motivação poderosa.

Com cada golpe, cada movimento calculado e cada respiração ofegante, a minha determinação se solidificava. A luta era minha chance de conquistar algo que, até então, parecia inalcançável. Eu não iria perder. Não poderia. Este combate era meu caminho para o triunfo, meu grito de vitória contra um destino que havia tentado me esmagar.

Meu oponente era um homem robusto, com músculos definidos e uma presença ameaçadora. Seu bastão era grande e pesado, um testemunho de sua força bruta. Eu, por outro lado, estava mais ágil, meu bastão mais leve e projetado para movimentos rápidos e precisos. O confronto entre nós prometia ser uma batalha entre força e agilidade, entre poder e precisão.

Meu adversário avançou com um rugido primal, o bastão balançando com uma força brutal. Eu me preparei, antecipando o golpe, e consegui me esquivar com um salto ágil. O bastão dele cortou o ar onde eu estivera, mas eu já estava em movimento, atacando com um golpe rápido que fez com que ele recuasse um passo.

A plateia explodiu em gritos e aplausos, a vibração da multidão era uma força adicional que parecia impulsionar ambos os combatentes. Meus movimentos eram rápidos e calculados, cada ataque uma tentativa de encontrar uma abertura em sua defesa robusta. O adversário, por sua vez, parecia imperturbável, sua força bruta permitindo-lhe resistir aos meus ataques e contra-atacar com golpes pesados que me forçavam a recuar.

No meio da luta, consegui desviar de um golpe particularmente forte, aproveitando o momento de desequilíbrio para desferir um ataque direto. Meu bastão encontrou sua costela, e ele vacilou, um gemido de dor escapando de seus lábios. A oportunidade estava diante de mim, e eu ataquei com uma série de golpes rápidos e precisos, cada um intensificando a pressão sobre sua defesa.

Ele tentou se recuperar, sua força aparentemente inesgotável, mas a exaustão estava começando a mostrar seus sinais. Seus movimentos estavam mais lentos, menos coordenados, e eu percebi que minha estratégia de desgaste estava funcionando. Aproveitei a abertura para aplicar um golpe decisivo, mirando em um ponto vulnerável que eu havia identificado durante a luta.

Com um movimento ágil, desferi um golpe poderoso em seu tórax o fazendo ir ao chão. A plateia prendeu a respiração, o silêncio que se seguiu era quase tão intenso quanto a luta. Eu mantive meu bastão em posição, pronto para qualquer reação, mas ele não se levantou. O juiz se aproximou, verificando a situação antes de erguer o braço em minha direção, declarando-me vitorioso.

O alívio e a exaustão tomaram conta de mim enquanto eu me mantinha em pé, o suor escorrendo pelo meu rosto e corpo, a respiração irregular após o intenso combate. A plateia explodiu em aplausos e gritos de aprovação, a vibração da multidão preenchendo a arena com uma energia renovada.

Olhei para o corpo derrotado de meu adversário, sua respiração irregular e a derrota evidente em seu semblante. A luta havia sido árdua e implacável, mas a vitória era minha. Sentia um misto de orgulho e alívio, uma sensação profunda de realização que se misturava com a exaustão.

Meu nome ecoava por toda a arena, ressoando de boca em boca como uma melodia encantadora. Ah, então é assim que é ser amado? Naquele instante singular, senti-me único, como se o universo inteiro tivesse conspirado para me oferecer esse momento de glória. O anúncio de que eu seria o novo guarda-costas oficial foi recebido por um silêncio inquieto, a euforia efêmera logo se dissipou. Murmúrios de medo e descontentamento começaram a surgir, espalhando-se como uma onda invisível entre a multidão.

De repente, algo colidiu com meu ombro, quebrando o encanto do momento. Ao me virar, percebi que era um tomate podre, seu cheiro ácido e pungente invadindo meus sentidos, mais outros vieram em minha direção. Em um piscar de olhos, os rostos antes sorridentes se transformaram em máscaras de desdém. A multidão, que há pouco me celebrava, agora me vaiava com fervor. Senti uma pontada de desespero e confusão, como se a própria essência de minha identidade estivesse sendo questionada.

Um homem se aproximou, murmurando algo ao juiz com um ar de urgência e preocupação. As palavras trocadas entre eles pareciam selar meu destino. O espetáculo foi encerrado abruptamente, e minha nomeação, que minutos antes parecia uma certeza, agora estava envolta em incerteza e rejeição.

Naquele percebi, com amarga clareza, que para eles eu não passava de um mero objeto de diversão, uma marionete cujos fios eram puxados para seu entretenimento cruel. Como ousavam, em sua arrogância, arrancar de mim minha vitória? O ódio crescia dentro de mim, rugindo como uma tempestade que ameaçava devastar tudo em seu caminho.

