Minha mente disparou, um borrão frenético de imagens: os doces votos de aniversário de Clara, as mentiras sussurradas de Dante ao telefone. A audácia pura de sua enganação arrancou o ar dos meus pulmões. Rasguei o jornal, depois outro, e outro, até que a elegante sala de estar ficou soterrada sob uma nevasca de mentiras trituradas.
Peguei as chaves do meu carro, minha visão embaçada de fúria. Dirigi, as ruas da cidade um labirinto de luzes piscando e buzinas raivosas. Eu não me importava. Eu precisava vê-los. Eu precisava entender.
Encontrei-os em sua "nova" casa – uma cobertura gigantesca que eu não reconheci, brilhando contra o horizonte de São Paulo. A porta da frente estava entreaberta. Eu a empurrei, meu coração um martelo contra minhas costelas.
Eles estavam lá, na sala de estar, um retrato de felicidade doméstica. Dante, rindo, com o braço em volta de Clara. A cabeça dela repousava em seu ombro, a mão dela sobre uma leve protuberância em sua barriga. Meu sangue gelou. A barriga. Era pequena, mas inconfundível.
"Dante!" Minha voz rasgou o ar, crua e quebrada.
Ele se virou, seu rosto perdendo a cor. Clara gritou, recuando, seus olhos arregalados com uma inocência fingida.
"Alina?", gaguejou Dante, colocando-se na frente de Clara, protegendo-a. Como ele sempre fazia.
"Seu desgraçado!", gritei, as palavras rasgando minha garganta. "Você se casou com ela? Você tem um filho com ela?" Meu olhar caiu para a mão de Clara. Em seu dedo, um anel de safira. O mesmo anel que eu havia mostrado a Dante anos atrás, dizendo que era a pedra mais linda que eu já tinha visto. Ele me disse que era "chamativo demais".
"O que você está fazendo aqui?", exigiu Dante, sua voz de repente fria, protetora. "Você não deveria estar aqui."
"Eu não deveria estar aqui?", ri, um som áspero e desesperado. "Eu sou sua esposa, Dante! Sua esposa!" Meus olhos se concentraram na leve marca de mordida no pescoço de Clara, mal escondida por seu colarinho. Uma ferida fresca. Uma que ele havia lhe dado. Era uma marca tangível de sua traição, gravando-se em meu cérebro.
Algo estalou. Avancei sobre Clara, minhas mãos voando, alimentadas por uma fúria tão potente que me consumiu.
"Sua cobra! Sua vadia mentirosa e manipuladora!"
Clara gritou novamente, tropeçando para trás.
"Ela está louca, Dante! Tira ela de perto de mim!"
Dante, com uma força que eu não sabia que ele possuía, me empurrou bruscamente. Eu caí, batendo na borda de uma mesa de centro com um baque surdo. Uma dor aguda floresceu em meu abdômen.
"Não ouse tocar nela!", rugiu Dante, seu rosto contorcido de fúria. Ele se ajoelhou ao lado de Clara, embalando-a. "Você está bem, querida? O bebê está bem?"
O bebê. O bebê dele. Nosso bebê. Meu bebê. O pensamento perfurou a névoa da minha raiva. O chute. O primeiro chute do meu bebê. Apenas esta manhã. A cãibra súbita e agonizante em minha barriga se intensificou.
"Nosso bebê, Dante", ofeguei, agarrando meu estômago. "Nós íamos ter um bebê."
Ele olhou para mim então, seus olhos arregalados com um horror fugaz. Mas foi fugaz. Ele rapidamente se voltou para Clara, sua preocupação com ela superando todo o resto.
A dor se intensificou, um fogo ardente. Olhei para baixo. Sangue. Meu sangue. Escuro e viscoso, espalhando-se pelo meu vestido.
"Não!", gritei, um som gutural de pura agonia e desespero. "Meu bebê! Nosso bebê!"
