A Rainha das Cinzas
img img A Rainha das Cinzas img Capítulo 2 Ninguém em casa
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Capítulo 6 Duas escolhas img
Capítulo 7 Vamos passar por isso juntos img
Capítulo 8 Pesadelo img
Capítulo 9 Bata com toda a força que tiver img
Capítulo 10 Enterrando o passado img
Capítulo 11 Está pronta para isso img
Capítulo 12 Sua nova vida te aguarda img
Capítulo 13 Procedimento estético img
Capítulo 14 Não era para ter sido assim! img
Capítulo 15 Você está aprendendo img
Capítulo 16 Ninguém se torna poderoso sendo acomodado img
Capítulo 17 Perguntas sem respostas img
Capítulo 18 Aqueles olhos... img
Capítulo 19 O mistério da parte leste img
Capítulo 20 A razão de tudo img
Capítulo 21 Ela desejaria que você ficasse com isto img
Capítulo 22 Revertendo a história a seu favor img
Capítulo 23 Sessão de terapia img
Capítulo 24 O testamento de Camille img
Capítulo 25 Veja no que deu... img
Capítulo 26 Um novo caminho img
Capítulo 27 Estou contando com isso img
Capítulo 28 Escapada de fim de semana img
Capítulo 29 Até que não reste nada além da verdade img
Capítulo 30 Baile de Caridade Anual img
Capítulo 31 Sua mãe te treinou bem img
Capítulo 32 Quem era Alexander Pierce img
Capítulo 33 Perguntas sem respostas img
Capítulo 34 Já nos conhecemos img
Capítulo 35 Vou te proteger com todas as minhas forças img
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Capítulo 2 Ninguém em casa

Ponto de vista de Camille

A casa estava quieta, quieta até demais. Entrei pela porta lateral antes de trancá-la cautelosamente.

O ar cheirava a lustra-móveis de limão e rosas, como de costume. A cozinha estava escura, exceto pelo brilho fraco do painel da geladeira.

Era estranho estar de volta, como se estivesse entrando no lar de outra pessoa.

Então, subi as escadas silenciosamente, tomando cuidado para não pisar no terceiro degrau que rangia. Cada mínimo som que eu fazia parecia estridente, como se a casa estivesse me ouvindo e me julgando.

Quando cheguei à porta do meu quarto, parei ao perceber que ela estava entreaberta, exatamente como a deixei todos esses anos atrás.

Respirando fundo, entrei e a fechei.

Meu quarto de infância não mudara nada em três anos, com as mesmas paredes rosa-pastel, os mesmos móveis brancos, e a mesma coleção de troféus de segundo lugar. Os troféus de primeiro lugar de Rose ficavam expostos no quarto ao lado.

Olhei para meu reflexo no espelho da penteadeira, onde eu havia feito minha maquiagem de casamento há três anos, enquanto minha irmã estava atrás de mim com aquele sorriso perfeito no rosto. Agora, meu rímel estava borrado, o cabelo todo bagunçado e o vestido de marca, amarrotado.

Se minha mãe me visse assim, teria um ataque.

O relógio na minha mesa de cabeceira marcava dez e quarenta e sete da noite.

Naquela época, eu havia ficado sentada aqui por horas, empacotando o pouco que restava da minha antiga vida. Era incrível como dezessete anos nessa casa cabiam numa única mala.

Em meio ao devaneio, meu celular começou a vibrar novamente, pela vigésima vez em uma hora. Desta vez, era minha mãe.

"Camille, sua atitude é ridícula. Volte para casa para discutirmos isso como adultos. Rose está morrendo de preocupação..."

Sem nem responder, toquei na opção de encerrar a chamada.

Era óbvio que Rose estava preocupada. Afinal, seus planos cuidadosamente elaborados estavam indo por água abaixo...

Nesse momento, ouvi a porta de entrada no andar de baixo ser aberta, e paralisei diante dos passos familiares no assoalho de madeira. A batida leve dos saltos, o sussurro do tecido caro...

"Camille?" A voz da minha mãe ecoou pelas escadas. "Querida, sei que você está aqui. A empregada viu seu carro."

Eu deveria ter sido mais esperta e estacionado no quarteirão de trás, mas nunca fui a mais inteligente, não era mesmo? Esse era o papel de Rose.

Logo, mais passos surgiram, e uma voz mais grave ecoou - a do meu pai, que provavelmente fora chamado do trabalho para lidar com a filha caçula histérica. Mais uma vez...

"Princesa? Vamos conversar..." Sua voz carregava o mesmo tom gentil que ele usava quando eu tinha doze anos e chorava porque Rose havia ficado com meu lugar na peça da escola.

Um terceiro par de passos, mais leves e graciosos, perfeitos como tudo que vinha da dona deles fez meu sangue gelar.

"Camille? Querida, por favor. Não nos rejeite assim." A voz de Rose transbordava preocupação.

Olhei para a foto da família na minha cômoda, tirada no dia em que a adoção dela foi oficializada.

Minha mãe e meu pai sorriam de orelha a orelha, Rose estava radiante no seu vestido novo, e eu, com treze anos, forçava um sorriso com aparelho nos dentes e o rosto cheio de espinhas.

Uma feliz e bela família... Que piada.

De repente, a lembrança daquele dia me atingiu como um soco no estômago.

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"Mas estou ensaiando há meses, e a senhora Bennett disse que o papel principal era meu!", exclamei, segurando meu roteiro enquanto o choro embargava as palavras.