Era assim que eles me viam? Apenas um espetáculo grotesco para suas horas de ócio? A raiva fervia em meu sangue, queimando com uma fúria cega. O rancor, espesso como fumaça, enevoava meus pensamentos, enquanto uma tristeza profunda, quase palpável, envolvia-me como um manto pesado. Eu estava afogado num mar de emoções turbulentas, onde cada onda me puxava mais para o fundo.

Minha esperança de sair daquele internato, de deixar para trás aquelas paredes opressoras e, finalmente, conquistar um pouco de respeito como guarda-costas oficial, havia sido brutalmente esmagada. A última faísca de esperança que eu nutria, aquele brilho tênue de um futuro mais digno, fora cruelmente apagada, lançada ao mais profundo e escuro poço do desespero. Estava perdido, traído por aqueles que, por um momento fugaz, acreditei que poderiam me reconhecer.

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A inquietação que me dominava era palpável, manifestando-se em um constante andar de um lado para o outro, como se o movimento pudesse aliviar a tempestade que se formava em meu peito. Quase arrancando os cabelos, eu tentava compreender a situação, enquanto o juiz nos havia conduzido, a mim e a Klaus, para uma sala reservada. Klaus, meu adversário, observava-me com crescente irritação. A perplexidade dominava meus pensamentos: por que eles parecia encontrar tanto prazer em nos ver competir? Seríamos apenas uma fonte de entretenimento para eles? Seria esse o destino que me esperava pelo resto da vida? Tudo parecia bom demais para ser verdade, e a desconfiança corroía minha mente.

- Desse jeito, vai acabar abrindo um buraco no chão - disse Klaus, sua voz carregada de irritação, enquanto seus olhos acompanhavam meu incessante vai e vem.

- O que você esperava? Eu ganhei a luta e não vou aceitar entregar o prêmio a você - respondi, a frustração fazendo minha voz elevar-se enquanto avançava em direção a Klaus

- Talvez eles tenham visto que eu sou mais adequado do que você - desdenhou, seu tom carregado de arrogância.

- E por que acha isso, hein? - retruquei, a raiva começando a ferver sob a superfície.

Antes que a situação pudesse se agravar, o juiz adentrou a sala, seguido pelo homem que nos havia contactado no momento do anúncio oficial. Atrás deles, surgiu o governador, uma figura imponente e sombria que enchia o ambiente com uma presença quase palpável. Ao fitar seus olhos, algo se agitou em minha memória: olhos cor de mel? Onde eu já os tinha visto antes?

Perdido em meus pensamentos turbulentos, fui subitamente trazido de volta à realidade pela voz severa do juiz, que parecia cortar o ar como uma lâmina afiada.

- Existe um motivo muito sério para que você, Tyler, não possa assumir o cargo de guarda-costas - disse ele, olhando-me de cima a baixo com uma expressão de desdém.

- E que motivo seria esse? - retruquei, sentindo a exaltação crescer dentro de mim, a indignação prestes a transbordar.

- Você é um ra... - Sua fala foi abruptamente interrompida por um toque em suas costas. - Quero dizer, você é órfão.

- Exato - interveio o governador, sua voz carregada de uma autoridade fria. - Mas minha filha assistiu à luta, e ela não tolera injustiças, digamos assim.

- E o que isso quer dizer? - perguntei, arqueando uma sobrancelha, tentando decifrar a mensagem oculta em suas palavras.

- Que você será o guarda-costas oficial, mas está proibido de dizer qualquer palavra à minha filha que não seja "sim, senhora".

- Claro, meu senhor - respondi, inclinando-me em reverência, sentindo uma mistura de alívio e temor.

A ideia de desobedecê-lo nem passava pela minha mente, pois conhecia bem as consequências. Anos vivendo nesse inferno haviam me ensinado o preço da insubordinação. As memórias de punições passadas ainda queimavam em minha alma, lembranças de dor e humilhação que eu jamais desejava reviver.

Enquanto o governador se afastava, a sombra de sua presença permanecia, uma constante lembrança do poder que ele detinha sobre minha vida. A missão que me aguardava era tanto uma oportunidade quanto uma prisão, um caminho estreito onde cada passo errado poderia levar a um abismo ainda mais profundo.

Meu coração batia descompassado, os sentimentos em tumulto. A promessa de ser o guarda-costas da filha do governador era um misto de esperança e medo, uma chance de provar meu valor, mas também uma prova constante de minha vulnerabilidade. Eu sabia que minha sobrevivência dependia de minha obediência e discrição, e estava determinado a seguir essas regras, por mais que minha alma gritasse por liberdade.

O olhar do governador, frio e calculista, permaneceu gravado em minha mente. Aqueles olhos tão familiares e ainda assim tão distantes. A sensação de déjà vu era quase esmagadora, como se um fragmento perdido do meu passado estivesse prestes a se revelar, trazendo consigo respostas e talvez mais perguntas.

Continua........

            
            

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