O menininho ficou imóvel por um segundo - depois o pânico tomou conta de seu pequeno rosto.
- Tia! - tentou gritar, mas a voz saiu trêmula, quase um sussurro.
Lá embaixo, o corpo de Helena jazia no frio do concreto, e mesmo assim, ela abriu os olhos com esforço, o olhar enevoado e febril.
Com as últimas forças, sussurrou:
- Vá...
A claraboia deixava passar uma luz pálida, quase prateada.
Sob aquele brilho, Helena parecia uma pintura viva - frágil, serena, absurdamente bela.
Os cabelos grudavam à pele suada, e nos olhos dela havia um brilho profundo, como um mar repleto de estrelas.
Aquela não era mais a garota ingênua do interior.
Nem o patinho feio que todos desprezavam.
Agora, diante da morte, ela era uma mulher moldada pela dor.
Mas de que adiantava isso?
Um sorriso amargo curvou seus lábios rachados.
Antes de alcançar a vingança que tanto sonhara... talvez ali fosse o seu fim.
Mesmo assim, havia paz em seu peito.
Pelo menos, antes de morrer, ela havia salvado uma vida.
Aquela criança indefesa...
Se o seu filho não tivesse morrido há cinco anos, teria a mesma idade daquele garotinho, e as lembranças vieram em ondas violentas.
Depois da tragédia, a família Rodrigues - envergonhada pela mancha no sobrenome - a despachou para o exterior, e um castigo disfarçado de redenção.
Mas Helena não ficou, e recusou-se a continuar sendo o fardo.
Abandonou tudo, e recomeçou do zero.
Prestou novamente vestibular para a faculdade de Belas Artes, e estudou até à exaustão, e desta forma, transformou a dor em combustível.
Ser uma atriz ou até mesmo, uma influenciadora sempre fora seu sonho, mas o destino - cruel e irônico - a empurrou para os bastidores, e ali, entre roteiros e sombras, ela se reinventou.
Com talento, inteligência e um rosto que ninguém esquecia, chamou atenção, e Tania a descobriu, e logo veio o contrato com a poderosa Vox Talents, o que parecia o recomeço perfeito.
Mas o destino - ou Camila - não a deixaria em paz.
Camila também entrou na Vox, e subornou Tania, que roubou seus projetos, espalhou rumores, e transformou cada vitória de Helena em uma nova ferida.
E agora, trancada em um depósito escuro, com a febre queimando sob a pele e o corpo exausto, Helena percebeu... A história estava prestes a se repetir, mas desta vez... ela não morreria.
–
Ao mesmo tempo, no luxuoso salão de recepção do Piratas Bar, o ar era denso o bastante para sufocar, e o dono do bar, os gerentes, os seguranças - todos estavam alinhados em silêncio, os rostos pálidos, os olhos baixos, e principalmente, o medo pairava no ambiente como uma névoa.
Eles sabiam: bastava uma palavra errada, e o inferno se abriria.
O herdeiro do Grupo ProCosan - o príncipe da família Ballmer - havia desaparecido dentro daquele bar, e no centro da sala, sentado em um sofá de couro negro, Henrique Ballmer, que emanava uma frieza que congelava o ar.
Nenhuma emoção. Nenhuma palavra. Mas sua simples presença fazia todos os corações tremerem.
Um jovem, ajoelhado aos pés dele, tremia tanto que mal conseguia respirar.
- I-irmão... me perdoa! - soluçou, o rosto coberto de lágrimas e suor. - A culpa é toda minha! Eu não devia ter trazido o Mateo pra cá! Se acontecer algo com ele... eu juro, eu me mato!
Henrique sequer piscou.
Então, sem aviso, levantou a perna e desferiu um chute seco no peito do rapaz.
- Agh! - Axel Ballmer caiu, tossindo, o corpo se curvando em dor. Mesmo assim, voltou a se ajoelhar, de cabeça baixa, respirando com dificuldade.
O medo era quase palpável.
Os pais estavam em outro continente - e se descobrissem que o neto havia desaparecido, com certeza, Axel não sobreviveria nem à ira do irmão, nem à dos pais.
O pânico o consumia por dentro.
E então - toc, toc.
Um som breve na porta fez todos prenderem a respiração.
O segurança mais próximo, hesitante, se aproximou e abriu-a devagar, e por um segundo, não viu ninguém, até olhar para baixo.
Seus olhos se arregalaram.
- Mateo!!!
O grito ecoou como um milagre.
- Mateo?! - Axel tropeçou até a porta e caiu de joelhos, agarrando a criança nos braços. - Meu Deus, você tá bem... você tá bem, meu pequeno!
O ar preso no salão enfim foi liberado, e o clima de morte se dissipou - por um instante.
Henrique se levantou lentamente, e cada movimento seu exalava controle, domínio absoluto.
Caminhou até o irmão, agarrou-o pela gola e o lançou para o lado, sem esforço.
Agachou-se diante do menino.
- O que aconteceu, filho?
Mateo ainda ofegava, os olhos grandes, úmidos, ele tentou falar, mas apenas segurou a mão do pai, com desespero mudo, e começou a puxá-lo em direção à saída.
Henrique franziu o cenho, confuso.
Foi então que algo o atingiu - não o toque do filho, mas um cheiro.
Um leve aroma flutuava no ar, vindo das roupas de Mateo.
Não era perfume.
Nem álcool.
Suave e puro, mas com um fundo frio e inesquecível - como uma lembrança antiga. Por um segundo, o coração de Henrique vacilou.
Mateo puxou novamente sua mãozinha, emitindo sons baixos, aflitos.
Henrique o ergueu nos braços e, sem dizer uma palavra, seguiu o caminho que o menino apontava, e atrás dele, Axel e os seguranças trocaram olhares silenciosos e o acompanharam.
Cinco minutos depois, o grupo chegou ao último andar do bar - um corredor estreito, com luzes piscando e o som distante da cidade noturna vibrando sob os pés.
Mateo, impaciente, se contorceu nos braços do pai e, antes que alguém pudesse segurá-lo, saltou para o chão. Correu até uma porta no fim do corredor e começou a bater com força, os punhos pequenos fazendo ecoar sons aflitos.
- Mateo, o que está acontecendo? - Axel perguntou, ofegante. - O que tem aí dentro?