Rose tocou meu ombro com sua gentileza de sempre. "Ah, irmãzinha. Não foi minha intenção pegar seu papel. É que... as palavras saíram tão naturalmente durante a audição que a senhora Bennett disse que eu tinha um dom."

Claro que tinha - todos diziam que ela tinha um dom. Para a música, para a atuação, para fazer as pessoas amá-la.

"Talvez..." Os olhos de Rose brilharam com aquela centelha especial que sempre significava problemas. "Você pudesse me ajudar a ensaiar? Sendo minha atriz coadjuvante? Poderíamos fazer disso um trabalho entre irmãs!"

Acabei aceitando, já que era isso que boas irmãs faziam. Se eu lhe dissesse não, receberia olhares decepcionados da minha mãe e sermões do meu pai sobre lealdade à família.

Na noite de estreia, assisti das coxias enquanto minha irmã arrancava lágrimas do público. Depois do espetáculo, minha mãe entregou a ela um lindo buquê de rosas cor de pêssego, e meu pai nos levou para jantar fora.

Ninguém comentou sobre os discursos bem elaborados que eu havia escrito para ela durante nossos "ensaios", ou que o monólogo dramático dela era idêntico ao que eu apresentara na minha audição original.

Em meio a tudo isso, o único talento de Rose era a memorização, apenas.

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"Camille Elizabeth Lewis! Esse comportamento é inadmissível!", gritou minha mãe com rispidez, me trazendo de volta ao presente.

Quando abri a porta do meu quarto, deparei com eles no corredor como um retrato de família perfeita - minha mãe com seu terninho de grife, meu pai num visual elegante em seu traje de trabalho e Rose exibindo sua preocupação como parte essencial do look despojado.

"Olá, irmã. Não deveria estar consolando seu noivo?", perguntei com a voz firme.

Diante das minhas palavras ácidas, os olhos de Rose se arregalaram.

Sempre tão boa em atuar...

"Camille, por favor. Me deixe explicar..."

"Explicar o quê? Como você está dormindo com meu marido? Ou como armou tudo isso desde o começo?"

"Do que ela está falando?", meu pai perguntou a Rose, cujos olhos já estavam marejados.

"Ela está me atacando assim porque está chateada. Você sabe como ela é, papai", ela sussurrou, as lágrimas perfeitas e delicadas, que nunca borravam sua maquiagem, prestes a cair.

Soltando uma risada que soou estranha até para mim, rebati: "Não! Não se atreva a jogar essa carta de novo. Mostre a eles o anel, Rose. Aquele que Stefan te deu há dois meses quando eu estava 'doente demais' para ir ao evento de caridade."

Ao ouvir isso, minha mãe arfou, ao passo que o semblante do meu pai se fechou.

Por um segundo, a máscara de Rose caiu, permitindo que eu visse o lampejo de cálculo frio por trás da preocupação fingida.

"Não foi bem assim", ela começou.

"Não foi? Então como foi? Explique para eles que você me ligava toda semana, me dando conselhos sobre casamento enquanto dormia com meu marido. Conte a eles sobre todas as vezes que você me ajudou a escolher lingerie para os aniversários de casamento, enquanto Stefan estava trabalhando até tarde com você."

"Já chega! Rose jamais..." Minha mãe se manifestou, dando um passo à frente.

"Jamais o quê, mãe? Jamais mentiria? Ou manipularia? Jamais roubaria algo que pertencia à sua irmã?"

Após fazer essa série de perguntas, peguei meu celular e reproduzi a última mensagem de voz que Stefan enviara.

"Rose é minha alma gêmea, Camille. Tentamos resistir, mas algumas pessoas simplesmente estão destinadas a ficar juntas. Você tem que entender que..."

O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor, até que Rose se recompôs. "Nunca quis te machucar, mas não podemos controlar quem amamos..."

No instante seguinte, o som da minha mão atingindo o rosto dela estalou como um tiro.

"Camille! Você enlouqueceu?", gritou minha mãe enquanto segurava meu braço.

"Não, pelo contrário. É a primeira vez em quatorze anos que vejo tudo com clareza", respondi calmamente, observando a marca vermelha surgir na pele macia e imaculada de Rose.

Passando por eles com minha mala na mão, ouvi os soluços de Rose ecoarem atrás, a mesma atuação que ela aperfeiçoara ao longo dos anos para colocar todos contra mim.

"Para onde está indo? Você não pode simplesmente abandonar sua família!", meu pai gritou.

Nesse momento, parei no topo da escada e olhei para minha tal "família".

Enquanto minha mãe confortava Rose, meu pai parecia dividido, e minha irmã me observava em meio às lágrimas com um olhar que não demonstrava qualquer afeto.

"Família? Isso não é uma família, é um jogo. E por quatorze anos, joguei de acordo com as regras de Rose", eu disse com um sorriso que os fez recuar.

"Camille, por favor. Me deixe consertar isso." Rose se aproximou e estendeu a mão em minha direção, se mostrando sempre a irmã atenciosa.

Antes que ela pudesse me tocar, segurei seu pulso com firmeza. "Como irmã mais velha, você me ensinou bem - sobre manipulação, sobre paciência, e sobre esperar o momento perfeito para contra-atacar."

Mais uma vez, os olhos dela se arregalaram, o medo genuíno finalmente os dominando.

"Obrigada pelas lições. Agora, veja como as aprendi bem", sussurrei antes de soltá-la com brusquidez.

Ignorando seus apelos desesperados, desci as escadas, parei em frente ao espelho do corredor da entrada e dei uma última olhada em mim - rímel borrado, olhos vidrados, mas finalmente livre.

            
            

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