"Você não tocou no seu croissant de novo. Está tudo bem?"
Forcei um sorriso.
"Só não estou com vontade hoje, Brenda."
Ela riu.
"Ainda não gosta de framboesa, hein? Lembro que você disse isso quando abriu. Sempre achei estranho, já que a maioria das mulheres adora uma boa torta de framboesa."
Meu sorriso vacilou. Minha mão congelou na foto de Ema. Tortas de framboesa. A favorita da minha mãe. E de Dante.
Minha mãe, uma mulher de força gentil, as amava. Meu pai, barulhento e amoroso, sempre as trazia para casa aos sábados, uma oferenda de paz após uma semana de negócios frenéticos. Nossa cozinha se enchia do aroma doce e azedo, um cheiro de lar e felicidade. Éramos uma família, inteira e inquebrável. Ou assim eu acreditava.
Foi durante os últimos dias da minha mãe, quando ela estava se apagando tão rápido, que ela sussurrou seu último desejo.
"Uma torta de framboesa, querida. Só mais uma, pelos velhos tempos."
Meu pai, com os olhos marejados de lágrimas, saiu correndo. Ele estava desesperado para realizar seu menor desejo. Ainda me lembro de sua ligação frenética da estrada, sua voz embargada de dor.
"Ela se foi, Alina. Sua mãe... ela se foi."
A próxima ligação foi da polícia. O carro do meu pai, destruído a ponto de não ser reconhecido, em uma estrada sinuosa do interior. Ele havia desviado, perdido o controle. Encontraram a torta, ainda em sua embalagem de papel branco, manchada de carmesim com seu sangue.
Em um único dia brutal, perdi os dois. O mundo ficou em silêncio, deixando-me à deriva em um mar de dor e choque.
Brenda, vendo o olhar distante em meus olhos, estendeu a mão sobre o balcão e tocou meu braço gentilmente.
"Oh, Alice. Você foi para um lugar sombrio, não foi?"
Assenti, incapaz de falar. As memórias eram um soco visceral no estômago. O cheiro de framboesa, antes um conforto, agora um presságio de perda indizível.
"Parece que você passou por muita coisa", disse Brenda suavemente. "É um milagre você estar aqui, de pé, administrando este lugar lindo." Ela fez uma pausa, seu olhar pensativo. "E sua pequena Ema... ela se parece tanto com o pai. Ele deve ter muito orgulho."
Eu me encolhi, engolindo uma resposta afiada. O pai de Ema. Dante. O homem que caminhou sobre as cinzas da minha vida e construiu seu próprio império sobre as ruínas.
"Ele não está envolvido", consegui dizer, as palavras tensas e curtas.
Brenda assentiu lentamente.
"Entendo. Bem, ele certamente está perdendo algo especial. Sabe, às vezes me pergunto sobre o seu passado, Alice. Você se porta como a realeza, mesmo quando está esfregando o chão. E depois há os rumores... sobre o seu marido." Ela baixou a voz conspiratoriamente. "Que ele era um grande magnata da tecnologia, e você simplesmente o largou. Desapareceu no ar, dizem."
Meu sangue gelou. Os rumores. Eles me seguiram, mesmo até aqui. Cinco anos. Não foi o suficiente.
"As pessoas falam", eu disse, tentando parecer indiferente. "Sempre vão falar."
Brenda sorriu gentilmente.
"Falam mesmo. Mas ninguém aqui acredita nas coisas ruins, Alice. Vemos o bem em você. Vemos o quanto você trabalha duro, o quanto você ama a Ema." Ela apertou meu braço gentilmente. "Deve ter sido tão difícil, ficar sozinha, com tudo o que você perdeu."
Suas palavras, simples e gentis, abriram uma fenda dentro de mim. Meus olhos arderam com lágrimas, inesperadas e indesejadas. Ninguém falava comigo com tanta empatia crua há tanto tempo.
Lembrei-me dos primeiros dias com Dante, após o funeral dos meus pais. Ele era meu protetor, meu salvador. Ele havia orquestrado todo o funeral, vendido a empresa falida do meu pai, prometendo reconstruí-la sob seu próprio nome, para honrar sua memória. Ele insistiu que nos casássemos imediatamente, para consolidar nossos bens, para enfrentar o mundo como uma frente unida.
"Alina", ele havia dito, segurando minha mão, seus olhos sinceros, "seu pai me deu uma chance, uma família. Agora, eu vou te dar uma. Eu vou cuidar de você. Para sempre." Ele até transferiu uma parte significativa das ações de sua nascente empresa de tecnologia para o meu nome, um grande gesto de compromisso.
Eu me agarrei às suas promessas como uma náufraga a uma tábua de salvação. Ele era meu mundo. Dediquei-me a ele, à sua visão. Eu era a esposa devotada, sempre presente, sempre solidária, sempre acreditando. Ignorei suas longas horas de trabalho, suas frequentes viagens de negócios, suas ocasionais mudanças de humor. Ele estava construindo um império, afinal. Ele estava trabalhando para nós.
Ele me amava, ou assim eu pensava. Ele declarava publicamente sua devoção eterna em entrevistas, elogiava minha inteligência e apoio inabalável. Ele me surpreendia com presentes luxuosos, me levava em viagens espontâneas. Ele me chamava de sua musa, sua âncora, a razão de seu sucesso.
Fui arrebatada por tudo isso. Enterrei a dor pelos meus pais, a raiva pela crueldade da vida, sob uma montanha de felicidade projetada. Eu era a Sra. Dante Rossi, a esposa de um ícone da tecnologia que se fez sozinho. E eu estava gloriosa, beatificamente apaixonada.
Até o meu aniversário de 30 anos.
Eu estava em casa, esperando por ele, velas acesas, um jantar pequeno e íntimo preparado. Ele estava atrasado, como de costume. Mas desta vez, um alerta de notícias piscou no meu celular. Um site de fofocas. Uma foto granulada. Dante. E Clara. De mãos dadas. Saindo de um jato particular em Mônaco. Meu coração parou.
Liguei para ele. Ele atendeu, sua voz suave, imperturbável.
"Alina, querida! Feliz aniversário! Me desculpe, surgiu um negócio de última hora, estou preso no trânsito. Estarei em casa assim que puder, eu prometo." Ele parecia cansado, mas amoroso. Ele até fez uma piada sobre a surpresa que eu estava planejando.
Nesse momento, a campainha tocou. Era Clara. Ela estava lá, um sorriso largo e inocente no rosto, segurando um pequeno presente lindamente embrulhado.
"Feliz aniversário, Alina!", ela disse animadamente. "Dante me pediu para deixar isso aqui. Ele disse que sentia muito por não poder estar aqui."
Eu a encarei, o telefone ainda pressionado contra minha orelha, a voz de Dante ainda ecoando em minha mente. A traição me atingiu como um golpe físico. Não era apenas ele. Era ela também. Minha amiga. A mulher que eu havia trazido para nossas vidas. Eles haviam orquestrado essa mentira, juntos. Eles sabiam.
O presente em sua mão parecia um gesto de zombaria. O telefone na minha parecia pesado, quente. Meu mundo, o mundo feliz e perfeito que eu havia construído ao redor de Dante, implodiu. A dor foi imediata, aguda e absoluta. Eu era casada com um mentiroso, e minha melhor amiga era sua cúmplice. Meu feliz aniversário era uma mentira. Meu amor, uma piada.