Ele Escolheu a Amante, Eu Fiquei com Tudo
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Capítulo 4

Ponto de Vista: Helena Vitti

A chuva de São Paulo não estava apenas caindo; era um ataque.

Caía em lençóis implacáveis, dissolvendo a cidade em uma aquarela borrada de carvão e aço.

Fiquei sob o toldo do café, tremendo em meu trench coat, observando a rua através de uma cortina de água.

O SUV blindado de Dante parou no meio-fio.

Era um leviatã negro, equipado com vidro à prova de balas e pneus reforçados - uma fortaleza sobre rodas.

A porta traseira se abriu com um clique.

A etiqueta básica ditava que Dante saísse com um guarda-chuva.

Mas Dante Vitti não servia; ele era servido.

Em vez disso, ele ficou lá dentro.

Vi sua silhueta contra a luz interior.

E então, vi outra silhueta ao lado dele.

Meu coração martelava contra minhas costelas, um sinal de alerta frenético.

Saí do meio-fio, ansiosa para sair da chuva e confrontá-lo.

Esse foi o meu erro.

Meu salto prendeu em uma grade de metal no chão.

A dor subiu pelo meu tornozelo, aguda e branca, roubando o ar dos meus pulmões.

Tropecei, ofegando, meu joelho batendo no pavimento molhado.

A lama respingou na barra do meu casaco, manchando a lã bege de escuro.

Olhei para a boca aberta do SUV.

Dante estava olhando para mim.

Ele não se moveu.

Ele não correu para ajudar sua esposa, que estava ajoelhada na sarjeta como uma mendiga.

Sua expressão não vacilou com preocupação, apenas irritação.

"Entre, Helena", ele gritou, sua voz cortando o som da chuva. "Você está deixando a água entrar."

Cerrei os dentes, engolindo um grito, e me forcei a levantar.

Meu tornozelo latejava a cada batida do coração, um tambor de agonia.

Mancando, fui até o carro e entrei.

O interior estava quente, sufocante, e cheirava a couro rico e a um perfume de lilás enjoativo que instantaneamente cobriu minha garganta.

Sofia Ricci estava sentada ao lado do meu marido.

Ela era pequena. Delicada. Uma boneca de porcelana em um mundo de marretas.

Ela tinha olhos grandes e amendoados que pareciam estar perpetuamente à beira das lágrimas, e usava um vestido branco que permanecia impossivelmente seco e imaculado.

"Meu Deus", disse ela, sua voz sussurrada e cheia de falsa preocupação. "Você está bem? Parece absolutamente encharcada. Como um rato afogado."

Dante não olhou para mim.

Ele estava ocupado ajustando os controles de temperatura, garantindo seu conforto.

"Ela está bem", disse Dante, dispensando minha dor com um aceno de mão. "Helena aguenta o tranco."

Aguenta o tranco.

Essa frase doeu mais do que o pavimento.

Como uma mesa. Como uma mula. Como algo que você usa e esquece.

"Eu torci o tornozelo", eu disse, a água pingando do meu cabelo nos assentos de couro imaculados.

"É só uma torção", Dante descartou, seus olhos finalmente se voltando para os meus, frios e distantes. "Sofia está enjoada. Precisamos dirigir suavemente."

Eu o encarei.

Ele estava preocupado com o estômago delicado dela enquanto eu sangrava através das minhas meias.

O carro partiu, misturando-se perfeitamente ao trânsito.

Dante se inclinou em direção a Sofia, sua postura suavizando de uma forma que nunca acontecia comigo.

"Olhe para a sua esquerda", disse ele suavemente. "Aquele é o parque onde costumávamos nos encontrar. Você se lembra?"

Sofia deu uma risadinha, um som como sinos de vidro.

"Claro. Você quase foi preso por pular a cerca."

Eles riram.

Era um som íntimo, compartilhado - uma linguagem que eu não falava.

Sentei-me do outro lado do carro, invisível.

Eu era a guarda-costas.

Eu era a acompanhante.

Eu era o fantasma assombrando meu próprio casamento.

"O projeto do Porto está indo bem", disse Dante a Sofia, ignorando completamente minha presença. "A arquitetura é... adequada. Mas precisa de uma nova visão."

Minha cabeça se ergueu bruscamente.

"A arquitetura está finalizada", eu disse, minha voz afiada. "Os projetos estão aprovados."

Dante finalmente olhou para mim.

Seus olhos eram cacos de gelo.

"Eles são funcionais, Helena. Não inspirados."

Ele se virou para Sofia novamente, me excluindo.

"Sofia tem um olho para design. Ela acha que o terminal principal deveria ser de vidro. Aberto. Transparente."

"Isso anula o propósito de uma fachada segura para lavagem de dinheiro", argumentei, minha voz se elevando apesar da dor no meu tornozelo. "Vidro é um ímã de balas. É um pesadelo de segurança."

"É lindo", Sofia interveio, inclinando a cabeça.

"Você não quer que seja lindo, Helena?"

Ela sorriu para mim.

Era o sorriso de um predador, dentes afiados escondidos atrás de lábios macios.

Ela sabia exatamente o que estava fazendo.

Ela não estava apenas tomando meu marido.

Ela estava apagando meu legado.

"Dante", eu disse, minhas mãos tremendo. "Me deixe aqui."

"Estamos indo para a mansão", ele afirmou secamente.

"Me deixe aqui!", gritei.

O motorista se encolheu, seus olhos disparando para o espelho retrovisor.

Dante me fuzilou com o olhar, sua mandíbula se contraindo.

"Pare de fazer cena. Você está se envergonhando."

"Eu estou com vergonha de você", cuspi. "Desfilando com sua amante na frente da sua esposa. Você não tem honra."

A mão de Dante se contraiu.

Por um segundo, pensei que ele poderia me bater.

Em vez disso, ele apertou um botão no console.

A divisória entre os bancos dianteiros e traseiros subiu com um zumbido mecânico, nos selando.

"Você é minha esposa", ele sibilou, inclinando-se perto o suficiente para que eu pudesse sentir o cheiro de bourbon em seu hálito. "Você vai sentar aí e ficar em silêncio. Você construiu este mundo para mim, Helena. Agora aprenda a viver na sombra dele."

Olhei para Sofia.

Ela estava checando seu reflexo no espelho de sua bolsa, totalmente indiferente à destruição ao seu redor.

Percebi então que o silêncio não era submissão.

O silêncio era a respiração profunda antes do grito.

Era a calma antes de eu queimar o mundo inteiro dele até as cinzas.

            
            

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