Acordei em uma cama de hospital, as paredes brancas e estéreis espelhando o vazio dentro de mim. As palavras do médico foram um borrão. Aborto espontâneo. Estresse demais. Trauma demais.
Dante entrou, seu rosto cuidadosamente composto. Ele segurava um buquê de lírios brancos, um gesto de remorso vazio. Ele se sentou ao lado da minha cama, pegando minha mão. Parecia fria, distante.
"Alina, me desculpe", murmurou ele, sua voz gentil. "Eu não sabia. Eu juro..."
Puxei minha mão com força.
"Você o matou, Dante!", gritei, minha voz rouca. "Você e sua puta! Vocês mataram nosso bebê!" Eu me debati, batendo nele, arranhando, rasgando seu terno caro. As enfermeiras correram, me sedando.
Quando acordei novamente, Dante havia sumido. Mas Clara estava lá, sentada ao lado da minha cama, um sorriso presunçoso brincando em seus lábios. Ela segurava uma única rosa, suas pétalas de um vermelho vibrante e zombeteiro.
"Dante me disse para cuidar de você", ela ronronou, sua voz doce como veneno. "Ele está tão preocupado. Especialmente depois que você perdeu o bebê."
Meu sangue gelou.
"Você sabia", sussurrei, a percepção me atingindo. "Você sabia que eu estava grávida."
Ela riu baixinho.
"Claro. Você realmente achou que Dante compartilharia tudo com você e não comigo? Eu ouvi você falando com seu médico. Que pena, não é? Perder um bebê assim. Especialmente quando Dante e eu estamos tão animados com o nosso."
Ela se inclinou para mais perto, seus olhos brilhando com malícia.
"Sabe, Dante tem te dado placebos há meses. Ele não queria um filho com você. Ele queria o meu filho. Ele só precisava ter certeza de que você não engravidaria enquanto ele estava... resolvendo as pontas soltas."
Minha mente girou. Placebos. As vitaminas pré-natais que ele insistiu que eu tomasse, tão amorosamente, todas as manhãs. Era tudo uma mentira. Ele havia controlado meu corpo, meu futuro, por meses. O monstro. Ele não era apenas um traidor. Ele era um demônio manipulador e calculista.
"Você está mentindo!", gritei, lágrimas escorrendo pelo meu rosto.
Ela apenas sorriu, um sorriso arrepiante e triunfante.
"Estou? Pergunte a ele. Ele vai te dizer. Ele disse que você estava ficando muito emotiva, muito grudenta. Ele precisava se livrar de você, mas queria fazer isso de forma limpa. Ele estava tentando te proteger de si mesma." Ela fez uma pausa, sua voz pingando veneno. "E agora, você nem pode ter filhos, não é? Depois daquele seu chilique, seu útero está arruinado. Palavras de Dante, não minhas."
Meu mundo se estilhaçou. Meus pais se foram. Meu bebê se foi. Meu marido, um monstro. Minha melhor amiga, sua cúmplice. Meu coração, uma cavidade oca cheia de nada além de gelo e ódio.
E então começou a humilhação pública. Dante, o mestre manipulador, vazou histórias para a imprensa. Alina Bastos, a herdeira instável, sofrendo um colapso, atacando sua assistente "inocente", tentando arruinar sua vida. A empresa do meu pai, já em dificuldades, foi impiedosamente tomada por Dante, seu nome arrancado do legado. Todos os meus bens, as ações que ele tão amorosamente me "deu", foram transferidos para Clara. Fui deixada com nada além da minha fúria e meu corpo quebrado.
Fui mantida cativa em nossa mansão em Angra dos Reis, não por correntes, mas pelos homens de Dante, por suas mentiras, pelas câmeras de vigilância que ele havia instalado. Ele me visitava, bancando o marido preocupado, fingindo se importar, enquanto Clara, minha ex-melhor amiga, desfilava pela casa, exibindo sua barriga crescente, zombando da minha miséria.
Um dia, ela parou sobre mim, sua barriga proeminente.
"Vê, Alina?", ela arrulhou. "É isso que o corpo de uma mulher de verdade faz. Você é apenas uma casca estéril. Dante não te quer mais. Ele nunca quis."
Eu gritei. Eu arranhei. Fiz tudo o que pude para machucá-la, para machucá-lo. Mas eles eram sempre mais fortes. Dante apenas observava, distante, um sorriso cruel brincando em seus lábios.
"Vê, Alina?", ele dizia, "Você está apenas provando o meu ponto. Você é instável. Incapaz."
Então veio o golpe final. Ele divulgou um vídeo. Um vídeo meu, em meus momentos mais vulneráveis e desesperados, gritando, chorando, destruindo a casa. Ele o editou, o distorceu, me fez parecer uma louca. Viralizou. Tornei-me uma piada nacional, uma história de advertência. A herdeira louca, enlouquecida pelo sucesso do marido.
Os amigos do meu pai, meus próprios amigos, se afastaram. O mundo acreditou na narrativa de Dante. Eu estava sozinha. Totalmente, completamente sozinha.
Até aquela última noite. A dor em meu abdômen havia diminuído. A raiva, no entanto, ainda pulsava sob minha pele. Comecei a vagar pelos jardins, um fantasma em minha própria casa. Tropecei em um galpão velho e esquecido. Dentro, empoeirada e negligenciada, havia uma caixa de explosivos, sobra de um projeto de reforma de anos atrás. O projeto do meu pai.
Uma ideia aterrorizante, nascida do desespero e da vingança, começou a se formar. Eu ia queimar tudo. Como a primeira mentira, como a primeira traição, tudo terminaria em fogo.
Mas então, um leve tremor. De novo. Não a dor fantasma do meu filho perdido. Isso era diferente. Um tremor minúsculo e insistente. Um sussurro de vida. Minha mão voou para minha barriga. Poderia ser? Depois de tudo o que Clara disse? Depois dos placebos?
Encontrei um antigo teste de gravidez em uma gaveta de banheiro esquecida. Minhas mãos tremiam enquanto o fazia. Duas linhas rosas. Fracas, mas inegavelmente lá.
Um milagre. Um pequeno lampejo de esperança no abismo do meu desespero. Eu não era estéril. Eu não estava sozinha. Eu tinha uma segunda chance. E eu protegeria essa vida com cada fibra do meu ser.
O plano mudou. Queimar tudo, sim. Mas não comigo dentro. Eu forjaria minha morte. Dante pensaria que eu tinha partido, outra vítima trágica da minha própria loucura. Ele nunca me procuraria. Ele nunca procuraria nosso filho.
Naquela noite, enquanto as chamas engoliam a mansão em Angra dos Reis, eu dirigi para longe, uma nova vida chutando fracamente dentro de mim, uma promessa silenciosa de um futuro que ele nunca tocaria. Observei o inferno no meu retrovisor, o inferno que consumiu meu passado e me levou para o meu futuro desconhecido.
O som da risada de Ema, ecoando da sala de jantar, me puxou bruscamente de volta ao presente. Brenda ainda me observava, seus olhos cheios de preocupação.
"Alice?"
Forcei um sorriso, meu coração ainda batendo com os ecos daquele passado terrível.
"Estou bem, Brenda. Só... muita coisa na cabeça." Levantei-me, meu corpo doendo com as dores fantasmas de velhas feridas. "Preciso ir ver a Ema."
Enquanto me afastava, senti os olhos de Dante em mim novamente, das sombras perto da entrada da sala de jantar onde sua família estava comendo. Ele estava lá, imóvel como uma estátua, seu olhar grudado em Ema, que agora tagarelava alegremente com Cristiano. Uma premonição arrepiante se instalou sobre mim. Nossos caminhos haviam se cruzado novamente. E desta vez, eu sabia que ele não me deixaria ir tão facilmente.